Autor: Carlota Pimentel/Susete Rodrigues
“Nasci na freguesia de São Pedro, Nordestinho, concelho do Nordeste, a 13 de janeiro de 1936. Nasci numa família pobre. A casa era toda de terra e só o quarto de dormir é que era de sobrado”.
É assim que o Padre Fernando começa por contar-nos a sua história. Foi à escola e era um aluno razoável. O pai era alfaiate. “Ele meteu-me naquela vida de alfaiate” tinha entre os 10/11 anos. Mas não era uma vida que gostasse, e, de propósito, comecei a fazer serviços mal feitos”, recorda-nos, confessando que não queria dizer ao pai que não gostava daquela vida.
Mas, “ele deu por isso e um dia disse-me: ‘comprei uma vaquinha e vais tratar dela, porque dá leite para nós’, e eu disse-lhe que sim”.
Da sua infância, o Padre Fernando lembra-se ainda que, no verão, os estudantes juntavam-se: “apesar de ser 1947 havia muitos estudantes, e seis ou sete seminaristas. Tinha dois primos no Seminário e um desses meus primos disse-me uma vez que eles jogavam futebol com uma bola grande... Eu jogava com uma bola de trapos”.
Um dia disse ao pai que gostava de ir para o Seminário e foi falar com o padre que “deu-me apoio e começou a dar-me explicações de latim”. No entanto, o seu professor fez-lhe uma chamada de atenção, “disse-me que não podia ir para o Seminário, porque – dizia ele – no Seminário era tudo gente competente e que iria dar má nota da profissão dele”.
Ora, o Padre Fernando respondeu-lhe que todos os dias levava o livro consigo “quando ia para a vaquinha”, mas as “coisas decidiram-se, e fui para o Seminário. Passei a todos os anos - tive uma negativa em hebraico, penso eu. Tínhamos cinco idiomas, português, francês, inglês, hebraico e grego - era muita coisa. O hebraico era escrito da direita para a esquerda”, recorda.
O Padre Fernando também nos conta que antes de ir para o Seminário, quando visitava a Ermida de Nossa Senhora do Pranto, que “tem uma imagem pequenina de Nossa Senhora da Vida, perguntava a Nossa Senhora se iria ser padre”.
“Penso que na minha vida houve uma ação sobrenatural sobre a minha decisão”. Dizia muitas vezes, “vou ordenar-me sacerdote para servir e amar”. E foi o que aconteceu: foi ordenado padre em 1962.
Após ter feito um ano de estágio na ilha Terceira, o Padre Fernando foi para a ilha do Pico, “para a Prainha do Norte, trabalhar com pescadores. Estive lá três anos e adorei”.
No início, via a Igreja meio vazia. Conseguiu, contudo, mudar o cenário. Como forma de chamar mais pessoas foi dizer “aos jovens que íamos ter um baile no salão paroquial”, revela. “De 15 em 15 dias, tínhamos bailes”. Depois fiz uma reunião com os jovens de lá e apareceram 42 jovens - rapazes e raparigas, gostei tanto que disse para mim que o Espírito Santo estava a ajudar-me e a entrar no coração dessa gente”.
E, foi assim que a igreja começou a encher. Até “criámos um grupo de futebol que ainda hoje existe, o Prainha FC”.
Contudo, três anos depois de estar no Pico, foi pela rádio que soube que seria transferido para a Pedreira do Nordeste, em São Miguel.
No início não queria sair da ilha do Pico, admite que lhe custou muito, e ainda pediu ao bispo de então para que lhe deixasse ficar mais dois anos, mas isso não aconteceu.
Acabou por ficar na paróquia da Pedreira do Nordeste durante 10 anos, e depois o “senhor bispo mandou-me ir para a freguesia de São Roque. Pedi para que ele pensasse bem, porque iria para uma freguesia na periferia de Ponta Delgada, e disse-lhe que iria desobedecê-lo, e que não iria. Mas, dois anos depois, ele disse-me para ir imediatamente para São Roque, e fui”.
Refere que os primeiros cinco anos que passou na freguesia foram “debaixo de uma pressão nervosa, porque não me adaptava àquele meio”. Mas, um dia, em conversa com duas senhoras da freguesia, percebeu: “tinha que me dedicar àquelas pessoas e comecei a percorrer as ruas, a conhecer a freguesia. Criámos um grupo social de apoio às famílias pobres, aos doentes, aos idosos”, e “foi o povo de São Roque que me ensinou. Estive lá 30 anos e, depois, custou-me muito a sair”. Por isso, “agradeço ao povo de São Roque”.
Hoje em dia, “quando eles me encontram, continuam a dizer: ‘Olha o nosso Padre’. E já não estou lá há muitos anos. Mas dá-me uma grande alegria ouvir isso”.
Deixou a freguesia de São Roque para ir para as Bermudas. “O senhor bispo disse-me que iria trabalhar com os emigrantes açorianos, mas este trabalho não me foi facilitado pela igreja inglesa, e vim-me embora, porque não me deixaram trabalhar devidamente com o povo açoriano”. Regressou à paróquia de São Roque, por poucos dias, porque foi para a Fajã de Cima. “Gostei imenso”.
“Dou valor a todo o povo das paróquias em que estive”, salienta.
O Padre Fernando esteve também nos Fenais da Luz e na Igreja de Nossa Senhora de Fátima, no Lajedo, nesta última com mais “quatro padres, tomávamos conta das igrejas de Fátima e de Santa Clara”.
Atualmente, com 88 anos, continua a celebrar missas, ajudando o Padre Norberto na Igreja de Nossa Senhora de Fátima, o que irá continuar a fazer até poder, porque “nunca me esqueci do lema da minha vida que é servir com amor: Vais servir, não vais em teu nome, vais em nome de Cristo. Toda minha vida tive este lema”.