Açoriano Oriental
“Padre dos pobres” mantém aos 92 anos rede de apoio a indigentes nos Açores

Weber Machado Pereira, que liderou durante 40 anos a Cáritas nos Açores, mantém, aos 92 anos, uma rede de apoio a indigentes na ilha de São Miguel, visando assegurar-lhes “condições de dignidade”.

“Padre dos pobres” mantém aos 92 anos rede de apoio a indigentes nos Açores

Autor: Lusa/AO Online

Conhecido na ilha de São Miguel como o “padre dos pobres”, monsenhor Weber Machado, como é amistosamente designado, cedo começou a desenvolver esforços para fazer face às necessidades básicas dos mais necessitados, através da alimentação e criação de abrigos para habitabilidade.

Promove ações de apoio à sua recuperação das dependências e a inserção social, com o apoio de instituições de saúde e profissionais mobilizados para esta causa social.

Durante décadas, o padre mobilizou uma rede de apoio constituída por voluntários de instituições bancárias, instituições particulares de solidariedade social, organizações gastronómicas, médicos do Hospital de Ponta Delgada e jovens, entre outros.

Confecionavam a alimentação que era providenciada aos mais favorecidos para os dotar “pelo menos de uma refeição decente por dia”.

Weber Machado, que manifesta “grande apreensão” com o que considera ser o atual “elevado número de indigentes”, de forma particular na ilha de São Miguel, detém hoje uma parceira com a Casa dos Manaias, projeto da Câmara Municipal de Ponta Delgada que visa a intervenção junto da população em risco ou sem-abrigo no centro histórico do burgo.

O espaço serve de base para o fornecimento de alimentação aos pobres, que abrange atualmente cerca de 60 pessoas.

Todos os dias da semana, com base nos voluntários mobilizados, estes indigentes podem jantar no local ou levam as refeições, dando-se-lhes assim um “pouco de dignidade humana”.

Alguns destes pobres que deambulam pelas ruas de Ponta Delgada encontram-se em casas particulares, onde são recebidos pelos seus proprietários, mediante o pagamento de uma renda com base nos valores que recebem do Rendimento Social de Inserção.

Weber Machado refere que “não se pode exigir muito de quem vive na miséria” para apontar que há um “grande quadro de exigências por parte das assistentes sociais que desmotiva a recuperação dos sem-abrigo e dos pobres”, havendo que "rever procedimentos para os recuperar socialmente".

Weber Machado vendeu o seu apartamento para comprar 1.700 cabazes alimentares para pobres na ilha de São Miguel, no valor aproximado de 75 mil euros, motivado pelos impactos sociais e económicos causados pela pandemia da covid-19.

“Há hoje mais sem-abrigo, mais pessoas a necessitar de ajuda, mais pobres. Sempre existiu pobreza, mas nunca como hoje houve possibilidades de resolver o problema, não ao ponto de a erradicar, porque ela vai sempre existir, mas de a atenuar significativamente. Numa sociedade que diz que não quer deixar ninguém para trás, há muito que fazer em coerência”, afirma Weber Machado.

Considera que “as desigualdades sociais “são hoje de uma violência enorme”, havendo “gente a ganhar muito dinheiro e outros a viver de migalhas e de sobras”.

O sociólogo Paulo Fontes, em declarações à Lusa, em agosto, alertou que os indigentes em Ponta Delgada são um problema “muito mais profundo do que uma questão de polícia“, pedindo mais respostas de saúde e habitação no concelho, que tem 70% dos sem-abrigo dos Açores.

O professor universitário sublinhou que a “perceção das pessoas que trabalham no terreno” é que o número de pessoas em situação de indigência está a aumentar na maior cidade açoriana.

Paulo Fontes evocou o estudo que coordenou para a Associação Novo Dia, referente a 2020, que identificou 493 sem-abrigo nos Açores: 75,7% estavam na ilha de São Miguel, 69,8% no concelho de Ponta Delgada.

Segundo dados da Pordata, os Açores são a segunda região do país com maior nível da desigualdade de rendimentos (33%), apenas superados pela zona Centro (33,3%), tendo ainda uma taxa de exclusão social (27,7%) superior à média nacional (de 22,4%).


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