Açoriano Oriental
Na região onde a abstenção foi rainha, o Chega cresceu

Os Açores voltaram a ser o círculo eleitoral do país onde mais pessoas não votaram (56,19%) e a ter a freguesia em que apenas um em quatro eleitores foi às urnas (Rabo de Peixe). Na vitória da AD (mais um deputado, mas menos votos) e no descalabro do PS (apenas um mandato e contínua perda de eleitores), o Chega cresceu, ganhou dois dos 19 concelhos e 25 das 156 freguesias. Rescaldo da noite eleitoral que lançou os dados para o próximo mandato legislativo

Na região onde a abstenção foi rainha, o Chega cresceu

Autor: Nuno Martins Neves

Mais um ato eleitoral, mais uma vez a abstenção a reinar nos Açores. Votar no círculo eleitoral que elege cinco deputados cativou menos de metade (43,81%) da população inscrita (230 289 pessoas). Uma realidade trágica e que contrasta com o verificado a nível nacional, em que a abstenção (35,62%) deverá ser a mais baixa dos últimos 30 anos [n.d.r. ainda faltam apurar os votos dos círculos eleitorais da Europa e Fora da Europa].

O desinteresse só não se verificou no Grupo Ocidental, onde Corvo e Flores foram as únicas ilhas com taxas de participação acima dos 50% (33% e 48%, respetivamente), tendo sido particularmente grave no Grupo Oriental: São Miguel, com 57%, e Santa Maria, com 59%, foram as ilhas onde menos pessoas foram votar.

Não surpreende, portanto, que as freguesias com menor taxa de votantes se encontrem nestas duas ilhas: Santo Espírito (concelho de Vila do Porto), com 70,49% de abstenção, e Rabo de Peixe (concelho daRibeira Grande), com 74,38%, foram as que devolveram mais boletins de voto por utilizar.

Rabo de Peixe, então, foi mesmo o local do país onde as Legislativas mais passaram ao lado dos moradores (apenas 1999 dos 7804 inscritos foram votar).

A juntar a isto, o facto de oito dos 10 concelhos onde a abstenção foi mais alta se situarem no arquipélago, com Ribeira Grande (62,34%) à cabeça, seguida de Vila Franca do Campo (61,38%), Vila do Porto (59,78%), Povoação (59,62%), Calheta (59,20%), Velas (57,31%), Vila Praia da Vitória (57,04%) e Lagoa (56,79%). Só Melgaço (Viana do Castelo) e Vimioso (Bragança) se intrometeram no top10, com 59,94% e 57,46%, respetivamente.

Portanto, das pouco mais de 100 mil  pessoas (100 883, para ser preciso), 36 mil escolheram a coligação PSD/CDS/PPM, a grande vencedora, ao conseguir eleger três deputados, mas a perder pouco mais de 5 mil votos. Ou seja, a coligação nos Açores acompanhou a AD a nível nacional, ao aumentar o número de mandatos, mas, em contraciclo com o que se registou a nível nacional, perdeu votos, em relação ao ato eleitoral anterior (2024).

O PS foi, nos Açores como no continente, o grande derrotado, perdendo o segundo deputado (apenas Francisco César representará os socialistas açorianos na Assembleia da República) e votos (quase oito mil). Ainda assim, aguentaram o segundo lugar, perante a rápida aproximação do Chega, que voltou a eleger e conquistou mais de 6 mil eleitores.

A trajetória de subida do partido liderado a nível regional por José Pacheco é ainda mais impressionante quando se abre o escopo de análise a 2019, ano da primeira vez que o Chega figurou nos boletins de voto: dos 709 votantes para os atuais 23 mil.

Em contrapartida, o PS perdeu 10 mil eleitores no espaço de seis anos. Apesar de, nas Legislativas de 2019 PSD, CDS e PPM terem se candidatado individualmente, os votos somados de então (29 mil) foram inferiores aos obtidos no domingo (36 mil).

E do dia 18 de maio, outra ilação que se retira é o número de freguesias que viraram para o Chega: depois de em 2024, o partido de José Pacheco ter conseguido vencer nas Feteiras e na Ajuda da Bretanha (Ponta Delgada), anteontem somaram 25 freguesias. E excetuando os Cedros (Santa Cruz das Flores), as restantes foram todas na ilha de São Miguel, principalmente nos concelhos de Ponta Delgada (12 das 24 freguesias), Lagoa (quatro das cinco), Ribeira Grande (seis das 15), Vila Franca do Campo (duas das seis) e Povoação (uma das seis).

