Açoriano Oriental
Documentário de Vicente Jorge Silva inspirado nas "Ilhas Desconhecidas" lançado em DVD
A série documental “As Ilhas Desconhecidas”, escrita e realizada pelo jornalista Vicente Jorge Silva a partir da obra homónima de Raul Brandão sobre uma viagem aos Açores e à Madeira, foi lançada sexta-feira em formato DVD.

Autor: Lusa/AO On lIne

Trata-se de um documentário em quatro episódios, editado pela Midas Filmes, em que Vicente Jorge Silva percorreu as 11 ilhas dos Açores e da Madeira, inspirando-se na viagem realizada pelo escritor Raul Brandão (1867-1930), no Verão de 1924, e que deu origem a um clássico da literatura portuguesa de viagens.

Na sessão de apresentação da obra, realizada no auditório da Fnac Chiado, o autor frisou que a “não tem qualquer propósito sociológico, antropológico, ou o que quer que seja”.

“Não pretendo documentar de uma forma jornalística - como eu sou jornalista, talvez essa fosse a expectativa - a realidade das ilhas e também não me quero medir, de maneira nenhuma, com a obra do Brandão, porque não me sinto à altura”, sublinhou.

“[Este documentário] - esclareceu - é uma visão tão próxima quanto possível do espaço insular retratado por Brandão, é um perseguir a sombra de Brandão seguindo os seus passos”.

Convidado para apresentar o DVD de “As Ilhas Desconhecidas”, o poeta José Tolentino Mendonça, madeirense e interveniente no episódio dedicado à Ilha da Madeira, expressou a sua “admiração pela pessoa e pelo discurso, a obra, o talento de Vicente Jorge Silva” e também “pela obra em si, pelo que ela representa, pelo objecto que de modo tão inteligente, criativo, afectuoso neste documentário Vicente Jorge Silva toca”.

“O móbil deste documentário é a viagem de Raul Brandão que, para quem o conhece de outras aventuras, está aqui de corpo inteiro, mostrando, de uma forma absolutamente inesquecível, a sua capacidade de traduzir de forma impressiva o acontecimento humano, as cores da terra, as variações da luz, a presença dos elementos, e de nos soterrar literalmente debaixo de um manto de adjectivação que, entre o arrepio e o espanto, faz da sua prosa um dos momentos mais belos do nosso século XX”, disse Tolentino Mendonça.

Vicente Jorge Silva, por sua vez, parte de Lisboa num paquete de cruzeiro, dizendo que “detesta o turismo e adora a hospitalidade” e é ao encontro dela que vai - frisou - porque “‘As Ilhas Desconhecidas’, de facto, não são um guia turístico, são até um guia anti-turístico” e “a hospitalidade encerra sempre o encontro com o desconhecido”.

“‘As Ilhas Desconhecidas’ são-no porque distantes, porque remotas face a um determinado horizonte político e social, mas também, na prosa de Raul Brandão, porque é sempre o desconhecido que nos convoca para os grandes encontros”, salientou.

“E é interessante que nesta obra, que mistura o relato de viagem com uma espécie de naufrágio sem retorno que é a própria vida, a aventura humana, Raul Brandão também se descreve a ele próprio como uma ilha desconhecida”, o que faz da sua viagem “uma viagem interior - e é também essa a viagem de Vicente Jorge Silva”, defendeu Tolentino Mendonça.

Raul Brandão - prosseguiu - “oferece-lhe o móbil mas percebemos pelo envolvimento autoral e pela presença do Vicente Jorge Silva na própria matéria que ele filma que estamos perante um processo borgesiano ou tabucchiano, em que se vai à procura do outro e no outro que buscamos descobrimos que afinal estamos à procura de nós mesmos”.

Para o poeta, este é “talvez o elemento mais fulgurante deste regresso às ‘Ilhas Desconhecidas’”, em que “Vicente Jorge Silva faz uma homenagem, uma espécie de palimpsesto, um texto sobre outro texto, que lê ‘As Ilhas Desconhecidas’ na sua actualidade mas também se distancia delas, porque a melhor homenagem que podemos fazer a um livro de viagens é dizer que a viagem continua”.

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