Sónia Penela está há cerca de 26 anos a viver nos Açores. Professora de Matemática e atualmente presidente do Coral de São José, conta-nos, entre risos, que a sua história é um “bocadinho confusa quando me perguntam de onde sou. Acho que é a pergunta mais difícil de se responder, porque nasci no Canadá, mas os meus pais são do Norte, cresci no Algarve e estou há 26 anos, salvo erro, a viver em São Miguel”. Portanto, “é uma junção de várias partes”.
Ingressou no estudo musical com 8 anos, por “grande gosto do meu pai, que também toca. Fui para o conservatório em Faro, fiz até o 6.º grau. Tinha aulas de piano, de coro e de formação musical”, disse, para acrescentar que “a vertente musical não era assim tão comum, porque há muitos anos, no Algarve, não tínhamos a cultura musical que há nos Açores, nem as filarmónicas, que ajuda muita a juventude a aprender música. Não temos essa tradição lá. Não tínhamos o ensino gratuito”. Todas as pessoas que queriam aprender música “tinham que ir para os conservatórios que eram privados. Para se ter uma ideia, na minha escola, que não era assim tão pequena, éramos dois alunos a andar no conservatório”.
Sónia Penela fez até o 12.º ano no Algarve e a sua vinda para os Açores acontece “quando concorro para a universidade, uma das opções foi São Miguel, por obra do acaso”, Veio para cá estudar e foi ficando porque “gostei muito da ilha. Senti-me muito bem acolhida, gostei muito da gente de cá, da resiliência, da humildade e da cultura. (...) Da gastronomia também. As paisagens maravilhosas”, referiu para frisar que “inexplicavelmente sinto-me com raízes aqui sem as ter efetivamente”.
Tal como tantos outros estudantes que têm que sair das suas terras para estudar, Sónia Penela também sentiu falta de “tudo o que estava habituada, dos convívios com as gentes de lá, com a família, com os amigos, com os meus hábitos”. Foi, pois, um “cortar com tudo. Foi começar uma vida nova com 18 anos”. Mas por ter vindo para um meio como São Miguel, “acho que foi bastante facilitado o processo, porque quer na universidade, a nível de funcionários, de professores, quer dos próprios colegas, eram muito atenciosos com quem vinha de fora”. Rapidamente se integrou, “fui para as praxes, fui para a TAUA, a Tuna Académica da Universidade dos Açores”. Quando termina o curso, começa a trabalhar e deixa a Tuna. “Andei uns tempos sem grandes projetos musicais. Mas de repente surge o Coral de São José, que foi por acaso”. Diz-nos que nunca fez grandes planos para as coisas que foram acontecendo e o Coral de São José também foi assim: “Estava um dia a passear pelas ruas de Ponta Delgada e ouvi uma música muito bonita no interior de uma Igreja. Tive aquele impulso de abrir a porta e até fiquei bastante constrangida, porque era um casamento”, recorda com boa disposição. “Como já estava dentro da igreja, fiquei a ouvir mais um bocadinho e depois perguntei a uma pessoa se aquele coro era daquela igreja e a senhora disse que era o Coral de São José. Achei incrível... Parecia um coro mágico”. Foi para casa pesquisar e “mandei-lhes um email a perguntar se admitiam novos membros. O mestre respondeu, marcou uma audição, fui fazer e até hoje, cá estou”.
Questionada como é ser professora de Matemática, Sónia Penela revela-nos, primeiro, que “queria ter sido enfermeira e entro neste curso um bocadinho contrariada. Mas de repente começo a gostar muito. Quando começo a dar aulas, gostei muito. Gosto da relação com os miúdos”. Dá aulas do 5.º ao 6.º e explicações até o 9.º. Afirma que “podermos ser especiais para a vida daquelas crianças, acho que é muito importante. Vai muito além dos conhecimentos que vamos transmitir. Somos exemplos para eles”, sublinhando que “um bom professor pode marcar para sempre a vida de um aluno e um mau professor também. Acho que termos isso bem ciente é muito importante, porque a nossa profissão é muito nobre e deve ser muito respeitada. Não me via a fazer outra coisa”. O seu desafio em dar uma disciplina que, para muitos, mete ‘medo’, “é tentar desconstruir os conceitos”, explicando que “a música tem muita Matemática. Portanto, toda a contagem rítmica é Matemática e tento sempre chegar a eles”. Diz ainda que “não se consegue que todos consigam sucesso, mas penso que se olharmos para cada aluno individualmente, e não como uma turma no seu todo, conseguimos fazer um bom trabalho. Para isso as escolas têm que nos ajudar, não podemos ter turmas muito numerosas, temos que ter todo o apoio dos executivos, que felizmente, por onde tenho passado, tem corrido sempre muito bem”.
Sónia Penela foi eleita presidente do Coral de São José e frisa que “quero muito fazer parte da história do Coral”. Refere que “temos uma grande responsabilidade e uma obrigação para com o nosso público que nos acarinha imenso (...)”. Por outro lado, também “nos associamos a agentes culturais locais, nomeadamente as filarmónicas, aos artistas regionais. Acho que fazemos uma boa simbiose”. Também “é uma grande aprendizagem podermos trazer grandes solistas e maestros, porque vamos trabalhar e aprender com eles”.
Um dos eventos que associamos ao Coral e muito aguardado, é o Música no Colégio, que em 2026 será de 2 a 5 de julho. Trata-se de um “espetáculo de marca registada Coral de São José e são espetáculos muito inovadores. Conseguimos montar uma sala de espetáculos ao ar livre, com entradas gratuitas. Tenho a certeza que isto é bastante valorizado pelo nosso público”.
Como é que consegue conciliar a sua vida de professora com o coral? Sónia Penela diz ser “muito difícil. A minha agenda é quase ao minuto. É tudo muito bem articulado. Não há horas mortas no meu dia”, mas ressalva que “não ando contrariada. Como gosto daquilo que faço é tudo mais leve. Mas quando chega ao fim do dia, parece que aquele dia foi enorme”, confessa entre risos.
Questionada sobre um sonho que gostava de ver realizado, Sónia Penela, revela-nos que um dia “gostava poder tocar e cantar uma peça escrita pelo meu pai. Ele é um músico amador e acho que gostava de lhe poder proporcionar esse momento em vida”. Se já lhe lançou esse desafio, diz-nos que “ele sabe. Ele gosta de compor, gosta de me enviar o que faz, mas ainda não foi oportuno”.
A finalizar, deixa-nos alguns concertos já agendados, nomeadamente este domingo, no Auditório Ferreira da Silva, em Água de Pau, pelas 20h30. A 18 de dezembro, em Ponta Garça, na Igreja Nossa Senhora da Piedade, às 20h30. “Já temos confirmado um concerto no âmbito da Capital Portuguesa da Cultura. Vamos marcar o arranque da Quaresma, no dia 22 de fevereiro, na Igreja de São José, às 18h00, onde vamos apresentar o Requiem de Mozart e para isso vamos contar com a Orquestra Arquipélago Cromático e com solistas convidados. Vamos estar nas comemorações do 75.º aniversário do Teatro Micaelense, a 31 de março e 1 de abril”.
