“Provavelmente com nenhum dos líderes anteriores do PSD teria feito esta coligação”

Artur Lima. Presidente do CDS-PP/Açores e vice-presidente do Governo Regional diz acreditar no cumprimento do compromisso da coligação PSD/CDS-PP/PPM ir a votos em todas as ilhas nas próximas regionais e não poupa elogios à liderança de José Manuel Bolieiro, afirmando mesmo que só fez a coligação porque o líder do PSD era Bolieiro. Reconhece que a pobreza é um problema ‘gravíssimo’ nos Açores, mas que exige novas e ‘disruptivas’ soluções, realçando o apoio do Governo às crianças e idosos




Nas últimas eleições regionais, o CDS-PP elegeu três deputados, um resultado que em conjugação com os resultados do PSD e do PPM, permitiu formar a atual coligação de Governo, sustentada inicialmente no parlamento também pelo Chega e pela Iniciativa Liberal. Na altura, afirmou que esta coligação e os acordos parlamentares em nada feriam os valores do CDS-PP. Passados dois anos e meio, mantém esta convicção?

Esta coligação de governo foi feita entre três partidos - o PSD, o CDS e o PPM, enquanto que os acordos de incidência parlamentar foram feitos entre o PSD e a Iniciativa Liberal e entre o PSD e o Chega. Portanto, esses acordos parlamentares não foram feitos, nem pelo CDS, nem pelo PPM.

E porque é que o acordo não colide com os valores do CDS? Porque o CDS mantém a sua liberdade no parlamento e não tem nenhuma obrigação de aprovar nenhum diploma do Chega, que fira os valores do CDS. E é nessa perspetiva que eu mantenho a liberdade de votar contra aquilo que entendermos que fere os valores da democracia-cristã.

E como encarou a decisão da Iniciativa Liberal de romper o acordo com o PSD? Ficou surpreendido?


A mim não me surpreendeu nada... Aliás, eram ameaças que já vinham a ser feitas... 

Compreendeu as razões apresentadas então pelo deputado da IL/Açores, Nuno Barata?

Não me pareceu que Nuno Barata tivesse alguma razão substantiva para romper o acordo com o PSD, sobretudo naquele ‘timing’.

E esse rasgar do acordo mudou alguma coisa na governação? Acreditou que o governo pudesse cair?


A mim não me assusta que o governo possa cair... Sempre fui um corredor de fundo e em cada eleição sempre acharam que o CDS ia desaparecer, mas o CDS ainda cá está e no governo.

Os partidos que entenderem que o Governo está a governar mal têm a liberdade total de chumbarem o orçamento, de apresentarem uma Moção de Censura e de colocarem o governo abaixo...

A mim não me assustam eleições.

Acreditou na Moção de Censura?

Nunca acreditei, porque acho que o PS não tem coragem de o fazer, o Bloco de Esquerda muito menos e a Iniciativa Liberal não o pode fazer, por ser uma representação parlamentar. O Chega entretanto passou também a representação parlamentar e o PAN é uma representação parlamentar. 

Julgo que o Partido Socialista atravessa neste momento uma fase um bocadinho complicada e não interessava a Vasco Cordeiro, de maneira nenhuma, uma Moção de Censura.

Que ‘fase complicada’ está, na sua opinião, o PS/Açores a atravessar neste momento ?

O PS neste momento é como o rescaldo de um incêndio, com ressabiamentos e artigos de opinião, que não são sequer de opinião, são de insulto... Isto quando o criador da ‘geringonça’ foi um célebre socialista e o que se fez nos Açores foi procurar uma solução de governo, que eu julgo que agradou aos açorianos, com o ‘engenho’ de José Manuel Bolieiro, que liderou e lidera este governo de coligação, que tem sido um exemplo de democracia.

Repare: nós temos um governo que começou a governar numa pandemia com uma geometria parlamentar variadíssima e depois acontece uma guerra... No entanto, nós temos conseguido governar com paz e tranquilidade nos Açores, ao contrário do que acontece a nível nacional, onde com maioria absolutíssima, há uma instabilidade governativa e uma instabilidade política que levam o Presidente da República até a equacionar a dissolução do parlamento.

