Autor: Lusa/AO Online
Segundo a contabilização mais recente, a 31 de dezembro de 2023 havia 13.128 pessoas a viver na condição de sem-abrigo, mais 23% do que em 2022, entre as quais 4.871 a viver na Área Metropolitana de Lisboa (AML).
Para Cristiana Merendeiro, o aumento aconteceu porque “não se respondeu a esta problemática com aquilo que é essencial, que é a habitação”, defendeu, em entrevista à agência Lusa.
De acordo com a responsável, a realidade atual é feita de admissões em albergues, que são respostas de emergência que deveriam existir apenas “em pequeno número”, sem que depois haja a devida transição para respostas de longo prazo.
“A pessoa (…) realmente não deve ficar uma noite sequer na rua, deve ter logo acesso a essa resposta, mas é preciso transitar rapidamente dessa resposta para uma de logo prazo e isso é o que está a falhar”, considerou a responsável.
Na opinião de Cristiana Merendeiro, faltam, não só respostas de longo prazo que envolvam habitação, mas também respostas de prevenção, em vez de uma resposta focada essencialmente na emergência.
Apontou que na cidade de Lisboa existem 400 apartamentos para projetos Housing-first, um modelo que assegura habitação individual com acompanhamento, mesmo para quem tem problemas de saúde mental ou dependências, 140 dos quais geridos pela CRESCER.
Questionada sobre qual seria o número ideal de apartamentos, Cristiana não hesita em afirmar que se na AML existem “cerca de quatro mil” pessoas em situação de sem-abrigo, então seria “exatamente esse número de habitações” que seria preciso.
“É preciso dar uma resposta já a estas pessoas que estão em situação de sem-abrigo e, a par disso, começar a implementar projetos de prevenção” para que as pessoas não venham parar à rua, defendeu.
E avisou que se isto não for feito, não haverá outras soluções: “Não podemos estar a tentar resolver uma situação que, como o próprio nome indica, se prende com a falta de habitação”.
Para Cristiana Merendeiro, este é um problema que já deveria ter sido abordado “há muitos anos” e deveria ter tido políticas “muito diferentes daquelas que tem tido”.
“Se nós continuarmos com respostas de emergência, não vamos conseguir estancar este fluxo. Estamos sempre a falar de um fenómeno de pobreza, só que hoje em dia o fenómeno de pobreza são pessoas que têm um trabalho e que não conseguem pagar uma habitação”, alertou a responsável.
A coordenadora da CRESCER admitiu que “tem havido um esforço de perceber cada vez melhor o fenómeno”, bem como “um aumento do investimento público” na resolução do problema, com uma tentativa de participação, quer do poder estatal, quer do poder local.
Mas na sua opinião o problema é a falta de habitação.
Quanto a outros problemas que possam estar associados, como o alcoolismo, a toxicodependência ou a saúde mental, Cristiana Merendeiro apontou que são iguais aos de tantas outras pessoas, e que o que faz a diferença é o facto de a pessoa sem-abrigo “vivenciar toda esta panóplia de problemas a partir da rua”.
“Temos de começar pela habitação como base porque a habitação não é só esta questão de pôr um teto sobre a cabeça da pessoa, porque isso um albergue também permite, é um lugar onde a pessoa se sente segura e onde é o próprio que estabelece as regras e sente autonomia nas decisões que toma”, defendeu.
Através do projeto “É UMA CASA – Housing First”, a associação CRESCER atribuiu uma casa a 175 pessoas nos últimos 13 anos.