Autor: Rafael Dutra
Em São Miguel sentiu-se terça-feira um sismo que abalou a ilha, horas depois, um consórcio liderado pelo Governo dos Açores, através da Direção Regional das ObrasPúblicas (DROP), apresentou um projeto que pretende, também, abalar, mas pela positiva, a capacidade desta ilha e da Região em analisar, mitigar e gerir os riscos naturais, em particular os relacionados com os movimentos de vertente.
Desenvolvido no âmbito do programa INTERREG VI-D Madeira, Açores, Canárias (MAC) 2021-2027, o PRISMAC – Análise, Mitigação e Gestão do Risco de Movimentos de Vertente é um projeto técnico-científico, que envolve três regiões da Macaronésia (Açores, Canárias e Cabo Verde), coordenado pela DROPem parceria com o Laboratório Regional de Engenharia Civil (LREC), a Universidade dos Açores (UAc), o Instituto de Investigação em Vulcanologia e Avaliação de Riscos (IVAR), através da Fundação Gaspar Frutuoso, a Universidade de Cabo Verde (Uni-CV), a Universidade Técnica do Atlântico (UTA), a Viceconsejería de Infraestructuras (VI-GOBCAN) e o Instituto Vulcanológico de Canárias (INVOLCAN) .
Na apresentação do PRISMAC, decorrida ontem, na UAc, o coordenador do projeto e arquiteto do DROP, João Rebelo Costa, adianta que o mote para esta iniciativa está relacionado com as derrocadas em 2023, durante a construção de um semi-túnel na Ribeira Quente, freguesia que será o estudo de caso do projeto nos Açores (as restantes regiões irão estudar outras zonas).
Na
ocasião, as derrocadas acabaram por não resultar em danos materiais e
vítimas, devido ao “alerta e alarme fulcral” dado pelos próprios
trabalhadores à população.
“Isto fez com que a DROP percebesse que a
ação preventiva será essencial sobretudo num arquipélago com 1500
quilómetros (km) de estradas que se desenvolvem em áreas de muito
risco”, adiantou João Rebelo Costa.
Este projeto “pioneiro” e de “potencial enorme”, prosseguiu o arquiteto, visa culminar com um “projeto pronto a implementar”, mais concretamente a instalação de um “sistema de alerta e alarme na Ribeira Quente”, que posteriormente terá de ser financiado, de forma a ser executado.
Por agora, o objetivo é, entre as três regiões envolvidas, criar uma “sinergia de conhecimentos “tanto de entidades públicas”, como de investigação”, sendo que, para João Rebelo Costa, com a base científica em comum é possível “ter um projeto altamente inovadora para as três regiões”.
Nesse sentido, pretende-se também criar, tal como acontece com os sismos, um mecanismo de informação que contextualize as características e dimensões do fenómeno em questão e alerte a população.
Por sua vez, o coordenador científico do PRISMAC, Rui Marques, salientou a importância de realizar este estudo na freguesia da Ribeira Quente.
Recordando que, desde o século XX, na ilha de São Miguel já ocorreram 256 movimentos de vertente, “de caráter danoso”, que provocaram a morte de 82 pessoas, bem como 41 feridos, 305 desalojados e 66 edifícios destruídos, o investigador sublinha que mais de um terço destas vítimas mortais (34%) ocorreram na Ribeira Quente.
“Esta freguesia tem uma relevância brutal para nós investirmos capital humano e capital financeiro deste projeto”, destaca o coordenador científico do PRISMAC, acrescentando que a estrada que faz ligação à Ribeira Quente, com cerca de 6,5 kms, é extremamente perigosa e de elevado risco.
Por este motivo, os objetivos principais do projeto estão relacionados com a análise e estudo das três principais dimensões de risco associado aos movimentos de vertente nesta freguesia.
Para tal, serão desenvolvidos, ao longo do projeto, sistemas de monitorização e alerta locais.
“Tudo o que tenha a ver com o diz respeito à cartografia de risco são produtos que vão ser desenvolvidos e acabam por ser estáticos quer para o ordenamento do território, quer para o planeamento de emergência. Os sistemas de monitorização e alerta locais, desenvolvimentos pelo LREC, serão colocados em funcionamento e serão equipamentos do Governo Regional dos Açores que serão mantidos e operacionalizados pelo LREC”, explica Rui Marques.
Além disso, vão atualizar a base de dados que dispõem atualmente e vão desenvolver “tudo o que são algoritmos matemáticos e a parte computacional do sistema”, bem como a “arquitetura de todo o sistema de monitorização e telecomunicações”.
Ou seja, indica o investigador, “tudo o que é monitorização e alarmística para taludes especificamente escolhidas para esse efeito vai continuar para além do projeto”.
Questionado pelo Açoriano Oriental, para o coordenador científico do PRISMAC, o grande desafio deste projeto é o sistema de monitorização e alarme que pretendem criar “à escala regional para todo o vale da Ribeira Quente” e que envolve “algum tipo de sinalização e painéis informativos na estrada”.
Trata-se de algo que
não poderá ser implementado ao abrigo do atual projeto, porque falta
financiamento, mas querem eventualmente concretizar no futuro,
“Fica
a faltar o financiamento para a implementação, por isso é que queremos
deixar o sistema desenvolvido até ao final do terceiro ano do projeto,
para que depois se concorram a outras fontes de financiamento, por
exemplo o PO 2030”, finaliza o investigador.
O PRISMAC, que terminará
no ano de 2028, tem um orçamento total que ascende os 1,2 milhões de
euros e será comparticipado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento
Regional (FEDER) em 85%.