Autor: Ana Carvalho Melo
Margarida Andrade, uma jovem artista emergente, iniciou um projeto inovador que pretende cativar a comunidade artística, assim como a população em geral. Em entrevista, Margarida partilha a sua trajetória artística, desde a infância até ao seu mais recente projeto, “Não Me Esqueças”.
Desde muito jovem, Margarida Andrade mostrou interesse pelo desenho e pelas artes. “Eu sempre gostei de desenhar. Na primária, já desenhava e os meus pais contam que a professora elogiava os meus desenhos”, recorda, contando que a sua família também notava o seu talento, especialmente a sua tia, que guardava os seus trabalhos.
Aos 10 anos, Margarida Andrade inscreveu-se no atelier de Martim Cymbron, onde começou a desenvolver um gosto mais apurado pela pintura.
Na adolescência, Margarida enfrentou uma decisão importante sobre o seu futuro académico. Inicialmente, pensava em seguir Arquitetura por ser uma carreira mais segura. Contudo, ao entrar no ensino secundário na Escola Antero de Quental, percebeu que o seu verdadeiro interesse estava nas artes plásticas. Com o apoio da família, decidiu seguir Pintura na Faculdade de Belas Artes, em Lisboa.
“No secundário, participei em alguns concursos e cheguei a ganhar um concurso para um cartaz da Comissão Nacional de Eleições, o que me fez perceber que até tinha algum jeito. Também com o Martim Cymbron participei em alguns eventos da Arte Viva, onde pintava ao ar livre e recebia feedback de outros artistas, o que permitiu entrar neste meio das artes”, lembra.
A universidade foi um ponto de viragem para Margarida. “Na universidade, percebi que o desenho e a pintura não eram só sobre criar quadros bonitos, mas podiam ser uma ferramenta para explorar ideias e expressar pensamentos profundos. Foi um choque muito grande, mas que rapidamente aceitei e que permitiu desenvolver mais o meu trabalho”, explica.
Nesse sentido, a jovem destaca que a sua formação incluiu uma vasta gama de disciplinas, desde filosofia e literatura até performance e design gráfico, o que expandiu os seus horizontes artísticos.
No quarto ano da licenciatura, realizou um Erasmus em Cardiff, no Reino Unido. “Os professores em Cardiff incentivaram-me a continuar lá, ou seja, a fazer um mestrado, e ainda ponderei, mas depois achei que era muito frio porque fica no País de Gales e voltei a Lisboa. Mas gostei muito e fiz bons amigos lá”, conta.
Após concluir a licenciatura, Margarida Andrade continuou os seus estudos com um mestrado em Educação Artística em Barcelona. Este período foi especialmente enriquecedor, pois permitiu-lhe combinar as suas paixões pela arte e pela pedagogia. “Sempre tive o bichinho da educação e da mediação cultural, o que abriu ainda mais os meus horizontes, porque me permitiu conhecer autores, filósofos, artistas e pedagogos muito diferentes e também conhecer histórias e teorias de outros países, como os da América Latina, da própria Espanha e da América do Norte”, explica.
Durante este mestrado, trabalhou num projeto numa escola primária onde 90% das crianças eram imigrantes, no qual foram utilizadas metodologias artísticas para abordar questões sociais e culturais, como o sentimento de pertença dessas crianças.
Depois de seis anos no continente, Margarida regressou aos Açores no final de 2020, em busca de uma vida mais tranquila. Recentemente, lançou o seu mais recente projeto, “Não Me Esqueças”, no qual explora a relação entre os humanos e a natureza, um tema que a cativa.
“Talvez por ter crescido em São Miguel, em grande contacto com a natureza, quando fui para Lisboa senti muito esse contraste. Um dos meus primeiros projetos artísticos, ainda enquanto estudante, chamava-se ‘Um Ensaio para um Jardim’ e refletia sobre a minha procura por espaços verdes na cidade de Lisboa. Ao longo de todos estes anos, tenho explorado sempre a minha ligação aos contextos em que me insiro. E quando voltei aos Açores, regressei ao verde, o que se refletiu nos meus projetos”, conta.
Assim surgiu o projeto “No Futuro Também se Usavam Pincéis”, que esteve patente no Arquipélago - Centro de Artes Contemporâneas em 2021 e que se baseia no livro da sua autoria, “A Décima Ilha”. Em 2023, apresentou “Um Herbário de Plantas por Nascer”, na Galeria Fonseca Macedo.
Atualmente, está a desenvolver o projeto “Não Me Esqueças”, com o apoio da República Portuguesa - Cultura/ Direção Geral das Artes e do Programa Pares, que visa criar uma ligação mais forte entre as pessoas e a natureza, utilizando a arte como uma ferramenta de reflexão e comunidade. “Este projeto pretende sair das galerias e aproximar-se das pessoas, promovendo uma discussão acessível e comunitária sobre a nossa relação com a natureza”, explica Margarida Andrade.
“As artes podem ser uma ferramenta de reflexão, mas muitas vezes são um processo solitário. Quando falamos em alterações climáticas e na nossa relação com outras espécies, devemos fazê-lo em comunidade. Este projeto vem responder à minha vontade de sair do meu ateliê e das galerias e falar destes assuntos de forma acessível através de uma iniciativa comunitária”, acrescenta.
Ao longo deste projeto, a população é convidada a participar em seis caminhadas, tendo a primeira tido lugar no Jardim José do Canto, nas Furnas. Margarida Andrade espera que ajude a aproximar mais pessoas da arte contemporânea, como também promova a reflexão comunitária sobre questões ambientais e sociais. Ainda no âmbito deste projeto, vão realizar-se caminhadas a 15 de setembro e 20 de outubro de 2024, e a 15 de junho de 2025 em São Miguel, a 21 de setembro de 2025 em Santa Maria, e a 19 de outubro de 2025 na Terceira. Todas as caminhadas contam com a parceria da SPEA - Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves e com o apoio à divulgação da Associação Amigos dos Açores.
“Para cada caminhada, vou fazer uma peça de cerâmica que vou transportar numa espécie de mochila feita à medida e, no final, vamos realizar um funeral a partir da peça em homenagem às espécies que não conhecemos, que optamos por não conhecer, que esquecemos ou que já se extinguiram numa reflexão sobre a nossa relação com as outras formas da natureza. A ideia é pensar sobre que espécies, ao desaparecerem, são choradas, partindo do pressuposto de que não devem ser os humanos a decidir que espécies devem ou não ser valorizadas”, relata.
Paralelamente, à sua carreira artística, e aproveitando a sua formação académica, Margarida Andrade trabalha como co-coordenadora da equipa de inclusão pela cultura da CRESAÇOR, Equipa de Animação Territorial e Desenvolvimento Local, através da qual trabalha com pessoas em situação de exclusão social através da arte.