Autor: Inês Linhares Dias e Pedro Primo Figueiredo/Lusa
“Da minha janela consigo ver um minimercado pequeno que tenho aqui em frente a minha casa. Por acaso agora está aqui uma carrinha de fornecedores, portanto, creio que o fornecimento está a decorrer normalmente. De resto, veem-se muito poucas pessoas. Vê-se passar os carros de lavradores e pouco mais”, conta Rui Medeiros, que vive na Vila de Nordeste.
Com quase cinco mil habitantes, segundo os dados da PORDATA referentes a 2018, o concelho do Nordeste é o menos povoado dos seis municípios da ilha de São Miguel - todos os concelhos estão desde hoje em cerca sanitária decretada pelo Governo dos Açores, sendo proibido, salvo exceções particulares, circular entre eles.
Na visita que a agência Lusa fez hoje ao concelho, a única concentração de pessoas verificava-se no posto de correios, estando a população idosa em maioria clara entre os que esperavam acesso ao espaço.
O concelho não é dotado de um hipermercado, fazendo os locais as suas compras em pequenas superfícies comerciais - com a cerca montada desde hoje é proibido atravessar para os concelhos vizinhos e ir à Ribeira Grande, por exemplo, fazer compras.
O concelho nordestino faz fronteira a sul com a Povoação e a oeste com a Ribeira Grande. Por ser o mais distante de Ponta Delgada, chegou a ser apelidado de “décima ilha dos Açores”, antes da construção da via rápida sem custos para o utilizador (SCUT) ter facilitado o acesso ao município, que compreende 13 freguesias.
Volta agora a estar isolado, como todos os seis municípios da ilha de São Miguel, depois de ter sido decretada, esta quinta-feira, uma cerca sanitária que limita a circulação entre concelhos a profissionais de saúde, jornalistas em funções, ao abastecimento de bens essenciais à população da ilha e à manutenção da atividade de setores tidos por fundamentais, como a pecuária ou as pescas.
Rui Medeiros concorda “plenamente” com a medida e considera que, “se calhar, já devia ter sido tomada há mais tempo, uma vez que já se está a espalhar”.
O munícipe não acredita que o isolamento “venha dificultar, porque tudo estava fechado”.
“Desde que o abastecimento ao concelho seja feito, não vejo como possa dificultar, uma vez que já estávamos em plano de contingência”, prossegue.
Lúcia Silva também concorda com a medida decretada pelo Governo Regional: “Se isso protege a gente para não acontecer nada, pronto, quando isto melhorar a gente há-de sair para ir dar as voltas que dávamos antes”.
A moradora da freguesia da Achada só sai de casa para “trabalhar, ir ao supermercado, no Nordeste, e pagar as contas, que agora são pagas por multibanco”.
“Pena é que a gente quer luvas, quer álcool e tudo e nas lojas aqui em cima não há nada. É um caso muito sério”, lamentou.
Trabalhava num alojamento e presta apoio a uma idosa, mas o alojamento fechou, por isso, agora só presta auxílio a uma senhora de 93 anos.
“Ela não está preocupada e eu também não ‘tou’. O que for para a gente, é para a gente, não é para mais ninguém. Há-de ser o que Deus quiser”, afirmou a cuidadora, garantindo, no entanto, que “protege-se da maneira que pode”.
No primeiro dia de cerca sanitária, o cenário na Achada é o mesmo dos últimos dias: “Eu vejo aqui tudo mais ou menos na mesma. Quem sai são os lavradores e as pessoas para ‘terminar’ a sua vida. O resto é em casa”, afirmou.
Em torno da Ribeira Grande, segundo maior concelho de São Miguel, são vários os agentes de segurança a bloquear acessos, e ao começo da tarde era pouco o tráfego local, ao contrário do verificado de manhã nas ligações entre Ponta Delgada e os concelhos adjacentes.