Autor: Paula Gouveia
Muitos assinantes do Açoriano Oriental nem o chegam a ver, mas sabem que já passou pela sua casa todos os dias. António Frias é o mais antigo distribuidor do Açoriano Oriental.
Tinha 24 anos quando começou a levantar-se ainda de madrugada para garantir que na zona do concelho de Ponta Delgada que lhe está reservada ninguém ficava sem o seu jornal diário.
Hoje, com 73 anos, garante: “só quando não puder mais é que vou desistir de ser distribuidor”.
Agora tem uma mota que o acompanha pelas ruas da freguesia da Fajã de Cima e pela zona da Arquinha, mas no início da década de 70, quando começou a acumular a distribuição do jornal com o seu trabalho num armazém de venda de artigos de mercearia, era a pé que percorria os caminhos com os jornais destinados aos assinantes.
“Eu entrava às 8h30 nos armazéns e por isso acordava às 5h00 da manhã. Vinham trazer-me a casa os jornais, e eu começava depois a fazer a distribuição”, lembra, explicando que nesses primeiros tempos não tinha transporte, “porque não havia dinheiro para isso”.
“Eu fazia a distribuição a pé”. E fazer a entrega dos jornais em cada casa, sempre a pé “levava mais de três horas”, diz António Frias.
“Eu estou a distribuir na Fajã de Cima desde 1971 e na Arquinha comecei três anos depois”, recorda as datas sem hesitar.
Conta que, “antigamente, não havia correio nas casas, por isso batia às portas para dar o jornal. E se não vinha ninguém à porta, ponha o jornal debaixo da porta”.
E já houve tempos em que tinha de repetir esses gestos em mais de duas centenas de casas. “Há cada vez menos assinantes devido à internet. Eu já tive mais de 200 assinantes e agora são muito menos”, repara este homem madrugador que confessa que teme que um dia haja jornais, mas não exista quem os receba em papel em casa, e assim desapareça a profissão de que tanto gosta.
“Eu sempre gostei deste trabalho”, diz com satisfação na voz. “E é uma ajuda para a minha vida, para sustentar a minha família”, repara.
E porque aprecia tanto essa tarefa? António Frias diz que é porque gosta de saber que faz parte da rotina de quem assina o jornal. “Falo com as pessoas, e elas são simpáticas - há pessoas que me estimam. E há quem diga: ‘cá vêm notícias frescas!’ E muita gente já está à espera de manhã do jornal, para a sua rotina diária antes de sair de casa”, explica.
Não gosta de deixar os clientes insatisfeitos. Faça chuva ou faça sol, o jornal chega pelas suas mãos a quem o assina. “Quando chove, tenho botas de cano e visto o oleado, porque o cliente não pode deixar de ter o jornal”, diz.
Há cerca de 10 anos que está reformado do seu trabalho a tempo inteiro, mas o Açoriano Oriental continua a fazer parte do seu quotidiano.
Tal como o mais antigo jornal português, só tem folga dois dias por ano, precisamente os únicos dois dias em que o jornal não é publicado.
“Há alguns jornais na nossa terra, mas como o Açoriano Oriental não há!”, assegura com uma nota de orgulho e certeza na afirmação.