Concorda com a afirmação do líder do PPM e um dos parceiros da coligação de governo, Paulo Estêvão, de que os maiores inimigos do governo estão no interior do próprio PSD?

Gostaria, em primeiro lugar, de fazer um reconhecimento merecido e sem favor ao líder desta coligação e ao líder do governo, José Manuel Bolieiro. Fiz esta coligação porque foi com José Manuel Bolieiro, porque provavelmente com nenhum dos líderes anteriores do PSD a teria feito. Fiz esta coligação com José Manuel Bolieiro porque o conhecia do parlamento, conhecia-o como um homem de consensos e com quem hoje em dia tenho uma relação de amizade.

Hoje, posso dizer que tenho, para além de um parceiro político, também um amigo.

Contudo, também é nítido que havia no PSD e logo no início da coligação, pessoas que colocaram o PSD na oposição e acharam que nós não tínhamos direito à opinião política... Eu sou vice-presidente do Governo, mas sou simultaneamente presidente do CDS e tenho que ter uma apreciação sobre as políticas do governo, que partilho com o presidente do PSD, sendo a decisão final sempre do Presidente do Governo, com todo o respeito e lealdade que existe entre nós.

Do CDS, José Manuel Bolieiro contará sempre com a maior das lealdades. Os problemas internos do PSD, será o presidente do PSD que terá de os resolver, não serei eu.

A coligação de governo tem condições para manter o acordo e ir a votos nas regionais de 2024?

Não tenho nenhuma dúvida que o Presidente do Governo Regional e líder desta coligação, José Manuel Bolieiro, vai manter a sua palavra. Não tenho nenhuma dúvida quanto a isso. Da minha parte, honrarei o compromisso e manterei a minha palavra. Paulo Estêvão (do PPM) já o disse e vai honrar o seu compromisso e manter a sua palavra.

Nos corredores políticos, comenta-se a possibilidade da coligação ir a votos nalgumas ilhas e, noutras ilhas, os partidos irem a votos isoladamente. Este assunto tem sido discutido internamente?

As ‘narrativas’ na política sempre existiram e não faço ideia de onde vem esta... O que está acordado entre os partidos da coligação é irmos a votos em todas as ilhas.

Admite outro papel que não o de vice-presidente do governo, caso a coligação vença as eleições no próximo ano?

Quando fiz o acordo de governo, não exigi (a José Manuel Bolieiro) absolutamente nada. O CDSnão exigiu nada ao PSD e eu sou vice-presidente do governo porque José Manuel Bolieiro me propôs e fez questão que eu fosse vice-presidente do governo.

Numa próxima legislatura, estou disponível para continuar onde for preciso e onde for melhor para servir os açorianos.

Tendo em conta a política do ‘endividamento zero’ e a dificuldade em garantir a execução dos fundos comunitários, admite a necessidade de um orçamento retificativo ainda este ano?

A não ser que venha receita da República e que ela nos pague aquilo que nos deve, aí poderemos vir a ter a necessidade de fazer um orçamento retificativo para incorporar receita.

De resto, não haverá orçamento retificativo.

Anunciou que o Governo Regional irá apresentar uma anteproposta de lei para antecipar a idade da reforma dos açorianos, argumentando que a esperança média de vida na Região é inferior à do país. Que sucesso poderá ter esta proposta sendo esta uma matéria da competência da República?

Nós vamos fazer uma anteproposta de lei e a Lei de Bases da Segurança Social prevê regimes especiais de antecipação da reforma. A nossa esperança de vida à nascença é menor do que a de um continental e a nossa esperança de vida aos 65 anos - e esta é que é importante para esta questão - continua inferior, neste caso, em dois anos e seis meses.

O que é que isto quer dizer? Simplesmente que nós descontamos até aos 65 anos o mesmo que um cidadão residente no continente, mas como vamos viver em média menos tempo, alguém está a beneficiar com os nossos descontos. Isso é uma questão de justiça e presumo que a Assembleia da República será sensível a esse argumento.

