Açoriano Oriental
Abuso sexual
Magistrados deveriam estar presentes quando as crianças são ouvidas
Médicos e psicólogos forenses são unânimes em afirmar que num caso de abuso sexual de uma criança a lei deveria permitir a presença de um magistrado no momento de recolha de informação.

Autor: Lusa / AO online
O objectivo é evitar outras abordagens em contextos menos apropriados para interagir com crianças.
Teresa Magalhães, médica forense do Instituto de Medicina Legal e Catarina Ribeiro, psicóloga forense e docente da Universidade Católica do Porto, fazem esta defesa num artigo científico sobre colheita de informação a vítimas de crimes sexuais publicado recentemente na acta médica.
As duas especialistas defendem que seria desejável que o magistrado titular do processo pudesse estar presente, directamente, em contacto com a vítima, ou observando-a através de um espelho unidireccional, com oportunidade para intervir na colheita de informação, pessoalmente ou através do psicólogo, consoante o caso concreto.
Por outro lado, defendem, o local da perícia é também determinante para o seu êxito.
O local deverá assim ser tranquilo, confortável e agradável, transmitindo bem-estar e sensação de privacidade à vítima.
Por outro lado, adiantam, é também importante que que haja material lúdico adequado à sua idade.
As duas especialistas referem ainda que para o êxito da perícia forense, que se inicia pela colheita de informação, importa ter em atenção alguns aspectos, sobretudo no que respeita às crianças.
A equipa, que deverá ser definida, à partida, sem que depois seja alterada deve ser idealmente constituída por um médico legista e um psicólogo forense experientes, "de modo a que entrevista e exame físico aconteçam de forma integrada, num ambiente de empatia que progressivamente se irá criando".
Em todo este processo, defendem, é fundamental que os peritos sejam capazes de compreender as dificuldades da vítima relativamente à sua percepção, interpretação e aceitação dos factos, às dificuldades de revelação e à sua forma de expressão, tendo sempre em conta a fase de desenvolvimento, o seu nível cultural ou o nível de stresse em que se possa encontrar.
Estes técnicos, adiantam, deverão estar disponíveis para trabalhar tranquilamente, respeitando o ritmo discursivo da pessoa, transmitindo-lhe confiança, ouvindo-a sem preconceitos e sem emitirem juízos de valor.
"Só desta forma ela poderá sentir que não está a ser julgada ou desacreditada, que vai ser ajudada e que o seu caso terá solução. Este tipo de estratégia evita a emergência da vitimação secundária e o agravamento do fenómeno de ocultação, tão típico nestes casos", referem.
A colheita de informação tem como objectivos caracterizar o acontecimento, descrever as características psicossociais da vítima e caracterizar o contexto familiar, no caso de abusos intra-familiares.
Nas crianças, a avaliação psicológica poderá ser necessária para compreender e valorizar o seu testemunho.
"Chamamos a atenção para o facto de as crianças beneficiarem, enquanto testemunhas, de um estatuto processual especial atenta a sua vulnerabilidade, sendo, na maioria dos casos, as únicas testemunhas de um crime público que ocorre numa esfera de extrema privacidade", referem.
A colheita da informação sobre o abuso pode ser feita através de várias técnicas: entrevista, observação, aplicação de instrumentos standardizados e/ou registo de condutas.
Nas perícias forenses, explicam, a técnica de colheita de informação mais usada é a entrevista, uma vez que permite recolher um conjunto alargado de dados, provenientes de várias fontes, permitindo ainda captar outros tipos de elementos para além da comunicação verbal (atitudes, comportamentos, postura, tonalidade emocional, elementos relacionais, manifestações exteriores de desconforto psicológico, entre outros).
Nestas situações, a entrevista poderá decorrer numa sala com espelho unidireccional, através do qual essa ou essas pessoas poderão assistir sem se notar a sua presença.
Com as crianças é importante que, numa fase inicial, lhes seja concedido um período durante o qual podem explorar livremente o espaço e os materiais existentes na sala e estabelecer uma relação de empatia e confiança com o entrevistador11.
Por outro lado, adiantam, importa prevenir a vitimação secundária, pelo que a intervenção da equipa multidisciplinar terá de evitar as sucessivas abordagens no que se refere à colheita de informação.
As duas especialistas defendem que apenas com uma intervenção articulada poderão ser atingidos os objectivos da intervenção forense: o contributo para a investigação criminal, para a interrupção da vitimização e para a reabilitação e protecção da vítima.
PUB
Regional Ver Mais
Cultura & Social Ver Mais
Açormédia, S.A. | Todos os direitos reservados

Este site utiliza cookies: ao navegar no site está a consentir a sua utilização.
Consulte os termos e condições de utilização e a política de privacidade do site do Açoriano Oriental.