Açoriano Oriental
“É um motivo de orgulho ser campeão regional absoluto. Foi uma sensação única...”

Os irmãos Rodrigues alcançaram o título de campeão dos Açores de ralis absoluto no 14.º ano da carreira, e logo no ano da estreia de um projeto 100% açoriano no panorama regional da modalidade: a AutoAçoreana Racing

“É um motivo de orgulho ser campeão regional absoluto. Foi uma sensação única...”

Autor: Arthur Melo

Foram necessários 14 anos de carreira para a dupla de irmãos Rúben e Estevão Rodrigues conseguir concretizar uma velha aspiração de crianças: conquistar o título de campeão dos Açores de ralis em absolutos.

Rúben Rodrigues, que aos 36 anos cumpriu o sonho de se sagrar campeão absoluto, passou em revista o ano de 2021 e classificou como determinante para a conquista do título o apoio do Grupo AutoAçoreana.

O piloto micaelense, que sempre correu tendo a seu lado o irmão Estevão, de 34 anos (também ele campeão dos Açores de 2021 em navegadores), iniciou-se nos ralis em 2007, mas a entrada nos desportos motorizados aconteceu com presenças nas provas organizadas por Carlos Martins.

Desde então, e após a conquista dos títulos das duas rodas motrizes em 2018 e 2019, ao volante de um Peugeot 208 R2, e de uma passagem não bem sucedida  no ano zero do antigo projeto da Play/AutoAçoreana Racing, os manos Rodrigues surgiram no início do ano ao volante de um competitivo Citroën C3 Rally2 da AutoAçoreana Racing.
Após as vitórias obtidas XX Além Mar Rali TAC, XXI Rali Além Mar Ilha Lilás e X Picowines Rali;os segundos lugares no XXXII Rali Além Mar Ilha Azul e Além Mar Rali; e finalmente, o terceiro lugar no XL Rali Além Mar Santa Maria, o título de campeão dos Açores de 2021 foi festejado no passado mês de novembro na cidade da Lagoa.

O que significa para o Rúben Rodrigues o título de campeão de ralis dos Açores em absoluto conquistado em 2021?

Eu e meu irmão sempre corremos juntos e tem um significado muito especial. Começamos no autocross, numa espécie de brincadeira, e víamos grandes pilotos a serem campeões de ralis e colocávamos sempre a mesma questão: o que nos faltava para chegar lá? O que era preciso? Durante muito tempo faltou-nos muita coisa. Este desporto não é propriamente muito barato, pelo contrário, é muito caro, e há componentes que fazem toda a diferença. Se tivéssemos as mesmas condições que os nossos adversários podíamos trazer o título para nós e tendo as mesmas condições conseguimos. Ficamos muito satisfeitos e para nós, quer para mim, quer para meu irmão, é um motivo de orgulho ser campeão regional absoluto. Foi uma sensação única...

Ser campeão ao lado do irmão, o Estevão, que também foi campeão de navegadores, tem sabor especial?

Muito especial. Num passado recente tínhamos estado num projeto R5 e depois regressamos para a categoria duas rodas motrizes onde fomos campeões (2018 e 2019) e, mesmo com aquele carro (Peugeot 208 R2), até podíamos ter sido campeões em absoluto. Sabíamos que as armas não eram iguais e que nos faltava um pouco mais.
A experiência adquirida em 2020 nas provas do Campeonato de Portugal de Ralis e na Peugeot Rally Cup Iberica foi determinante para a conquista do campeonato açoriano?
A nossa presença em algumas provas da Peugeot Rally Cup Iberica permitiu-nos crescer. Fomos à procura do desconhecido e para tentarmos perceber onde é que podíamos melhorar. Correr em casa é sempre muito fácil porque conhecemos as estradas, facilitamos em muita coisa e ter ido correr fora trouxe-nos uma outra exigência. Tivemos de estar mais concentrados, tivemos de nos adaptar a um método diferente na leitura do terreno e isso levou-nos a focar, empenhar e evoluir. Foi muito importante fazer estas provas e ter a noção que mesmo com carros todos idênticos haviam por vezes diferenças, num troço, de 10 a 20 segundos. Tudo isso permitiu-nos crescer e evoluir. Fizemos resultados interessantes e estávamos a ficar cada vez mais habituados quando tivemos novamente que parar. Mas para a nossa evolução foi muito importante.

