Açoriano Oriental
Romeiros de São Pedro saíram este ano em romaria virtual

É através do espaço virtual e das redes sociais que o Rancho de Romeiros de São Pedro, de Ponta Delgada, está a viver este ano a romaria quaresmal, na impossibilidade de sair para a estrada.

Romeiros de São Pedro saíram este ano em romaria virtual

Autor: Rui Jorge Cabral

O objetivo desta romaria virtual é o de tentar envolver o máximo de pessoas possível, incluindo as famílias de romeiros, nas leituras e testemunhos do rancho, ao mesmo tempo que se recupera muita da história deste rancho já com 35 anos de existência e que é composto, em média, por mais de 50 elementos.

O lado mais visível desta romaria virtual é um conjunto de sete vídeos, tantos quantos seriam os dias de romaria na estrada, que estão a ser publicados diariamente na página dos Romeiros de São Pedro na sua página na rede social Facebook.

O primeiro vídeo foi publicado no passado dia 20 de fevereiro, dia em que oficialmente deveriam ter saído para a estrada os primeiros ranchos de romeiros e o último vídeo foi publicado na sexta-feira, 26 de fevereiro.

Os vídeos, que mostram imagens antigas do Rancho de São Pedro, bem como testemunhos de alguns romeiros, têm uma duração de cerca de 15 minutos, incluindo uma Leitura do Evangelho do dia, com a respetiva meditação.

Ontem, foi ainda publicado um documentário sobre a romaria, para além da Leitura do Evangelho do dia.

Em entrevista ao Açoriano Oriental, o mestre do Rancho de Romeiros de São Pedro desde o ano passado, Paulo Pacheco, afirma que, desde essa altura e com o evoluir da pandemia, “decidimos que em 2021 apenas iríamos fazer uma romaria virtual. Sabíamos o que queríamos, mas não sabíamos bem como o faríamos. Desde dezembro, eu e o Humberto Resendes, contramestre do rancho, fomos definindo o conceito, desenvolvendo ideias e limando arestas até que ficamos com um projeto final do que seria a nossa romaria”.

Paulo Pacheco explica também que “na nossa caminhada existem momentos que muito prezamos e que se prendem com a leitura do Evangelho, a meditação da Palavra e os testemunhos dos nossos irmãos. Estava lançada a base para o que queríamos fazer. Com o recolher dos testemunhos, fomo-nos deparando com partilhas de uma profundidade enorme e percebemos que podíamos ir mais além, poderíamos ‘pintar’ o quadro com imagens, algumas da década de 90 e cânticos que o contramestre reuniu e editou. Começamos a perceber que estávamos perante uma pequena pérola. Nesse sentido, a cada dia, da nossa romaria foi lançado um vídeo na página pública da rede social Facebook do Rancho de Romeiros de São Pedro”.

E o resultado desta iniciativa foi surpreendente, segundo revela Paulo Pacheco: “com o decorrer da semana, confirmou-se o que esperávamos... Essa romaria teve um impacto enorme e obtivemos milhares de visualizações diárias e várias dezenas de partilhas. O nosso objetivo estava conseguido, dar o nosso testemunho público de fé e chegar ao coração dos que nos seguiam”.

Os vídeos serviram também de homenagem a romeiros “que tiveram um papel muito importante no rancho e que já partiram”, explica Paulo Pacheco, para quem esta foi “uma oportunidade de caminharmos mais uma vez com estes romeiros que nos ensinaram tanto e que foram pilares do nosso rancho”.

O mestre do Rancho de Romeiros de São Pedro afirma ainda que “tentámos apelar às emoções e sabemos que muitas lágrimas foram derramadas, inclusive as nossas - minhas e do contramestre - aquando da elaboração dos vídeos, e apesar de os termos visto dezenas de vezes ainda ficamos emocionados”.

E, se em 2020, as romarias foram suspensas, com o ‘explodir’ da pandemia a meio da quaresma, neste ano de 2021 nem foram possíveis de se realizar, mas, como garante Paulo Pacheco, “os romeiros ficaram confinados mas não limitados”.

O mestre do Rancho de São Pedro lembra que “o desenrolar dos acontecimentos permitiu termos tempo para nos irmos preparando mentalmente para esta contingência o que ajudou, de alguma forma, a minimizar o efeito de não podermos caminhar fisicamente este ano”.

No entanto, será o papel do mestre, nesta situação especial de romaria virtual, ainda mais importante para manter a união do rancho do que na romaria normal na estrada? Paulo Pacheco responde que “manter um grupo unido é sempre uma tarefa dura e exigente em qualquer situação e no quadro atual ainda mais. No entanto, considero que esse objetivo foi conseguido e, para isso, contei, conto e contarei sempre com o contramestre do rancho, que é alguém com quem tenho grande cumplicidade e muitas vezes conseguimos comunicar apenas com um simples olhar. Para além disso, há que perceber que essa união parte de todos, cabe a cada um e os romeiros têm um papel fundamental. Um bom mestre não faz necessariamente um bom rancho, mas um bom rancho faz sem dúvidas um bom mestre”.

Paulo Pacheco afirma também que “podíamos fazer muita coisa e não ter retorno emocional nos romeiros”, mas, conclui, isso não aconteceu com a romaria virtual “e muitos fizeram esse caminho connosco este ano. Inclusive, os que não tinham acesso às plataformas digitais, recebiam o vídeo por outra forma e se nos atrasássemos um pouco, o telemóvel tocava e do outro lado alguém dizia: ‘irmão, ainda não recebi o vídeo de hoje’... Isso é união, é compromisso”.

Paulo Pacheco tem 40 anos, é natural de Ponta Delgada e é funcionário público. Já participou em 26 romarias, portanto, já foi romeiro em mais de metade da sua vida, sendo contramestre do Rancho de São Pedro desde 2015, tendo sido eleito mestre em novembro de 2020, já em contexto de pandemia.

Questionado sobre qual a situação mais marcante que viveu enquanto romeiro no Rancho de São Pedro, Paulo Pacheco responde que “em 26 anos de caminhada física, é quase impossível escolher um momento. A romaria, felizmente, é tão rica que não consigo escolher um”.

No entanto, Paulo Pacheco não esquece o dia em que, “ao sair de uma casa que acolheu 16 romeiros, para que estes não dormissem na igreja, saltei por cima dos donos da casa e dos seus filhos, que dormiram no chão da sala para que os romeiros tivessem uma cama”.

O exemplo desta família marcou muito o mestre do Rancho de São Pedro, que lembra também “outros bem mais simples, mas tão profundos, como um sorriso de um irmão numa altura que tudo parecia demasiado difícil”.

Por isso, conclui Paulo Pacheco, “cada romaria tem momentos únicos e inesquecíveis, porque aquela romaria não se vive mais, aqueles sentimentos não se têm mais, aquelas pessoas não serão mais as mesmas, mesmo que caminhem vários anos e aqueles momentos são únicos e irrepetíveis”.

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