Autor: Lusa/AO Online
O relatório foi elaborado após uma inspecção feita no ano passado a três hospitais que internam pacientes "involuntários" (sob a Lei da Saúde Mental e o Código Penal), pelo Comité Europeu para a Prevenção da Tortura e Tratamento Desumano ou Degradante (CPT), um organismo do Conselho da Europa.
Entre 14 e 25 de Janeiro, o CPT visitou a Casa de Saúde de São João de Deus (Funchal, Região Autónoma da Madeira), o Hospital Psiquiátrico Miguel Bombarda e a secção psiquiátrica do Hospital Curry Cabral (ambos em Lisboa).
O CPT aponta maior número de deficiências nas condições de "tratamento" dos pacientes, tendo encontrado, nos Hospitais de São João de Deus e Miguel Bombarda, situações em que a medicação de emergência foi "generalizada", sem a "vigilância apropriada do pessoal médico" e com "demasiada responsabilidade dos enfermeiros", o que pode "deixar a porta aberta para um possível abuso".
A delegação europeia descreve também situações em que os medicamentos são dissolvidos na comida dos pacientes, "sem o seu consentimento".
"O CPT recomenda uma revisão da abordagem do uso da medicação", revela o relatório, a que a agência Lusa teve acesso.
O Governo português, através de representantes dos Ministérios da Saúde, da Justiça e da Administração Interna, elaborou uma resposta ao relatório do CPT, divulgada também hoje em Bruxelas.
Na resposta, as autoridades portuguesas admitem que em São João de Deus a prescrição da medicação de emergência é feita "sem a prescrição médica ou psiquiátrica, mas de enfermeiros" do Hospital Central de Faro, de onde chega a "maioria das admissões psiquiátricas de urgência".
No Hospital Miguel Bombarda, o novo director clínico estará a rever a "política de prescrição", segundo as "recomendações do CPT".
Também na Casa de Saúde de São João de Deus, o comité europeu encontrou um paciente recém admitido com "sinais claros de excesso de sedativos", que, segundo o director clínico da unidade, questionado pelo CPT, terá afirmado que "essa era uma política da casa relativamente a novos pacientes internados".
"Recomendamos que as autoridades tomem as medidas necessárias para acabar com esta política", sublinha o CPT no relatório, prática que o Governo desmente.
Durante a visita ao mesmo hospital, o comité europeu encontrou mecanismos de terapia electroconvulsiva (ETC), não tendo informação de uso "excessivo", mas sublinhado o "potencial abuso" que pode decorrer da ETC e sugerindo a criação de "linhas orientadoras e supervisão médica".
Recomendações que o Governo admite seguir, salientando que o hospital não recorre a esta terapia "há mais de quatro anos".
A delegação do comité europeu também relata no mesmo relatório a "falta de controlo de isolamentos compulsivos", descrevendo um caso de 2006 em que um enfermeiro do Hospital Miguel Bombarda terá sido agredido por um paciente, tendo-o isolado num quarto de segurança num período de pelo menos 15 dias.
O CPT aconselha o Governo português a tomar as medidas para "remediar" a situação, através de um aumento da preparação das equipas médicas para lidar com pacientes potencialmente violentos, conselho que já está a ser seguido pelas equipas do Governo.
A CPT sugere ainda às autoridades portuguesas a criação de uma brochura que enumere os procedimentos e rotinas a ter com os pacientes psiquiátricos - medida que o Governo assume tomar - e exige que a Inspecção-Geral das Actividades da Saúde "efectivamente" cumpra as suas "funções de supervisão".