O projeto da AutoAçoreana Racing foi o primeiro passo para tudo o que veio a seguir?

O projeto com a AutoAçoreana Racing foi o início daquilo que pretendíamos. Tínhamos uma meta traçada porque sabíamos o que era preciso. Sabíamos também que era preciso contar com o fator sorte. Apresentamos o projeto, a ideia foi lançada e a partir daí demos continuidade às nossas ideias, colocamos em prática e o Grupo AutoAçoreana foi sempre connosco e disponibilizou-nos todos os meios possíveis para que estivéssemos, a cada prova, o mais rápido possível, em termos de competitividade.

A escolha do Citroën C3 Rally2 também não é inocente?

A AutoAçoreana fez um investimento quer em pilotos açorianos, quer em mecânicos açorianos e também a representar uma marca da AutoAçoreana, o que fazia todo o sentido. Além disso, é um carro que tem dado provas na Europa, onde ganhou vários campeonatos. É um carro bastante competitivo e este foi um projeto bem delineado e bem executado pelo Grupo AutoAçoreana.

No início do ano quais eram os objetivos da equipa para a época de 2021?

Nunca traçamos uma meta em termos de resultados. Sabíamos o que podíamos fazer e nunca houve qualquer tipo de pressão para ganharmos ou fazer o resultado A, B ou C. A única coisa é que tínhamos de ter a certeza que íamos para os ralis com todas as condições que eram possíveis. Mesmo com um orçamento limitado, tínhamos todas as condições para deixarmos nas corridas o que sabíamos e ficar com a sensação de dever cumprido, sabendo que um projeto desta dimensão tinha que ter uma imagem de uma equipa lutadora e ganhadora. Penso que foi isso que fizemos em todas as provas, dando sempre o melhor em cada uma delas, sabendo que a cada troço é possível melhorar sempre. Esse foi sempre o nosso foco, e nunca o de termos que ganhar sempre ou o de ganhar o campeonato. Isso nunca foi falado.

Em que altura do campeonato começou a ver que a conquista do título podia ser uma realidade?

Talvez a partir do Pico. Foi aí que sentimos que estava muito perto. Sabíamos que se ganhássemos no Pico aquele triunfo abrir-nos-ia as portas para o título, porque dependíamos só de nós. Bastava fazer a última prova, terminar e fazer 15 pontos. Foi no Pico que tivemos o click que podíamos ser campeões. Mas tivemos de trabalhar muito e essa foi uma época de muito empenho e muita dedicação.

Das sete provas do calendário, qual a que ficou como a melhor do ano?

Das sete, as melhores foram as que ganhámos! Não posso negar que correr na Terceira... A Terceira para nós é diferente. Não sei porquê! O público, as estradas... Ganhamos duas vezes na Terceira e para nós foi muito bom e foi um sentimento muito especial. O público puxou muito por nós, as pessoas aderem ao desporto motorizado, enchem as estradas, vibram muito e isso transmite uma sensação muito boa.

E se tivesse que eleger o ponto menos positivo do ano, qual seria?

O ponto menos positivo foi a nossa desistência no Azores Rallye. Não temos tido muita sorte nessa prova. É um rali para o qual trabalhamos muito, dedicamos muitas horas e acontece sempre algo.
E desta vez logo a abrir o rali!
Logo na primeira classificativa! Tínhamos feito no carro uma profunda revisão e tínhamos colocado componentes que nem estavam nas horas e nos quilómetros exigidos para mudar, para que nada falhasse. E quando tudo indicava que podíamos fazer uma boa prova, depois do Qualifying onde fomos os melhores açorianos e os melhores portugueses, logo no primeiro troço a mecânica traiu-nos, tivemos um problema de transmissão. Trabalhamos tanto, dedicamos muitas horas e nem concluímos uma etapa do rali. Um momento que para nós não foi fácil...

