Autor: Nuno Martins Neves
O Tribunal da Relação de Lisboa deu razão ao Ministério Público no recurso que apresentou, relativamente a um caso de atropelamento mortal, nos Açores. Após o Tribunal de Judicial de Ponta Delgada ter condenado um homem a quatro anos de pena de prisão suspensa pelo crime de homicídio negligente, os magistrados da Relação tiveram entendimento diferente e condenaram o arguido a cumprir pena de prisão efetiva.
O caso remonta a julho de 2019: “António” (45 anos) entrou num café, onde encontrou um amigo, com quem esteve à conversa, enquanto bebiam vinho. Sabendo que estava a acontecer um império de Espírito Santo perto de onde estavam, foram ambos até ao local, acabando por consumir sopas e vinho de cheiro. Decidiram levar algumas sopas para a dona do café onde estavam, tendo se posto a caminho, na carrinha de caixa aberta de “António”.
Foi na viagem de regresso ao snack-bar que tudo acontece: numa rua estreita, mas com boa visibilidade e piso limpo, a vítima estava no lancil da porta da sua casa, com a sua esposa, quando, à passagem da carrinha de caixa aberta, é derrubado pelo espelho retrovisor do lado do passageiro, que embate no seu peito, caindo violentamente com a cabeça no chão, perdendo imediatamente os sentidos.
Alertado pelo amigo, “António”para o carro alguns metros mais à frente, verificando o estado de saúde da vítima, e abandona o local posteriormente. Segundo o despacho, a dupla de arguidos voltou, mais tarde ao local do acidente, antes de regressar ao café, para entregar as sopas.
A vítima esteve 15 dias em coma, acabando por vir a falecer, devido às lesões sofridas na cabeça. Deixou dois filhos, já maiores de idade.
De acordo com os testes realizados, “António” tinha uma taxa de álcool no sangue de 1,44 g/l.
Aquando das diligências da polícia sobre o atropelamento, “António”pediu a um amigo que se identificasse como condutor da viatura na altura do acidente, tendo o amigo não só feito o sugerido, como assinou como condutor a declaração amigável que foi enviado para a seguradora.
Condenado em 1.ª instância a uma pena de prisão suspensa de qautro anos pelo crime de homicídio por negligência e de condução perigosa de veículo rodoviário agravado pelo resultado morte, além de condenado por um crime de falsificação de documentos e ao pagamento de uma indemnização aos filhos da vítima, no valor de 196 mil euros, “António” voltou a ser apanhado a conduzir alcoolizado em 2022, tendo sido condenado pelo crime de condução de veículo em estado alcoolizado na pena de 80 dias de multa e proibição de condução durante 9 meses.
O Ministério Público recorreu para a Relação de Lisboa, por considerar que a pena de prisão nunca poderia ser suspensa, mas sim efetiva. O tribunal superior concordou: apesar de baixar a pena para três anos, condenou o arguido ao cumprimento de prisão efetiva, assinalando que “o arguido não interiorizou a sua conduta, não manifesta arrependimento e voltou a conduzir com álcool no sangue. A ameaça de pena e a simples censura do facto não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.