Autor: Lusa/AO Online
Numa intervenção num encontro com legisladores norte-americanos em Lisboa, promovido pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), Cravinho defendeu que a resposta que tem sido dada à crise provocada pela guerra na Ucrânia tornou clara a necessidade de a União Europeia (UE) e os Estados Unidos da América (EUA) trabalharem em conjunto.
“Há um sentido crescente de que estamos a falar de algo que vai estar connosco durante algum tempo, durante alguns anos, dois, três anos, provavelmente, à medida que o lado militar se vai desgastando e que a reconfiguração política leva o seu tempo a tornar-se aparente”, disse o chefe da diplomacia portuguesa.
João Gomes Cravinho disse também que as sanções ocidentais contra a Rússia terão “efeitos graves nos bolsos do russo médio dentro de alguns meses”, porque as medidas para as atenuar dotadas pelas autoridades de Moscovo só têm efeito a curto prazo.
“O problema que a Rússia enfrenta é que as sanções não vão ser levantadas”, afirmou o chefe da diplomacia portuguesa.
Numa reação à invasão da Ucrânia, a 24 de fevereiro, a UE, os EUA e outros países, como o Japão, têm decretado sucessivos pacotes de sanções contra a Rússia, além de fornecerem armamento às forças de Kiev.
O encontro de dois dias promovido pela FLAD reúne 19 membros do Congresso norte-americano e de senados estaduais com ascendência portuguesa, que vão ouvir uma intervenção do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Na sua comunicação no encontro da FLAD, João Gomes Cravinho salientou que a relação transatlântica é baseada em valores partilhados há mais de sete décadas, como a democracia, a liberdade, o multilateralismo, o Estado de direito e os direitos humanos.
Admitiu que, por vezes, há algumas divergências entre os dois lados do Atlântico, mas considerou que são “relativamente menores em comparação com os interesses partilhados” e que a relação deve ser encarada no longo prazo.
“A colaboração transatlântica tem de ser central em questões como a transição digital, energia verde sustentável, em toda a gama de desenvolvimentos sociais e económicos sustentáveis”, defendeu.
Cravinho considerou que o Ocidente surpreendeu a Rússia ao reagir de forma coerente e consistente, e que uma das consequências da crise foi o fortalecimento da cooperação entre a UE e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO).
O conflito iniciado há 68 dias, segundo o ministro, fez também com que as questões da defesa e segurança se tornassem prioritárias pela primeira vez na Europa desde o fim da Guerra Fria, em 1991.
Recordando aos legisladores norte-americanos que foi ministro da Defesa no executivo anterior, Cravinho disse que a arquitetura da segurança europeia passa por uma parceria forte entre a UE e a NATO.
Referiu que Portugal é a favor do desenvolvimento de uma identidade de defesa europeia, mas que isso não é incompatível com a relação com a NATO.
Nesse sentido, ironizou que o líder da Rússia, Vladimir Putin, “tem sido extremamente bem-sucedido em produzir o resultado oposto de tudo o que pretendia”.
“Um dos aspetos é precisamente este entendimento claro entre todos os europeus de que a NATO, e a relação com os EUA, é fundamental para os nossos interesses de segurança mais básicos”, disse.
A energia é outro setor em que João Gomes Cravinho disse ver um efeito contrário aos interesses russos, dado que a guerra na Ucrânia expôs a excessiva dependência da UE em relação à Rússia.
Cravinho salientou que Portugal não está dependente do gás e petróleo russos e iniciou a transição energética há mais de uma década, o que permitiu que cerca de metade das necessidades do país sejam asseguradas pelas energias renováveis.
Nas alternativas aos fornecimentos russos, defendeu que Portugal pode ter um “papel significativo” com o porto de Sines, porque os EUA são o maior fornecedor de gás natural liquefeito da UE.
Cravinho disse ainda aos legisladores luso-americanos, maioritariamente com raízes nos Açores, que o arquipélago voltou a ganhar relevância geopolítica.
“Devido a estas novas ameaças russas, estamos a descobrir que o Atlântico está a tornar-se cada vez mais politicamente relevante”, disse.
Nos desafios futuros, considerou que a “ascensão da China é um enorme desafio para todos” e defendeu a importância do combate às alterações climáticas e à preservação dos oceanos, lembrando a conferência da ONU que Portugal vai acolher no final de junho.