Açoriano Oriental
Vitorino adverte para riscos de eleições nacionais paralisarem a Europa
O ex-comissário europeu António Vitorino advertiu que um eventual adiamento da aprovação do futuro Tratado europeu por causa da instabilidade política na Polónia constituiria um precedente para futuros bloqueios regulares do funcionamento da União Europeia (UE).

Autor: Lusa/AO

Num frente-a-frente com o ex-ministro social-democrata Dias Loureiro, que a Rádio Renascença (RR) difunde hoje, António Vitorino criticou a eventualidade de as legislativas antecipadas na Polónia conduzirem a um adiamento da cimeira informal de líderes dos 27 (Conselho Europeu), agendada para 18 e 19 de Outubro, em Lisboa, e que deverá aprovar o Tratado substituto da fracassada Constituição Europeia.

    "Seria abrir um precedente" na UE, pois significaria assumir que "o processo de decisão comunitário está dependente dos calendários eleitorais dos Estados membros", declarou o antigo ministro de Estado e da Defesa do primeiro Governo de António Guterres.

    A Polónia enfrenta actualmente uma crise política que levou à queda do Governo de coligação e à antecipação das eleições legislativas para 21 de Outubro, apenas dois dias depois do Conselho Europeu de Lisboa que será chamado a fechar um acordo político sobre o texto do designado Tratado Reformador da UE.

    O adiamento da aprovação do novo Tratado europeu, devido à antecipação das eleições na Polónia, não foi totalmente excluído pelo chefe da diplomacia portuguesa e presidente em exercício do Conselho de Ministros da UE, Luís Amado, no final da reunião informal de MNE dos 27, há duas semanas, em Viana do Castelo.

    No programa da Rádio Renascença, o antigo comissário europeu, que é consultor da actual presidência portuguesa da UE para as negociações do novo Tratado, no âmbito da conferência de Governos dos 27 (CIG), lembrou que, "em média, numa Europa a 27, há eleições legislativas ou outras em algum dos Estados-Membros de dois em dois anos".

    Neste contexto, o também ex-eurodeputado socialista avisou que adiar o Conselho Europeu informal de Lisboa por causa das eleições na Polónia, seria assumir que, "no futuro, no processo de decisão comunitário, teríamos sempre um período de bloqueio" que não se saberia quanto tempo duraria e em que "a União ficaria impedida de decidir".

    A esta questão de fundo, "que é preciso equacionar", António Vitorino acrescentou que, além da Polónia, também a Bélgica, que teve eleições a 10 de Junho último, está há quatro meses sem Governo. O processo de decisão comunitário "não pode estar dependente dessas contingências locais", preconizou.

    Já Dias Loureiro, outro dos participantes no programa de debate semanal na RR sobre o exercício da actual presidência portuguesa da UE, considerou que a convocação de eleições antecipadas na Polónia compromete o calendário fixado para aprovação do novo Tratado europeu.

    "Tudo se tornou mais difícil", pois "as questões europeias são assunto da campanha eleitoral, não sabemos que maiorias sairão do escrutínio de dia 21 de Outubro e, na melhor das hipóteses, teremos governo (polaco) formado em Novembro", precisou o antigo-ministro e ex-deputado do PSD.

    Quanto à reivindicação de Varsóvia de um reforço do chamado Protocolo de Ioannina que permite suspender uma decisão europeia mesmo que tenha sido aprovada por uma maioria suficiente de Estados membros, António Vitorino afirmou: "não está no mandato recebido pela presidência portuguesa, em Junho, a inclusão do Protocolo de Ioannina no texto do (novo) Tratado, como direito primário ou como direito constitucional".

    Vitorino, que, enquanto comissário europeu, foi o representante da Comissão de Bruxelas na Convenção que redigiu a falhada Constituição Europeia, acrescentou que "os polacos sabem disso e do que se trata agora é de tentar negociar uma solução que não pode ser uma cedência em toda a linha a Varsóvia".

    O compromisso que defende seria "manter o estatuto que o Protocolo de Ioannina tem actualmente, uma decisão do Conselho (da UE), sendo dadas à Polónia garantias de consolidação política dessa decisão".

    Sobre a ameaça do primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, de boicotar a Cimeira UE/Africa, se o presidente do Zimbabué, Robert Mugabe, se deslocar ao encontro, Dias Loureiro disse que a presidência portuguesa "não pode desistir, por dever de ofício, da reunião, porque é algo de que a Europa precisa".

    Lembrou que é cada vez mais forte a presença chinesa no Continente africano. "A China está a ter agora um papel em África que historicamente pertence à Europa", salientou o ex-dirigente social-democrata.

    Para António Vitorino, "as razões de Gordon Brown são de política interna", atendendo ao facto de "o Reino Unido ser a antiga potência colonial do Zimbabué e de todas as posições do Governo (de Londres) em relação àquele país (africano) terem uma grande repercussão na opinião pública" britânica.

    Quanto à invocação pelo primeiro-ministro britânico de que há um embargo aprovado por todos os Estados europeus à emissão de vistos aos membros do regime de Mugabe, Vitorino considerou que se trata "de um argumento de serviço, porque a decisão do Conselho (da UE) que decretou as sanções contra o Zimbabué diz que isso não prejudica os preparativos para a Cimeira UE/África".

    A segunda Cimeira de chefes de Estado e de Governo da UE e de África, que está agendada para 08 e 09 de Dezembro, em Lisboa, é uma das principais prioridades da actual presidência portuguesa do bloco europeu dos 27.

    A primeira Cimeira Europa/África realizou-se no Cairo, em 2000, durante a anterior e segunda presidência portuguesa da UE, por iniciativa desta.

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