Autor: Lusa/AO Online
“Este julgamento não discute se houve tentativa de golpe (…) o que discute é se os réus participaram”, afirmou o juiz relator do processo que acusa o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro e outros sete membros da sua cúpula de tentativa de golpe de Estado.
“Houve uma organização criminosa que gerou dano” ao país, frisou Alexandre de Moraes na sustentação do seu voto, o primeiro de cinco juízes que compõem a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).
“O conjunto é de uma organização criminosa sob a liderança de Jair Messias Bolsonaro, durante o período de julho de 2021 até 08 de janeiro de 2023”, sublinhou.
O juiz relator detalhou que a “organização criminosa, com divisão de tarefas e hierarquizada praticou vários atos executórios”.
Primeiro, ao “atentar contra o Estado Democrático de Direito, pretendendo restringir ou suprimir, mediante grave ameaça, a atuação de um dos Poderes do Estado”, mas também através de “atos executórios para consumir, por meio de violência ou grave ameaça, um governo legitimamente constituído”, como o Governo de Lula da Silva que venceu as eleições de outubro de 2022 contra o próprio Jair Bolsonaro.
A “finalidade era muito clara”: “perpetuação no poder”, sublinhou o juiz.
Para isso, justificou, a organização planeou atos para desacreditar as urnas, a justiça eleitoral, colocar a população contra o poder judiciário e assim “se perpetuarem no poder”.
Num discurso forte, o juiz relator disse ainda, referindo-se a membros da cúpula de Bolsonaro hoje em julgamento, que "não é razoável achar normal um general do Exército de quatro estrelas, um ministro do Gabinete de Segurança Institucional, ter uma agenda com anotações golpistas”.
“Não consigo entender como alguém pode achar normal em uma democracia, em pleno século 21, uma agenda golpista", disse Moraes, referindo-se às anotações encontradas na casa do general na reserva e ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República Augusto Heleno, também em julgamento.
Antes da leitura da justificação do voto, Alexandre de Moraes rejeitou todos os pedidos de nulidade das defesas dos réus e a alegadas incongruências do réu delator.
O julgamento contra Jair Bolsonaro entrou hoje na última semana com a votação dos cinco juízes, até sexta-feira.
O coletivo de juízes que forma a Primeira Turma (coletivo) do Supremo Tribunal Federal (STF) é composto pelo juiz Alexandre de Moraes (considerado o 'inimigo número um' do bolsonarismo), por Flávio Dino (ex-ministro da Justiça do Presidente Lula da Silva), Luiz Fux (indicado ao STF pela então Presidente Dilma Roussef), Cármen Lúcia (indicada ao STF por Lula da Silva) e Cristiano Zanin (ex-advogado pessoal de Lula da Silva).
Hoje, o primeiro voto é feito por Alexandre de Moraes, seguindo de Flávio Dino e dos restantes juízes que votam em ordem crescente de antiguidade no Tribunal, ficando por último o presidente do coletivo, Cristiano Zanin, que também será o responsável por proclamar o resultado.
Além de Jair Bolsonaro, estão em julgamento o deputado federal Alexandre Ramagem, o almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o general na reserva e ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República Augusto Heleno, o tenente-coronel e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, o general e ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e o general na reserva e ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Neto.
Este grupo chamado de "Núcleo 1" ou "Núcleo Crucial", composto por oito réus, responde por tentativa de abolição violenta do Estado de Direito Democrático, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de património.
O ex-Presidente não marcou presença no tribunal, alegando motivos de saúde e a sua defesa pediu ao tribunal que Jair Bolsonaro, atualmente em prisão domiciliária, possa no domingo ser submetido a uma pequena intervenção num hospital privado em Brasília para a remoção de algumas lesões na pele.