Açoriano Oriental
Soltar o “Colchete” em tempos de pandemia

Cátia Carvalho, uma terceirense empreendedora, lançou a marca “Colchete” em plena pandemia. O objetivo é suprir uma lacuna no mercado açoriano de roupa interior que, garante, “é um equipamento de saúde”.


Autor: Tatiana Ourique / Açoriano Oriental

Cátia Carvalho é natural da ilha Terceira e tem 36 anos. Licenciada em Ciências da Comunicação e formada em Marketing de Moda, Assessoria de Imagem e Análise e Previsão de Tendências de Moda. Começou no Rádio Clube Português, colaborou com vários meios, escreveu sobre mulheres para o Delas.pt e para a Saber Viver online e fez parte dos departamentos de marketing e comunicação de várias marcas portuguesas líderes nos sectores da imagem, moda e lingerie.

Açoriano Oriental – Como é que surge a “Colchete”?

Cátia Carvalho- A Colchete era um desejo antigo. Sempre estive ligada ao universo feminino, no entanto nem sempre de acordo com a forma como as marcas comunicavam com as suas clientes. Honestamente, queria fazê-lo à minha maneira. A ideia começou a ganhar forma quando me vi, outra vez, no desemprego. Como não encontrava soutiens para o meu tamanho na Terceira e me via obrigada a encomendá-los online, pensei que provavelmente existiriam outras mulheres com o mesmo problema e eu podia realmente ajudá-las com o conhecimento e experiência que tenho. A Colchete tornou-se uma marca registada nacional em 2019 e entrou em funcionamento em 2020.

AO - É difícil encontrar roupa interior feminina nos Açores? Especialmente para quem não tem medidas "padronizadas"?

CC - Antes de começar a aconselhar as clientes, enquanto estava a preparar o lançamento da Colchete, eu pensava que sim, que as mulheres maiores e com peito grande seriam quem teria mais dificuldade em encontrar lingerie, mas não é bem assim. Também acho importante que se deixe de falar de medidas padrão porque elas, simplesmente, não existem. Faz bem mais sentido falar de saúde e a roupa interior é, definitivamente, um equipamento de saúde. Curiosamente, as primeiras clientes que procuraram a Colchete tinham peito pequeno. Muito pequeno até. E queixavam-se de não haver soluções para elas também. Portanto, eu diria que é difícil encontrar roupa interior feminina nos Açores. Ponto. É um segmento de mercado pequeno que não evoluiu e que não soube adaptar-se às necessidades emergentes das novas consumidoras.

AO - Como é que este projeto ganha vida num dos momentos mais difíceis para as empresas nos Açores e no mundo?

CC- O conceito da Colchete assim o permite. A Colchete não é uma loja aberta ao público, é um atelier. Como os ateliers de costura tradicionais, por exemplo. Cada cliente é atendida individualmente e para sê-lo terá de efetuar uma marcação antecipadamente. Os atendimentos também podem ser realizados em horário pós-laboral, aos fins de semana e feriados. Este aspeto assegura que a cliente não se cruza com outras clientes no mesmo espaço e que é atendida da forma como merece e como o aconselhamento profissional e especializado exige. As marcações são distribuídas ao longo da semana para que os produtos experimentados possam ser colocados em “quarentena” e desinfetados antes de voltarem a ser reintroduzidos no stock disponível. A Colchete é um conceito que faz mais sentido agora do que nunca porque as clientes estão efetivamente mais resguardadas.

AO - A Colchete é uma resposta a uma necessidade pessoal?

CC - Sim, a várias. Primeiro permite-me fazer aquilo que eu gosto e trabalhar na minha área de especialização, a Comunicação de Moda. Segundo, permite-me responder a necessidades muito específicas de consumidoras que não encontravam soluções adequadas às suas características, tal como acontecia comigo, no mercado local.

