Autor: Cristina Pires - Açores TSF/Rui Jorge Cabral - Açoriano Oriental
No seu entender, estas eleições poderiam ter sido evitadas em nome da estabilidade e do superior interesse do País?
Eu penso que, de certeza, poderiam ter sido evitadas... Esta é uma crise política que é criada pela vontade do PSD de não responder às questões e de não agir com uma Assembleia que tinha sido eleita ainda há pouco tempo. Não obstante, no momento em que é criada a crise, cá estaremos para ir a eleições e, quem sabe, para melhorar a nossa posição na Assembleia da República.
Mas que, certamente, poderia ter havido outra solução para este momento e que as pessoas não estão necessariamente com vontade de ir novamente a eleições e novamente votar, isso é certo.
Porque é que aceitou ser candidato a deputado pelo círculo eleitoral dos Açores?
Exatamente por termos sido atirados para estas eleições antecipadas, num momento em que ninguém estava à espera... Em todos os partidos, penso que já estávamos com a cabeça nas autárquicas e a preparar esse ciclo.
Portanto,
chamou-nos a ação de não ficarmos sentados e à espera de ver como é que
as coisas resultavam e ‘darmos o corpo ao manifesto’, digamos e a cara
pelo partido, para podermos estar na luta. Uma vez que tivemos de ser
atirados para estas eleições, poderemos ter uma representação mais forte
na Assembleia da República e sair destas eleições com uma força do
Livre e uma força da esquerda reforçada.
No seu entender, o PSD e o CDS, que governam coligados, são os únicos responsáveis por esta crise política?
É sempre difícil dizer que há apenas um culpado... Porque a culpa morre muitas vezes solteira, como se costuma dizer... Poderá dizer-se que foi do PSD, que o PS também terá dado uma ajuda e o Presidente da República ‘idem aspas’....
No final, o que conta é que acabámos em eleições e é
com isso que nos temos de conformar agora e trabalhar para dar as
respostas ao povo, dando-lhe a estabilidade que ele precisa para não
estarmos de volta a esta situação daqui a mais um ano ou ano e meio...
Porque não é isto que o País neste momento precisa, com as crises que
enfrenta.
Olhando agora para os dossiers que dizem particularmente respeito aos Açores, nomeadamente a revisão da Lei de Finanças Regionais, que não está na ‘gaveta’, mas que pouco ou nada avançou no último ano, do seu ponto de vista o que é preciso acautelar e com que rapidez?
Ao nível do financiamento para a Região, as coisas que são sempre mais importantes são a educação e a saúde, por estarem sob a alçada da Autonomia regional. Nesse aspeto, é difícil escapar ao assunto da reabilitação do Hospital do Divino Espírito Santo (HDES).
Porque perante tudo o que temos vindo a saber, do gasto que significou o
tempo que o HDES esteve ‘desalojado’, o gasto no Hospital Modular e a
necessidade de uma reabilitação séria, para precaução de futuros
incêndios ou futuros eventos sísmicos, é importante acautelar que as
verbas para o hospital estão bem definidas e que se consegue fazer um
projeto digno do que a Região necessita em termos de saúde.
Esta é uma das coisas mais importantes que necessita estar acautelada.
No âmbito da Lei de Finanças Regionais?
Pelo que sabemos do Governo Regional, já estará uma verba disponível para o hospital, mas a questão que pode não ter ficado clara é a de que se o projeto que será apresentado, com as verbas que se tem disponíveis, irá efetivamente dar resposta ao que a Região precisa ou se será meramente um penso rápido.
Se for eleito deputado pelos Açores, quais são os seus compromissos eleitorais?
As
propostas do Livre ainda irão ser votadas no nosso programa no
congresso que irá decorrer no próximo fim de semana (12 e 13 de abril,
em Algés).
Do nosso programa preliminar, as bandeiras têm sido, já
da última campanha, muito focadas nos problemas que temos visto como
estruturais no País, como a saúde, a educação e a habitação, que são
aqueles problemas que todos vemos nas notícias nacionais, seja pelo
fecho de serviços ou pelas dificuldades ao nível da habitação, que
também se sentem aqui nos Açores, pela subida dos custos.
Estes são
os problemas que mais estão a entrar dentro da casa dos portugueses, e é
para esses problemas que queremos dar resposta, porque também são estes
os problemas mais sentidos no imediato.
E que soluções apresenta o Livre para estes problemas?
Ao
nível da saúde e apesar da Região ter as suas carreiras, as alterações
têm de passar pela reestruturação das carreiras dos profissionais do
Serviço Nacional de Saúde, valorizando estas carreiras através da
dedicação plena e através de programas que possam trazer de volta ao
País alguns dos profissionais de saúde que perdemos para a emigração,
para que possamos reforçar os cuidados primários, que são essenciais e
onde está muitas vezes a falha, para depois não sobrecarregarmos os
serviços de Urgência.
Quanto ao problema da habitação, este nunca pode ser atacado apenas por uma frente.
Temos,
por um lado, que o atacar pelo lado do arrendamento, uma vez que as
rendas estão demasiado altas, apresentando soluções de limitação dos
valores das rendas, particularmente para quem teve apoios estatais para
reabilitar casas.
Isto tem que ser algo a ser considerado para que as rendas estejam mais adequadas aos rendimentos dos portugueses.
Já
do ponto de vista do preço da habitação para compra, aí a nossa ideia é
a de que o Estado tenha uma intervenção na ótica da oferta, através da
construção de mais casas, num programa ambicioso, que não se limite
apenas a cumprir o que já está no Plano de Recuperação e Resiliência
(PRR), mas que possa também ir mais além, com investimento do Orçamento
do Estado a 100%, para que se consiga atingir uma meta de 10% de oferta
de habitação pública até 2040.
