Autor: Miguel Bettencourt Mota
Apresenta o ‘Vive’, curta-metragem documental da sua autoria e de Filipe Tavares, esta quinta-feira, na Índia. Que mensagem pretende transmitir?
O “core value” do filme está relacionado com o impacto
que a prática de yoga teve na vida de um grupo experimental composto por
86 utentes do Centro de Saúde de Ponta Delgada. Quis revelar, através
do testemunho direto e espontâneo dos participantes, quais os ganhos em
saúde que obtiveram após seis meses de prática regular de yoga, bem
como, reforçar o potencial terapêutico que as intervenções mente-corpo
(tal como, yoga, meditação mindfulness, qigong, pilates, acupuntura,
reiki, etc.) podem ter se inseridas no sistema público de saúde.
Quais são as grandes problemáticas que o ‘Vive’ aborda e deixa a nu?
Na
minha opinião, as duas grandes problemáticas são a sobremedicação da
sociedade e a desresponsabilização da população pela sua saúde (...).
Observamos uma população cada vez mais dependente do binómio
médico-farmacêutico, onde a doença (e não a saúde) assume um lugar
central. É necessário mudar de paradigma, através do conhecimento e
integração de abordagens terapêuticas mais naturais. A população tem de
se capacitar que a saúde começa e termina na atitude que assumem perante
a vida, na forma como percecionam os seus problemas e nas escolhas e
hábitos diários.
A Sara é médica interna de Medicina Geral e Familiar na Unidade de Saúde de Ilha de São Miguel, mas também formada em Medicina Tradicional Chinesa. Como olha à integração dos modelos holísticos no Serviço Regional de Saúde (SRS)?
Ainda com muitas
resistências... Existem ainda lacunas e necessidades basilares nos
Cuidados de Saúde da Região, tais como a falta de profissionais de
saúde, a necessidade imperativa de se criar e generalizar os núcleos de
saúde familiar, às vezes até a falta de recursos materiais básicos. O
SRS encontra-se focado a investir na colmatação destas e outras falhas.
No entanto, estas fragilidades não podem ser impeditivas de se pensar e
apoiar projetos inovadores para a saúde dos açorianos e para um
desenvolvimento mais sustentável do SRS.
O corpo médico é ainda algo renitente a aceitar a complementaridade das terapias naturais?
Gradualmente
assistimos a uma maior abertura por parte do corpo médico,
principalmente nas novas gerações de médicos, com um novo olhar para a
dimensão holística da saúde e do ser humano. No entanto, a formação
médica sobre o potencial terapêutico das medicinas não convencionais é
quase nula. As faculdades de medicina não oferecem formação sobre as
técnicas utilizadas, os seus efeitos e benefícios, as precauções e
contraindicações, bem como a investigação desenvolvida nestas áreas.
Mediante o desconhecimento, é difícil o médico recomendar, referenciar
ou aceitar a sua complementaridade.
No que respeita diretamente aos Açores, o que se revela como mais preocupante?
(...) As perturbações de ansiedade, depressivas ou mesmo as perturbações de adaptação a eventos traumáticos ou geradores de (dis)stress são cada vez mais prevalentes entre os açorianos (...) Segundo o último Inquérito Regional de Saúde dos Açores (2014), mais de metade da população é sedentária e cerca de 32% dos açorianos, com idades entre os 20 e os 74 anos, sofre de distúrbios psicológicos. Uma outra problemática importante que a nossa Região enfrenta, relaciona-se com a iliteracia para a saúde. Há um grande desconhecimento sobre quais os comportamentos de vida mais saudáveis (hábitos alimentares, de sono, gestão de stress, consciência corporal e postural, regulação emocional e dinâmica familiar), bem como sobre o correcto acesso aos cuidados de saúde primários e secundários.
...Está em crer que, por exemplo, o yoga pode substituir uma prescrição médica convencional, como um antidepressivo ou um ansiolítico?
Acredito que o futuro passa pela Medicina
Integrativa, uma nova abordagem médica que alia o melhor da medicina
convencional com os benefícios das terapêuticas não convencionais. Países como a China,
Inglaterra, Cuba e Brasil, encontram-se na vanguarda da Medicina
Integrativa. Os seus utentes quando recorrem aos Cuidados de Saúde
Primários é lhes oferecido uma abordagem integrada com a
possibilidade de terem acesso a práticas como a Medicina Tradicional
Chinesa, a Medicina Ayurveda, o Yoga, a Massagem Terapêutica, a
Osteopatia, a Terapia Termal, entre outras.
De certa forma, o estudo de investigação que desenvolvemos constituiu
um primeiro passo para essa transição, uma vez que os participantes
foram referenciados pelos profissionais de saúde da Unidade de Saúde de
São Miguel (USISM).
Esta perspectiva
integrativa começa a manifestar-se na nossa Região. Exemplo disso,
temos o excelente trabalho que está, actualmente, a ser desenvolvido
nos Cuidados de Saúde Secundários, pela Comissão Hospitalar de
Práticas Naturais e Integrativas do Hospital Divino Espírito Santo
e pelo projecto “Exercitar”, destinado a doentes oncológicos.
Tem esperança que o filme possa ser visto na Região?
Neste momento, lançamos
o trailer promocional do “VIVE” na página do Facebook da ARTAC -
Associação Regional para a Promoção e Desenvolvimento Sustentável
do Turismo, Ambiente, Cultura e Saúde, associação parceira deste
projeto. Após a sua estreia no FISFA, o filme será disponibilizado
na internet e acessível a todos. Pretendemos também divulgá-lo a
todos os colaboradores da USISM, bem como, em conferências médicas
ou eventos na área da saúde. Acima de tudo, o nosso principal
objectivo é que se crie uma reflexão pública sobre o panorama
atual dos cuidados de saúde primários da Região, qual a sua
importância e quais as melhores estratégias para a sua melhoria e
desenvolvimento sustentável.
-
Serviços da CUF custaram quase 4 milhões de euros ao Serviço Regional de Saúde
-
Amanhã, dia 21 de março
“The Elderly” de Paula Sousa Lima apresentado na Letras Lavadas