Autor: Susete Rodrigues
Durante largos anos, vimo-lo no ecrã da RTP Açores a trazer-nos as notícias do desporto regional. Falamos de José Silva, que até chegar à televisão fez um longo percurso pela imprensa escrita, tendo mesmo, durante muitos anos, conciliado a televisão com os jornais.
Diz ter o ADN do seu tio “João Silva Jr. que foi diretor do Diário dos Açores e também foi correspondente cá do Diário de Notícias”, não esquecendo o pai “que também escrevia: fazia apontamentos para o extinto jornal ‘A Ilha’”. “Por isso sempre me interessei pelo jornalismo”, particularmente pelo desporto que sempre fez parte da sua vida.
Com uma infância feliz, José Silva sempre foi praticante de futebol, que na “altura era a única modalidade que existia”. Mas tinha um contra porque sofria de asma e não era a modalidade ideal. Na altura “impressionava-me que amigos meus não usavam sapatos e jogavam naquelas ruas de terra com uma facilidade tremenda. Eu até tinha receio de ir ao encontro deles para não os magoar quando jogávamos”. Ora a mãe proibia-o de jogar, mas “fazia às escondidas dela”.
Entre o gostar de jogar e ter qualidade de jogador, José Silva enquadrava-se nos que não tinham muito jeito, mas “fui para o União Sportiva que era o clube em que o meu pai foi dirigente e presidente. Costumo dizer que aqueci os bancos de suplentes desta ilha”, conta com boa disposição.
Começou a dedicar-se à organização de torneios na Fajã de Baixo, e é “ai que nasce a minha ida para o jornalismo”. Naquela altura ia aparecendo o futebol de salão, “comecei a ‘vasculhar’ as regras, o que não era fácil”, mas o tio guardava-lhe o jornal ‘A Bola’. Refere que “desde criança que folheava o jornal e era daí que tirava muitos ensinamentos”.
Assim, José Silva e um grupo de amigos, conseguiram fazer um campo de futebol de salão num terreno do Centro Social e Paroquial da Fajã de Baixo, e “teve um êxito muito grande. Recordo-me que aquilo evoluiu de tal maneira que tivemos de fazer uns balneários, colocar iluminação, porque começaram a vir equipas de outras freguesias aqui à volta”. Contudo, “não tínhamos dinheiro; então eu e o meu compadre, Emanuel Miranda, já falecido, com o senhor Francisco Faria, que era o presidente da Casa do Povo e um dos gerentes do Banco Português do Atlântico, acabámos por assinar uma ‘letra’, com 18 anos, sem os meus pais saberem, para conseguirmos o empréstimo para colocarmos iluminação no campo”.
Para poderem ir pagando o empréstimo, fizeram diversas coisas, como por exemplo explorar os bares nas festas, ajudavam no Centro Social quando havia as peças de teatro. Por ocasião da inauguração da iluminação desse campo, “o João de Brito Zeferino (já falecido) foi cobrir o evento e ficou admirado com toda aquela dinâmica e convidou-me para fazer parte do programa ‘Contra Relógio’, da Publiçor, emitido pelo Clube Asas do Atlântico, apresentado pelo saudoso Luís Furtado. Íamos aos jogos e escrevíamos as crónicas e depois líamos para a rádio”.
José Silva afirma que foi assim que começou, tendo depois começado a escrever no jornal Açores. “Coincidiu estar a cumprir serviço militar, mas conseguia conciliar”, lembra. Do jornal Açores vai para o Correio dos Açores e lá encontrou “um grupo de amigos em que faziam as crónicas dos jogos todos. O jornal fechava tarde, e isso permitia que déssemos os jogos que terminavam mais tarde”. Recorda que à segunda-feira à noite, quando a impressão estava na rotativa, “haviam já pessoas a fazer fila na rua dos Mercadores à espera do jornal, isto porque as pessoas seguiam muito os clubes de cá, e não existia a massificação de hoje em dia com os clubes de fora, como o Benfica, FC Porto, Sporting”.