Os Açores elegem cinco deputados. Ideologias à parte, no seu entender, não deveria existir mais diálogo e cooperação entre os parlamentares eleitos pelo arquipélago na defesa dos interesses da Região e menos calculismo partidário?
Claro que quando somos eleitos por um círculo, estamos sempre em representação desse círculo.
Por
alguma razão, temos as estruturas regionais da Autonomia e nós
defendemos, não nos mesmos pressupostos, um debate sobre a
regionalização para o resto do País, para que nele possam existir também
estes órgãos mais locais executivos.
Não obstante, quando chegamos à
Assembleia da República, tem que haver um pensamento que vá além da
região e olhar para os problemas de uma forma mais holística, para os
problemas do País como um todo.
E se há problemas dos Açores que são
muito particulares, nomeadamente do seu setor primário que é muito
diferente de outras regiões do País, já nos problemas da habitação, da
educação e da saúde, onde pensávamos poder estar mais protegidos, por
estarmos longe das grandes metrópoles, acabamos por ver também aqui na
Região a especulação imobiliária, muito por força do turismo.
Portanto,
os problemas acabam por se tocar e quando se está na Assembleia da
República, o importante é estarmos em defesa dos problemas das pessoas
que não se circunscrevem só à Região, mas que são do País como um todo.
Se for eleito irá tentar estabelecer pontes e entendimentos com os outros deputados eleitos pela Região?
Nós,
no Livre, somos um partido de ‘pontes’... Nascemos exatamente da ideia
de que à esquerda tinha de haver mais convergência do que havia até
então. Portanto, a nível da Assembleia da República, com os
deputados eleitos pelo círculo dos Açores e com restantes deputados que
compõem as bancadas, a nossa ideia é sempre a procurar sinergias e
acordos à esquerda, isso não vamos esconder.
Como se sente enquanto cidadão e agora na qualidade de candidato a deputado, quando o debate político e a troca de argumentos, no caso concreto da Assembleia da República, ultrapassa os limites do bom senso, da educação e, nalguns casos, até da decência?
Presumo que esta questão não está apontada a
nenhum deputado do Livre porque, da minha análise, os deputados do Livre
tiveram sempre um comportamento exemplar na Assembleia da República.
Seja
de que origem venhamos e cheguemos à Assembleia da República, o nosso
dever de representação é uma honra e deve ser assumido com este
privilégio de estarmos lá em representação dos portugueses.
Há,
efetivamente, quem não siga estas regras do decoro e do respeito pela
democracia - como base - e do respeito pelos outros parlamentares.
Mas
só podemos falar pelas nossas ações e não pelos outros... Eu gostaria
de ver uma Assembleia da República com civilidade, em que se discutem as
ideias, não na base em que o outro é o inimigo, mas sim na base de que o
outro tem simplesmente ideias diferentes.
Para bem do País e dos cidadãos, mas com ideias diferentes. Há quem, por vezes, vá com outra postura.
Nos Açores, os níveis de abstenção são sempre elevados, comparativamente ao resto do País e nas últimas Legislativas, ultrapassaram mesmo os 50%... Receia que, a 18 de maio, se volte a bater um recorde?
O facto de termos sido atirados para estas eleições de forma tão repentina e extemporânea, significa que, muito provavelmente, iremos assistir a isso não só nos Açores, mas também um pouco por todo o País, porque as pessoas estão desiludidas por não lhes ser dada estabilidade.
Neste momento, penso que as pessoas só querem soluções para os problemas e não queriam ser chamadas a votos outra vez.
Portanto,
é natural que a abstenção aumente em todo o País e se nos Açores já é
um problema, penso que a desilusão cresce, porque apesar de se terem
vindo a fazer melhorias, os Açores continuam a ser a região mais pobre
do País e as pessoas sentem isso no corpo.
Sentem que, passado um ano, não houve soluções para os problemas e estamos de volta à estaca zero e chamados a eleições...
Da parte do Livre, vamos trabalhar para que assim não seja e para que as pessoas percebam que, se estão desiludidas com o rumo das coisas, a solução não é a abstenção, nem é votar em partidos mais protestativos, é um voto no Livre.
Quem é a sua maior referência política?
No Livre, é difícil esconder que temos todos como referência o Rui Tavares, porque foi um dos que iniciou este projeto e continua a representar-nos bem.
Mas também os outros elementos que compõem a bancada parlamentar, como o Jorge Pinto ou a Isabel Mendes Lopes, que são também elementos com muita capacidade e muito conhecimento. Revejo-me um pouco em todos eles.
Porque é que os açorianos devem confiar-lhe o seu voto no próximo dia 18 de maio?
Seria difícil dizer porque devem confiar em mim, pessoalmente, porque a maioria ainda não me conhecerá... Irei fazer para que me conheçam mais até ao dia 18 de maio, mas penso que o que vimos nas duas últimas Legislaturas, incluindo esta mais curta de apenas um ano, é que a bancada do Livre está lá para apresentar soluções para os problemas e não está lá para criar polémica.
As pessoas veem isso e penso que se reveem no trabalho do Livre, mesmo que não se revejam nas políticas propriamente ditas. Eu apresento-me como representante do Livre por este círculo eleitoral e o que posso dizer é que uma bancada maior do Livre será mais dessa representação com qualidade e em defesa dos interesses das pessoas.