Autor: Susete Rodrigues
Cristóvam, músico, cantautor, produtor e compositor, nasceu na ilha Terceira e desde sempre teve uma ligação à música, mesmo quando ainda não pensava em ser músico profissional. Das suas memórias de infância recorda-se de ver com o pai o concerto dos Pink Floyd em Berlim, “na altura era em cassete de VHS e víamos também outros concertos. O meu pai gostava muito de ver concertos e acho que isso fez crescer esse bichinho da música e mais tarde ter vontade de aprender a tocar um instrumento”.
Conta-nos também que havia um grande amigo da família, o “Peres, que costumava tocar nas festas que os meus pais organizavam, ele tocava guitarra e tocava muito bem, penso que foi isso que fez-me querer ter uma guitarra aos 11 anos”, disse para acrescentar que “a partir daí, gradualmente a música passou a fazer parte dos meus tempos livres e aos 15/16 anos estava completamente viciado na música”.
Começa a gravar as suas maquetes e “lembro-me de ter gravado uma demo - na altura a MySpace era o sítio onde os músicos eram ‘descobertos’ – coloquei essa demo lá e recordo-me de ter mandado uma mensagem ao Gomo, que é um músico português que passava muito na MTV, com a música ‘Feeling Alive’”.
A mensagem que enviou era a dizer que “gostava muito que ele ouvisse a minha música e que conselhos poderia dar-me porque seria incrível para mim aprender com ele”. Ao fazer isso, Cristóvam nunca pensou em obter resposta, mas o certo é que a teve e com ela surgiu o convite para ir a Lisboa. Com 16 anos, Cristóvam foi para Lisboa, na ocasião, “o Gomo apresentou-me uns amigos que naquele dia estavam a tomar café com os ‘The Gift’ e para mim foi algo maravilhoso - hoje em dia já não se pensa assim, mas naquela altura o nosso pensamento era de que seria impossível chegar àquelas pessoas - e quando regressei, lembro-me de ter o pensamento de que há coisas que não são impossíveis porque já vi, com os meus olhos, que é possível chegar a estas pessoas”.
Questionado sobre qual a reação da família quando disse que queria ser músico profissional, Cristóvam afirma que “foi muito tranquila”, explicando que “os meus pais são pessoas que criaram o seu próprio negócio e levaram isso com muito entusiasmo. Eles apoiaram muito o meu trabalho e foi muito bom poder contar com o apoio deles logo no início”.
O músico conta que as tais maquetes do MySpace fizeram com que a “minha música chegasse à Radio Clube de Angra. Depois houve uma festa aqui na ilha (Terceira), as Festas de São Carlos, em que me convidaram para tocar”. Foi nessa altura que descobriu que na ilha Terceira existia um estúdio, mas não era barato gravar uma música e então, “como os meus tinham uma loja de desporto, combinamos gravar a música em troca de uma bicicleta”, recorda. Foi também por esta ocasião, em 2008, que surgem os October Flight, banda que se manteve até 2016. No entanto, o grupo acaba por se separar porque alguns elementos já não viviam na Terceira. “Estava a viver em Lisboa mais o André e o João, os outros estavam cá na ilha e como a música, para mim, era uma coisa que tinha decidido que queria fazer profissionalmente”, havia chegado a altura de seguir a solo.
Este seu percurso a solo não foi fácil, mas teve as suas peripécias que Cristóvam nos revela. Antes, contudo, sublinha: “tentei e tento todos os dias continuar porque, acima de tudo, a música é aquilo que me dá mais prazer na vida. É um privilégio poder fazer música a tempo inteiro”.
Em 2018 edita o seu primeiro disco ‘’Hope and Dreams’, e “no mesmo estúdio estavam a gravar a série ‘Os filhos do Rock’, da RTP e o realizador Pedro Varela ouviu a música, perguntou de quem era, e passado um mês, mais ou menos, ele ligou-me e foi assim que o ‘Walk in The Rain’ fez parte da banda sonora do filme ‘A Canção de Lisboa’. Este foi o princípio de um “longo percurso a trabalhar com ele e com outros realizadores. Acabou por ser um ponto de partida para esta parte da música que gosto muito, que é também fazer parte de bandas sonoras e escrever para guiões”, disse.
Cristóvam pisou vários palcos em Portugal e em outros países, como França, Holanda, Alemanha, Bélgica e Polónia, acompanhando artistas como Stu Larsen, Tim Hart, Scott Matthews. Ora, tudo começa quando conhece o australiano Stu Larsen que veio a Portugal realizar dois concertos e o seu agente na altura que “era o promotor do espetáculo pediu ao agente dele se eu podia fazer a primeira parte dos concertos em Lisboa e no Porto, e fiz”. Nasceu aí uma amizade. Cristóvam refere que “estava na Sardenha de férias com a minha mulher - na altura namorada - e no meu último dia recebi um telefonema do Stu Larsen a perguntar se estava interessado em fazer a primeira parte da tournée dele e respondi que sim, mas teria que estar em Paris, dentro de duas semanas”. Cristóvam disse que sim, mas confessa-nos que estava em pânico, porque “já não tinha dinheiro para ir para França, então cheguei a Portugal e vendi o meu carro”, conta, frisando que “fui ao desconhecido, não sabia o que iria acontecer. Podia ficar sem carro e não construir nada, mas a verdade é que começou a ser o princípio de muita coisa boa para mim. Fiquei sem carro, mas vivi um sonho... um miúdo que vem de uma ilha no meio do Atlântico, onde parecia que tudo era impossível e de repente estou em Paris... foi muito bom”.
Contudo, quando regressa a Portugal teve um choque de realidade, porque foi fazer um concerto na FNAC no Porto e “não estava lá ninguém, só a senhora do café. Foi duro, mas agarrei-me no sentimento de saber o que queria fazer”, afirmou, para acrescentar que naquela tournée “conheci o Tim Hart que acabou por tornar-se no meu produtor deste último disco e do que gravei este ano, em que estive um mês na Austrália a gravar com o Tim, e as coisas foram-se encadeando de uma forma gira e inesperada, e agora aqui estamos”.
No seu currículo conta com prémios e reconhecimentos, mas diz que “nunca foi uma coisa que procurei, nem faço música por causa disso”, reconhecendo que no início da sua carreira os concursos “eram uma forma de combater a ‘insularidade’ porque sabia que estavam a ouvir as minhas canções”, mas sublinha que a sua principal intenção “era sempre tentar com que o meu trabalho fosse ouvido e em alguns casos as coisas correram bem. Claro que quando se tem este tipo de validação acaba por ser um estímulo para continuarmos”.