Em sentido contrário, o PS só conseguiu ser o partido mais votado em 11 freguesias, apenas quatro em São Miguel.

Das restantes freguesias, a coligação venceu 119 - com total domínio na Graciosa, Faial, São Jorge e Santa Maria - havendo um dado curioso: empate técnico no Pico da Pedra, freguesia da Ribeira Grande, com o Partido Chega.

Passemos agora a uma análise mais fina pelos concelhos e freguesias da ilha de São Miguel.

PONTA DELGADA

No maior concelho dos Açores, a coligação ganhou, mas perdeu cerca de 1500 votos, os mesmos que o PS viu “voar”, no seu trambolhão para terceira força política. O Chega, esse, reforçou massivamente a sua base eleitoral, passando a segunda força mais votada, com 7509, um crescimento assinalável (38%), conquistando mais 2100 votos.

Em termos de freguesias, foram as citadinas que “salvaram” o PSD/CDS/PPM de perder a “jóia da coroa” para o ciclone Chega que varreu as freguesias rurais. Livramento, São Roque, Fajã de Baixo, São Pedro, São Sebastião, São José, Santa Clara, Relva, Mosteiros, Sete Cidades, Santo António e São Vicente Ferreira foram onde a coligação terminou em primeiro lugar na contagem final, as restantes 12 foram vencidas pelo partido de José Pacheco, incluindo a segunda mais populosa da ilha, Arrifes, feudo socialista onde o partido de Francisco César foi a terceira força mais votada, com apenas 20% dos votos.

LAGOA

Uma das grandes surpresas da noite: a Lagoa já não se tinha pintado de rosa em 2024 (vitória da AD), mas no domingo o autocarro da viragem continuou mais para a direita e só parou no Chega, por uma diferença de 47 votos! O PS, que em 2022 tinha tido mais de 2 mil votos, continuou com a sua derrocada, caindo para terceiro, com 1511 votos. Já o Chega tem uma ascensão meteórica: de 344 votos em 2022, chegou aos 1652, mais 380%!

Das cinco freguesias, o Chega venceu quatro (Cabouco, Santa Cruz, Água de Pau e Ribeira Chã), falhando apenas no Rosário (PSD/CDS/PPM)

VILA FRANCA DO CAMPO

Se a vitória na Lagoa surpreendeu e foi à justa, o que dizer do triunfo do Chega na antiga capital da ilha? Sete (7!) votos apenas fizeram tombar Vila Franca para o partido de José Pacheco, deixando o PS bem longe, no terceiro lugar.

Ainda assim, a coligação foi a que conquistou mais freguesias (três, nomeadamente São Pedro, São Miguel e Ribeira Seca), com o Chega a ficar com as extremidades (Água de Alto e Ponta Garça) e o PS a conseguir uma das poucas vitórias de domingo na Ribeira das Taínhas.

POVOAÇÃO

Por 102 votos, PSD/CDS/PPM voltaram a merecer a confiança da maioria dos votantes do concelho, à frente do Chega, que ultrapassou o PS como segunda força política graças a 24 boletins de voto.

No entanto, os socialistas conseguiram na Povoação a vitória em três freguesias (Ribeira Quente, Faial da Terra e Água Retorta), deixando para a coligação as freguesias de Nossa Senhora dos Remédios e Povoação, com Chega a conquistar a importante freguesia das Furnas.

NORDESTE

Vitória folgada da coligação, repetindo-se o “pódio” de há 1 ano, com PS a segurar o segundo lugar perante o crescimento do Chega. Em termos de freguesias, vitória em toda a linha do PSD/CDS/PPM, conquistando as nove mesas de voto: Salga, Achadinha, Achada, Santana, Algarvia, Santo António Nordestinho, São Pedro Nordestinho, Lomba da Fazenda.

RIBEIRA GRANDE

A Coligação venceu no importante concelho da Ribeira Grande, mas não sem um susto. PSD/CDS/PPM perderam 500 votos (o PS, por sua vez, viu desaparecer mais de 600), ao passo que o Chega conquistou mais de 1000, ficando no segundo lugar, a menos de 200 dos vencedores.

Quanto a freguesias, oito para PSD/CDS/PPM, seis para o Chega e um empate entre ambos no Pico da Pedra.

PUB
Regional Ver Mais
Cultura & Social Ver Mais
Açormédia, S.A. | Todos os direitos reservados

Este site utiliza cookies: ao navegar no site está a consentir a sua utilização.
Consulte os termos e condições de utilização e a política de privacidade do site do Açoriano Oriental.