Se pensarmos um pouco no assunto, a roupa interior é um equipamento de saúde e o acesso a soutiens e cuecas, no tamanho certo e a preços razoáveis, deveria ser uma reivindicação das mulheres. Não faz sentido que o mercado continue a dizer-lhes que existe alguma coisa de errado com o corpo delas ou com o tamanho delas. Quem está errado é o mercado e é preciso começar a combater essa desinformação que foi passando de geração em geração.

AO - Que materiais e técnicas são utilizados no aconselhamento?

CC - O aconselhamento de lingerie assenta nos princípios importados do bra fitting internacional. No entanto, só por si isso não basta. Não serve de nada eu dizer a uma cliente “você é o tamanho X” porque essa referência dá uma informação muito específica que não pode ser generalizada. Primeiro, porque o nosso corpo está em constante mudança, daí ser necessário fazer um aconselhamento de verificação de 2 em 2 ou de 3 em 3 meses e segundo porque o tamanho X varia sempre em função da origem da marca que se experimenta, do modelo que se escolhe e das preferências pessoais de cada cliente. Ou seja, na verdade, uma cliente pode ter entre 3 a 4 variações de tamanhos diferentes e só consegue perceber qual é o indicado para si, naquele momento e para aquele modelo, com a ajuda de um profissional.

É importante esclarecer que a Colchete não confeciona, apenas comercializa. O processo de seleção dos produtos e das marcas com quem trabalhamos obedece a uma curadoria muito rigorosa sendo que todos os produtos são testados durante vários meses antes de chegarem às clientes. A mais valia do nosso serviço é o aconselhamento gratuito de que todas as clientes podem usufruir.

AO - Porquê "Colchete"?

CC - Os colchetes fazem parte da estrutura dos soutiens. São eles que unem o soutien à volta do tronco e que criam o suporte necessário. (ao contrário do que se pensa, não são as alças que sustentam o peito e sim a banda elástica do soutien). Escolhi esse nome porque queria, além de criar uma marca comprometida com o fortalecimento do empoderamento feminino, construir uma comunidade à volta do trabalho que desenvolvo e dos temas que considero fundamentais colocar na agenda do dia. A Colchete tem como missão encorajar as mulheres açorianas a viverem a sua feminilidade sem constrangimentos e todas nós podemos ser um veículo de informação, portanto ‘Colchete’ significa esse elo, essa união, essa rede à volta da marca que eu espero que o projeto consiga fomentar também.

AO - O mercado terceirense é promissor?

CC - Eu penso que sim. A resposta até agora tem sido positiva. Os consumidores estão cada vez mais exigentes, mais informados e mais conscientes das suas reais necessidades e os terceirenses não ficam de fora desse movimento. Se se conseguir adequar a oferta à procura e acrescentar valor, eu penso que os terceirenses se irão voltar para dentro e não para fora. Eles estão cá e tem dinheiro na mão, agora também é preciso que haja aquilo que eles procuram e que realmente precisam. Para além disso, a Colchete também tem uma componente de venda online, isto é, fazemos aconselhamentos virtuais e enviamos os nossos produtos para as ilhas e para o resto do país.

AO - Que sonhos tem para esta nova marca?

CC - Eu espero que a Colchete seja uma referência para as mulheres açorianas, no entanto, e é importante realçar isto, a Colchete não é uma marca de massas, é uma marca de proximidade com um conceito muito próprio. A prioridade é conseguir responder às diferentes necessidades das clientes ao longo das várias etapas das suas vidas.

Num futuro muito próximo espero que seja possível realizar alguns dos eventos que neste momento estão em standby por causa das restrições impostas pela pandemia e que não nos permitem conviver com o público da Colchete fora do atelier. Gostaria também de ver concretizado, já no próximo ano, lançamento da colecção bridal, uma coleção que engloba lingerie, loungewear, shapewear e acessórios e que foi pensada para as mães, madrinhas, damas de honor e noivas.


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