Permita-me a imodéstia, mas esta seria uma revolução civilizacional para os Açores, para a fixação de pessoas, para a criação de emprego, para a criação de riqueza e de inteira justiça, porque não estamos a pedir nada que não seja nosso por direito.

Em 2017, na intervenção final do debate do Plano e Orçamento da Região, apontou o dedo à governação socialista, lembrando o problema da pobreza nos Açores. Hoje, não continuamos com o problema da pobreza?

Continuamos com o problema da pobreza, com toda a frontalidade e transparência... Sempre defendi que devíamos encarar a pobreza ou o abandono escolar precoce de uma maneira frontal, direta e sem esconder o problema... Pelo contrário, enfrentar o problema. Por isso mesmo, entendi mudar a narrativa dos últimos 20 anos sobre a pobreza nos Açores e acho que é tempo de haver uma solução disruptiva.

Este governo tem atuado na pobreza como nunca nenhum governo socialista atuou, evitando que as famílias caiam na pobreza... E até lhe dou o meu exemplo: o meu avô era um pescador pobre, com seis filhos. O meu pai fez a 4.ª classe e conseguiu vencer na vida, ao ser um comerciante com sucesso. E ele dizia-nos que a riqueza que nos podia dar era uma licenciatura... Era a herança que ele fazia questão de nos deixar.

Nós herdámos uma Região em que apenas 13% dos açorianos são licenciados, metade da média nacional. Nós herdámos uma Região, onde apenas 70% das pessoas concluiu o ensino secundário. Isto é dramático... Mas as pessoas só saem da pobreza pela sua formação e educação. Hoje, os estudantes mais pobres podem estudar e só em propinas e bolsas de estudo investimos um milhão de euros.

Mas o risco de pobreza permanece, com um em cada quatro açorianos nesta situação, já com dados relativos a 2021...

Sim, isso é gravíssimo. Mas quem são os mais pobres? São as crianças e os idosos e quando entrámos para o governo o ‘cheque pequenino’ (complemento regional à pensão dos idosos) era 54 euros... Hoje em dia são 97 euros. No apoio aos medicamentos, para quem beneficia do COMPAMID, são seis milhões de euros de apoio. E isso para quem tem pouco é uma grande ajuda e vai ter efeitos na redução da pobreza.
Na infância, estamos a apoiar nas creches e no primeiro ano de vida do bebé, através do programa ‘Nascer Mais’, que está a ter um sucesso extraordinário. Só na infância, são cinco milhões de euros de apoio. Pode não ser suficiente, mas são passos dados que vão mitigar em muito a pobreza.

Que balanço faz do programa ‘Novos Idosos’. Ele será alargado a outras ilhas?

Eu tenho ido a casa de pessoas que estão no programa ‘Novos Idosos’ e numa das visitas que fiz a uma idosa, ela antes estava acamada e praticamente não saía do quarto... Hoje, levanta-se, vem para a sala e quis dar-me o seu testemunho de como está muito satisfeita com as pessoas que vão à sua casa, que a põem a fazer receitas e exercícios... O balanço é muito positivo e a intenção é alargá-lo. Fiz a proposta no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) no sentido de alagar o programa ao triplo dos idosos, estendendo-o a todas as ilhas e se a União Europeia não defende a institucionalização dos idosos, é preciso que assuma também o custo de os ter nas suas casas.

Sobre a habitação, em que ponto estão os investimentos do Governo Regional com verbas do PRR?

Na habitação, estamos com uma taxa de execução do PRR dentro do expectável, apesar das situações que herdámos de loteamentos que não estavam feitos ou de terrenos que não estavam legalizados, quer na Terceira, quer em São Miguel. Vamos construir cerca de 300 novas habitações e reabilitar cerca de 600. Se tivéssemos mais dinheiro, mais construíamos e, por isso, pedimos um reforço de verbas.
















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