Autor: Lusa/AO Online
A análise, intitulada “Votos sem representatividade”, elaborada por Henrique Oliveira do Departamento de Matemática do Instituto Superior Técnico, da Universidade de Lisboa, contabilizou 1.146.034 votos sem representatividade no país, somando os restos de todos os círculos eleitorais analisados, excluindo votos brancos e nulos.
De acordo com este trabalho académico, o eleitor médio do interior de Portugal tem “apenas 65% de representatividade face a valores acima dos 85% nos grandes círculos”, sendo o círculo da Europa o que apresenta a taxa de representatividade mais baixa de todo o sistema eleitoral, 43%.
O estudo dividiu o total de “votos desperdiçados” em duas categorias: do tipo A, votos que não contribuíram para a eleição de qualquer deputado num determinado círculo; e os votos de tipo B, ou seja, a proporção de votos de partidos que conseguiram eleger pelo menos um deputado, mas que ficaram por converter em mandatos adicionais após a aplicação do método de D’Hondt.
Os “círculos recordistas” da percentagem de votos sem representatividade são os da Europa (56.7%), Portalegre (42.5%) e Fora da Europa (41.2%).
“Em geral, os círculos do interior têm percentagens mais elevadas de votos desperdiçados. A Madeira deixou de ter elevados restos face à votação de 2024 (39.1%) devido à força local Juntos Pelo Povo (JPP) ter elegido um deputado nesse círculo”, é detalhado.
Analisando os “votos desperdiçados” que não contribuíram para a eleição de qualquer deputado, do tipo A, os círculos com maior percentagem deste tipo mantêm-se Portalegre (40,6%), Fora da Europa (39,4%) e Europa (36,6%).
Em contraste, Lisboa, Porto e Setúbal, círculos com maior número de deputados eleitos, surgem como os distritos com menor desperdício: 2,6%, 6,4% e 7,2%, respetivamente.
Quanto aos votos desperdiçados do tipo B, que, embora tenham contribuído para a eleição de deputados, não chegaram a ser suficientes para garantir mais um mandato, os círculos com percentagens mais elevadas são Guarda (24,4%), Açores (23,0%), Castelo Branco (20,2%), Europa (20,0%) e Viana do Castelo (18,8%).
O estudo salienta que, nestes casos, mesmo quando os partidos têm representação parlamentar, “uma fatia significativa dos seus votos não se traduz em mandatos adicionais”.
“Este tipo de análise revela que o sistema eleitoral atual não apenas penaliza os partidos pequenos e os eleitores em círculos reduzidos através de votos totalmente desperdiçados, mas também impede que os votos em partidos com representação sejam aproveitados de forma plena”, lê-se no estudo, que aponta a necessidade de equacionar soluções como um círculo nacional de compensação, agregação de círculos ou “mecanismos adicionais de redistribuição de votos sobrantes”.
A análise adianta ainda que todas as forças políticas verificam “um elevado” número de votos desperdiçados. No caso do PS, o desperdício de votos explica o facto de ter agregado mais boletins mas ter ficado com menos deputados (58) do que o Chega (60), partido que “teve melhor coeficiente de vantagem na transformação dos votos em mandatos”.
O mais eficiente a converter votos em mandatos foi a AD - coligação PSD/CDS-PP, com restos de apenas 4,5% da sua votação e uma taxa de conversão de 95,5% dos votos, seguindo-se o Chega com 89,3%, e o PS que desce para 85,6%.
No outro extremo, o BE – que desceu de cinco para uma deputada - apenas conseguiu converter 18,6% de todos os seus votos em mandatos.
O
estudo conclui que “a proporcionalidade do sistema eleitoral português
não é uniforme em todo o território” e alerta que esta “desigualdade
intrínseca pode comprometer a legitimidade do sistema, sobretudo quando
se torna sistemática e que se tem repetido em eleições legislativas
sucessivas”.