Açoriano Oriental
Da Podologia aos ralis, uma vida guiada pela paixão e pelo desafio

Raquel Rodrigues. Natural de Santa Maria, construiu um percurso que cruza a dedicação à Podologia com a adrenalina do automobilismo. Pioneira na Podologia nos Açores e campeã feminina de ralis, é também mãe, desportista e mulher determinada, moldada por uma infância de liberdade e fortes laços familiares

Da Podologia aos ralis, uma vida guiada pela  paixão e pelo desafio

Autor: Ana Carvalho Melo

Raquel Rodrigues nasceu há 44 anos em Vila do Porto, na ilha de Santa Maria. Filha de uma mariense com raízes micaelenses e de um terceirense que foi dar aulas à ilha e por lá ficou, Raquel Rodrigues cresceu num ambiente de grande liberdade, rodeada de primos, amigos e convívios constantes entre casas de familiares.

“Crescer em Santa Maria foi muito bom porque tínhamos muita liberdade e muita brincadeira na rua, o que hoje em dia já não acontece”, recorda, explicando que essa experiência lhe deu uma independência que considera fundamental na sua formação enquanto pessoa.

O ambiente de convívio constante e a forte ligação familiar continuam a influenciar a sua forma de estar, mesmo hoje em dia, mantendo-se alguém que valoriza profundamente a amizade, o encontro e a partilha.

“Os meus pais sempre gostaram de ter pessoas em casa e de socializar, e eu sou o espelho disso. Tento que a minha filha também tenha esta experiência”, realça.

Do período de infância e juventude, Raquel Rodrigues recorda que foi federada em basquetebol, representando o Clube ANA durante cerca de dez anos, e também no andebol, jogando pelos Marienses. Além disso, dedicou-se à arbitragem de basquetebol ainda adolescente, mostrando uma grande autonomia e espírito de aventura.

Ainda hoje, apesar de viver em São Miguel, Raquel Rodrigues reconhece que a forma de viver em Santa Maria é distinta - mais próxima, mais aberta, com uma vida social mais intensa e espontânea.

“Crescer ali deu-me uma liberdade e independência que considero fundamentais na minha formação enquanto pessoa. O ambiente de convívio constante e a forte ligação familiar continuam a influenciar a minha forma de estar, mesmo hoje em dia”, afirma, explicando que continua a valorizar profundamente a amizade, o encontro e a partilha.

Quando terminou o ensino secundário, ponderou entre a área da saúde, como fisioterapia ou terapia ocupacional, inspirada pelos problemas de saúde da mãe, e o gosto pelo contacto com o público e pela gestão – herdado do pai, que conciliava o ensino com a área empresarial. Foi por sugestão de um amigo da família que conheceu a Podologia, ciência da área da saúde que se dedica ao estudo, diagnóstico e tratamento das patologias do pé e membro inferior, em todas as fases da vida desde a infância à velhice. Curiosa e corajosa, lançou-se nessa aventura sem conhecer bem o curso, tendo ingressado na Escola Superior de Saúde do Vale do Ave, em Vila Nova de Famalicão.

“Com 15 anos já viajava sozinha como árbitra da Seleção Açores, portanto tinha o espírito de aventura para esta nova descoberta”, afirma.

Inicialmente, o curso foi um salto no escuro, mas depressa se apaixonou pela profissão, tendo sido incentivada por professores como Manuel Portela, presidente da Associação Portuguesa de Podologia, a continuar e acreditar numa carreira pioneira nos Açores - uma região onde a profissão ainda era praticamente desconhecida.

No final do curso, em 2004, Raquel Rodrigues optou por regressar aos Açores. Embora tenha ponderado iniciar a sua prática em Santa Maria, reconheceu que o contexto da ilha poderia dificultar a implementação de uma nova profissão. Acabou por se estabelecer em Ponta Delgada, onde o pai vivia durante a semana devido aos negócios que mantinha - nomeadamente as empresas “Mar Nosso” e “Rádio Popular”.

Hoje, com mais de duas décadas de experiência, Raquel Rodrigues continua a exercer com paixão a sua profissão de podologista, tendo o seu consultório na Rua Hugo Moreira, em Ponta Delgada.

Mas o percurso de Raquel Rodrigues não se destaca apenas no mundo da saúde. A sua paixão pela adrenalina levou-a a enveredar também pelo automobilismo, onde se consagrou campeã feminina de ralis.

“Os ralis foram um bichinho desde pequenina. O meu pai andou sempre envolvido em várias atividades desportivas e culturais da ilha – desde o futebol à Maré de Agosto – e também nos ralis, onde foi diretor de prova e comissário desportivo. E eu, desde miúda, andava com ele”, recorda.

Nessas experiências, ao lado do pai e de amigos como Joaquim do Carmo, nasceu o gosto pelos ralis. Ainda que o pai sempre lhe dissesse que só a ajudaria quando fosse ela própria a tomar a iniciativa - e assim foi.

Em 2006, recebeu o convite para ser navegadora de Diana Coelho. Apesar de não conhecer a piloto nem ter experiência a dar notas, aceitou o desafio. Tirou uma licença desportiva, arranjou um fato emprestado e foi para a estrada. Não ficou por aí: completou o campeonato com Diana Coelho e, em 2007, sagraram-se campeãs regionais femininas de ralis nos Açores. 

Em 2008, Raquel Rodrigues decidiu trocar o banco do lado pelo volante. Com o apoio de patrocinadores - entre eles a Rádio Popular e o restaurante O Silva da Ribeira Grande - alugou um Skoda Fabia e participou no Campeonato Regional de Ralis com Ana Silva como navegadora. Nenhuma das duas tinha experiência ao volante ou como copiloto, mas a vontade de competir falou mais alto. Disputaram todo o campeonato e, pela sua regularidade, voltaram a sagrar-se campeãs regionais femininas e vencedoras da Taça Diesel.

Em 2009, voltou a competir, desta vez com Diana Coelho como navegadora, mantendo os títulos. Ao longo dos anos, Raquel Rodrigues participou em vários ralis, incluindo com navegadores masculinos, e até experimentou carros a gasolina, como em 2013, quando competiu ao lado de Eugénia Cardoso. Apesar das dificuldades e da responsabilidade acrescida de correr com carros alugados, as experiências foram marcadas pela diversão, espírito de equipa e superação.

“Foi uma experiência que gostei imenso e à qual gostaria de voltar”, conta, lamentando que haja poucas mulheres a participar em ralis, apesar de muitas gostarem da modalidade.
O fim da sua participação nos ralis deveu-se, sobretudo, às exigências profissionais.

Em 2018, nasceu a sua filha Rosa, uma mudança que descreve como profunda e transformadora.

“A minha Rosa tem uma personalidade vincada, ainda que seja mais cautelosa do que eu era ”, revela, explicando que por isso tenta incutir-lhe valores de autonomia, persistência e espírito coletivo, incentivando-a, por exemplo, à prática de desportos de equipa, uma vez que acredita que é desde cedo que se aprendem as ferramentas essenciais para crescer e enfrentar a vida com coragem.

Também os pais, que continuam a viver em Santa Maria, se mantêm como o seu pilar.

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