Açoriano Oriental
Estudo
Violência sexual e delinquência dominam notícias sobre crianças
Os maus-tratos, a violência sexual, a delinquência e a educação dominam as notícias sobre crianças divulgadas pela comunicação social portuguesa, concluiu um estudo do Centro de Investigação Média e Jornalismo que será divulgado segunda-feira.
Violência sexual e delinquência dominam notícias sobre crianças

Autor: Lusa / AO online
    Os resultados da investigação "Crianças e Jovens em Notícia", conduzida por Cristina Ponte, serão apresentados no I seminário Infância, Cidadania e Jornalismo, na Fundação Calouste Gulbenkian.

    Este projecto vem na continuidade de um estudo sobre o tratamento jornalístico da criança (0-14 anos) no Diário de Notícias em intervalos de cinco anos (1970, 1975, 1980, 1985, 1990, 1995, 2000), entretanto publicado em livro.

    Ao longo do ano 2000, foi feita a comparação com outro jornal português, o Público, e com o espanhol El Pais, o britânico The Guardian e o francês Le Monde, durante uma semana.

    Os resultados revelam um aumento do número de peças ao longo dos anos no jornal estudado e que a Educação aparece como tema dominante, tendo sido observada também a ascensão recente de temas como a pedofilia/violência sexual, os consumos e delinquência.

    Em 2005, a equipa decidiu actualizar a informação alargando a investigação a mais jornais (Jornal de Notícias e Correio da Manhã) e a noticiários de televisão, além de incluir um novo objectivo: ouvir também como é que crianças e jovens se sentem tratados nas notícias que falam deles.

    Em declarações à Agência Lusa, Cristina Ponte, coordenadora do projecto, explicou que na globalidade a criança aparece nas notícias no papel de maltratada ou de maltratante, mas também enquanto consumidor e aluno.

    "A criança é o aluno, o delinquente, o maltratado, o maltratante ou o consumidor. O retrato da infância resume-se a isto", disse.

    O tema mais frequente na agenda noticiosa é o "risco social", com destaque para os subtemas "violência sexual" (em geral, a prisão ou julgamento de alegados abusadores sexuais) e a "delinquência" (por norma, assaltos ou outros actos violentos cometidos por jovens).

    Em todos os jornais, explicou, encontra-se grande quantidade de peças curtas, que relatam de forma breve os acontecimentos, sem contextualização do problema.

    Já no o subtema "negligência, abandonos e maus-tratos", o terceiro mais abordado dentro do tema "risco social", encontram-se peças mais longas e com mais fontes de informação.

    Na abordagem destas questões, explicou, os media mostram pouco cuidado na protecção da identidade das crianças, atitude que, na opinião de Cristina Ponte, deveria ser alvo de debate no meio jornalístico.

    Normalmente, adiantou, a identidade das crianças não é revelada quando se trata de uma violação, por exemplo, mas quando o assunto se refere a maus-tratos já existem muito mais derrapagens.

    O estudo permitiu ainda revelar que a Educação é a segunda temática mais abordada nas notícias sobre crianças, assumindo-se nos diários portugueses como aquela em que há uma maior abertura à informação e ao debate público, não apenas pela frequência de peças, mas também pela sua visibilidade, dimensão e enfoque.

    No entanto, uma análise mais detalhada das peças sobre este tema permite compreender que a abertura ao espaço público é ainda limitada, visto que as peças são dominadas pelo debate entre o governo e a oposição/sindicatos.

    Quanto a géneros jornalísticos, as notícias e as breves são largamente dominantes, por contraste com a escassez de reportagem e de investigação e com a quase ausência de entrevistas.

    As notícias, na maioria das vezes, vão pouco além do acontecimento.

    Outro dos aspectos observados pela equipa foi o facto de se registar uma redução das notícias internacionais sobre a situação mundial da criança, assim como a comparação entre Portugal e outros países em temas como a natalidade.

    Na verdade, adiantou Cristina Ponte, 80 por cento das notícias são nacionais.

    Em relação aos telejornais, foram visionados 72 noticiários dos canais RTP1, SIC e TVI nos mesmos dias, no primeiro semestre de 2005.

    Das 111 peças estudadas, com um total de mais de quatro horas de projecção, a TVI é a que dedica mais tempo às crianças, com a exibição de 38 itens noticiosos em aproximadamente duas horas.

    Nas televisões, especialmente nos canais privados, destacam-se as referências continuadas aos mesmos casos de maus-tratos, como os chamados casos Joana e Vanessa.

    No âmbito deste estudo, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, foram analisados mais de seis mil itens noticiosos de jornais e televisões portugueses do ano de 2005 sobre temas como educação, situações de risco social, saúde e comportamento, entre outros, envolvendo crianças e jovens menores de 18 anos.

    Desenvolvido pelo Centro de Investigação Média e Jornalismo (CIMJ) em parceria com o Instituto de Apoio à Criança (IAC), um dos objectivos do projecto é disponibilizar aos jornalistas e ao público em geral um olhar distanciado sobre o que se vai sedimentando como notícia.

    A apresentação dos dados no "I Seminário Infância, Cidadania e Jornalismo - Quando crianças e jovens são notícia" visa, segundo Cristina Ponte, provocar o debate entre jornalistas e fontes de informação, para promover um tratamento noticioso mais aprofundado das problemáticas infanto-juvenis, respeitando a Convenção sobre os Direitos da Criança, de que Portugal foi um dos primeiros países subscritores.
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