O Luís Miguel Rego foi o seu principal adversário. Pontualmente tivemos a presença do Ricardo Moura e a determinada altura o Rafael Botelho também esteve metido na luta. Que importância teve para o campeonato o facto de terem estado mais de dois pilotos envolvidos na luta pelos primeiros lugares nas diferentes provas?

Cada vez mais os campeonatos são mais competitivos. O Luís Miguel, que era o nosso adversário, quer o Rafael, têm vindo a evoluir muito. O Luís era o detentor do título e sabemos que é um piloto muito rápido, tem uma equipa muito forte, tem um profundo conhecimento do campeonato, coisa que não temos. Conhecem muito bem as provas todas, têm um excelente carro, é uma equipa muito coesa, muito sólida, sabíamos que seria muito difícil batê-los. Para nós era o adversário mais direto. O Rafael tem vindo a demonstrar que tem vindo a ficar mais rápido, tem uma boa equipa e é uma equipa que tem dado os seus frutos. Esteve sempre na luta quase até ao final e penso que foi uma mais valia para todos nós.

Essa competitividade, a manter-se, o que é que o Campeonato dos Açores de Ralis (CAR) vai ganhar?

Penso que o campeonato só tem a ganhar com isso, as marcas, o próprio desporto em si não fica tão monótono porque já não ganha sempre o mesmo. Só assim é que os campeonatos têm valor quando são disputados até à última prova, até ao último troço, até ao último metro. Só assim é que conseguem também novos patrocinadores.
De que forma se poderia potenciar ainda mais a atratividade do campeonato, não só para pilotos, mas também para as organizações e para os patrocinadores?
Aparecer mais pilotos e mais carros, o que não é fácil. Estes projetos têm alguma dimensão monetária. Montar um projeto para correr no CAR, a este nível, não é fácil. Existem muito valores que não estão a correr ou que poderiam voltar a correr e que dariam mais competitividade ao campeonato.

O figurino do campeonato poderia ser uma alavanca para trazer mais pilotos?

Sim. E os clubes deviam apoiar mais os pilotos de uma forma em geral. Temos um campeonato muito caro. Em termos logísticos, as deslocações para as outras ilhas, seja ao nível das passagens aéreas e transporte marítimo, absorvem a maior parte do orçamento. Os clubes podiam tentar receber apoio do governo para as equipas poderem transportar a sua logística e todos os seus elementos sem qualquer custo, como acontece por exemplo no futebol; ou então recebermos um apoio para transportarmos os carros e isso já facilitava muito. Sei que há pilotos que não vão correr às outras ilhas por causa destes encargos que são muito avultados. Caso pudessem participar, a sua presença daria maior competitividade, não só na luta pelos primeiros lugares, mas principalmente nas outras classes.

A própria lógica de organização das provas ao longo do ano, também poderia sofrer um reajuste, para potenciar o surgimento de mais pilotos?

Penso que o campeonato, e julgo que todos concordam comigo, teríamos que ter terra-asfalto ou vice-versa, asfalto-terra. Não tanto como aconteceu este ano, e julgo que este ano foi só uma situação que não era bem a que foi delineada, mas foi a possível devido às condições da pandemia. Mas se pudéssemos fazer as primeiras três ou quatro provas em terra e as restantes em asfalto, ou vice versa, quatro provas em asfalto e depois três em terra. Esta solução, em termos de custos, minimiza muito os orçamentos porque estarmos a passar o carro de terra para asfalto requer um tratamento diferente: componentes, decoração, pintura, pneus, jantes... Num carro da categoria Rally2 troca-se praticamente tudo, só fica a carroçaria e o motor porque tudo o resto é trocado. Estar num mês a fazer terra e no mês seguinte asfalto, obriga a ter de estar muitas vezes a trocar o carro e isso torna-se bastante desgastante.