Com o jornal fechado e apesar do cansaço, havia sempre tempo para a confraternização, desde do ir à padaria à realização de torneios de futebol: “Quando o diretor ia embora, que era o Jorge Nascimento Cabral, juntávamos as secretárias todas num canto e fazíamos os nossos campeonatos de futebol (...). Era um grupo muito diversificado - infelizmente alguns já cá não estão”.
Um dia o “senhor Gustavo Moura e o senhor Ferreira de Melo convidaram-me, e ao Óscar Rocha, para uma reunião neste edifício, e disseram que tinham um projeto para fazer um jornal do Desporto”. Confessa que na altura ficou dividido entre o entusiasmo de um novo projeto e o deixar o Correio dos Açores onde esteve 11 anos. “Recordo-me que o Jorge Nascimento Cabral ficou um bocado aborrecido comigo”. “Começámos aqui no dia 1 de setembro 1986, com o Jornal do Desporto que saía duas vezes por semana. O senhor Gustavo Moura era o diretor, o João de Brito Zeferino era diretor adjunto e eu era chefe de redação”.
Dizer que entre este novo projeto e o Correio dos Açores, José Silva ingressa na RTP Açores em 1978 e em 1980 já “comecei a estar praticamente a tempo inteiro na televisão, embora só tenha entrado para os quadros em 1986”.
Entretanto, Carlos Tomé deixa a televisão e eu “comecei a assumir a chefia, e assim foi até à minha saída em 2013 com a pré-reforma, mas fiquei ligado à televisão com contrato, não podia trabalhar para lado nenhum, e agora estou na reforma”.
Voltando às recordações do Jornal de Desporto, José Silva conta que “havia os jogos de basquetebol, voleibol e cobríamos tudo... estou a recordar tantas coisas... por exemplo ia fazer um jogo nas Furnas, saía daqui e ia deixando os jornalistas e os fotógrafos nos campos, e no regresso trazia-os. As crónicas eram-nos dadas por telefone, tínhamos que ir escrevendo o que eles estavam a ditar. Começávamos às 20h00 e saímos daqui às 7 horas da manhã do dia seguinte”.
Mas a verdade é que deu-se um desgaste muito grande, e o entusiasmo foi decrescendo, as “pessoas tinham os seus empregos, e terminamos, mas o projeto como estava a ter êxito, o senhor Ferreira de Melo convidou o Carlos Alberto Alves, da ilha Terceira, para vir fazer o Jornal de Desporto”, disse para acrescentar que “quando saí deixei um projeto para se fazer um suplemento do desporto no Açoriano Oriental, para sair à segunda-feira e durante a semana”.
Falar da sua saída da RTP Açores é algo que lhe custa. Confessa-nos que “não foi fácil, porque quando se tem paixão por uma coisa e se está imbuído nela todos os dias... prejudiquei muito a minha família e já me penitenciei perante eles, filhos e esposa principalmente, porque a minha mulher Graça é uma heroína - apoiou-me muito”. Sair da televisão “doeu um bocado e da forma como foi. Na altura fiquei um bocado revoltado... recordo-me de estar em casa de uns amigos e começar a dar o Teledesporto e foi aí que me caiu a ficha, foi um choque... mas fez-me bem... estive em Lisboa uns tempos e foi passando...”, refere para sublinhar que apesar de “os anos seguintes terem sido complicados, como tudo na vida as feridas vão sarando, vamos esquecendo, contudo, confesso que ainda me custa entrar na RTP Açores”.
Pese embora estar na reforma, “continuo a ter uma paixão muito grande pelo jornalismo desportivo”, disse. Por isso, continuou a colaborar com o Correio dos Açores e atualmente com o Açoriano Oriental. Diz que “enquanto tiver sanidade mental e fisicamente me sentir confortável, irei continuar a escrever”.
Tem uma vida preenchida, “faço atividade física, ajudo em casa - a fazer comida é que não porque não tenho muito jeito -, tenho a minha neta agora, com dois anos e meio, que é um entretimento muito bom, e estou a dar-lhe a atenção que não dei aos meus rapazes”.