O projeto para 2022 já começou a ser preparado?

Para ser honesto, ainda não falamos muito sobre 2022. Estamos a aguardar a divulgação dos calendários dos campeonatos para vermos o que podemos fazer no Nacional, fora o campeonato regional. O foco vai ser sempre o campeonato regional. Gostaríamos, e temos a intenção e é a nossa obrigação enquanto campeões, representar a marca Açores lá fora. Temos de conciliar os calendários dos dois campeonatos e ver o que será possível fazer, ou não.

Uma presença efetiva no Campeonato de Portugal está colocada totalmente de parte?

Vamos estudar todas as possibilidades. Só temos uma viatura e temos que perceber se a equipa pretende avançar para uma eventual participação ou com o aluguer de um carro ou perceber se o nosso carro vai poder ir e vir e ter o tempo necessário de preparação entre as provas. Queremos estar em força e o foco será sempre o campeonato regional e não desviarmos muito as atenções para campeonatos que não são nossos. Vamos estudar a possibilidade de poder participar em uma ou outra prova.

O objetivo será revalidar o título de campeão dos Açores?

O objetivo é ser sempre o mais competitivo possível em cada prova, em cada classificativa. Vamos dar continuidade ao que temos feito, a estrutura vai manter-se, o carro também, para que possamos, ou não, dar continuidade ao que temos vindo a fazer em todas as provas.

Como é que surgiu a paixão pelos carros e o ‘bichinho’ dos ralis?

Foi sempre uma coisa que me disse muito. O meu pai não é ligado a este desporto, nunca foi, mas desde muito cedo ele levava-me para o troço das Sete Cidades para vermos os pilotos passarem no troço. A partir desse momento comecei a vibrar muito com os carros e comecei a sentir que aquele era o meu mundo. Sempre gostei muito do desporto motorizado, quer motos, quer carros. Comecei a fazer algumas provas de autocross, também tive algumas participações em motas, mas os carros foi sempre uma coisa que me chamou muito. Quando me sentava num carro de corridas sentia-me bem e foi assim que surgiu o gosto pela modalidade.

O Rúben Rodrigues ainda lembra-se do primeiro rali que disputou?

Lembro-me. Foi, juntamente com o meu irmão, com um Toyota Starlet numa prova que não era federada. Foi numa daquelas provas que o professor Carlos Martins organizava, umas rampas que se fazia na altura aqui na ilha. Foi uma coisa que se perdeu em São Miguel, porque assim não se potenciam novos valores para a modalidade. Foi numa dessas provas que me iniciei, com um carro praticamente de origem. O roll bar tinha sido feito por nós na serralharia, colocamos uns bancos e fomos fazer umas provas. Começamos nas provas organizadas pelo professor Carlos Martins e foi ali que nasceu a nossa vontade e onde tirávamos grande satisfação a fazer ralis. Aquele ambiente perdeu-se. Hoje não se faz nada em termos de iniciação. Não vejo ninguém de novo a entrar neste desporto e esse é um fator que preocupa-me. Acho que teriam de ser criados incentivos para pilotos mais novos enveredarem na modalidade porque olhando o panorama a nível regional, são sempre os mesmos! E os mesmos não vão durar para sempre...

Tirando o atual Citroën C3 Rally2, de todos os carros que já conduziu nos ralis, qual é o que ainda guarda na memória com algum carinho?

O Peugeot 208 R2! Fizemos dois anos o campeonato regional com aquele carro e algumas provas no continente. Foi um fiel amigo, um carro que nunca nos deu qualquer problema. Estava sempre muito bem preparado, muito robusto e foi uma excelente escola. Foi um carro que nos ensinava a conduzir, um carro que fazia tudo aquilo que queríamos, sem reações estranhas. Foi um carro muito, muito bom para nós e que nos deixou bastantes saudades.











PUB
Regional Ver Mais
Cultura & Social Ver Mais
Açormédia, S.A. | Todos os direitos reservados