Autor: Carolina Moreira
“Uníssono - Composição para cinco bailarinos” será apresentado no próximo sábado, dia 28 de setembro, no Teatro Micaelense, no âmbito do Paralelo - Festival de Dança. Em que consiste este espetáculo de dança contemporânea?
Trata-se, como o nome indica, de
um espetáculo dançado em uníssono por cinco bailarinos, ou seja, é como
se fosse um solo, mas estão os cinco a dançar exatamente a mesma coisa,
sendo que a nível de composição tanto podemos ver um como ver dois ou
quatro, vai existindo diferentes configurações. É um espetáculo que
não pretende, de todo, ter uma narrativa, mas sim fragmentos soltos de
diversas possibilidades de narrativa. Claro que, olhando para o objeto,
levantamos outro tipo de questões, temos cinco indivíduos a dançar
exatamente a mesma coisa, numa primeira fase aparecem com identidades
muito distintas e que, ao longo da peça, se vão transformando na mesma
identidade. Acima de tudo, interessa questionar a ideia de identidade
e a ideia de força ou poder que um grupo tem ou não, ou se nós nos
salientamos no meio da multidão ou se somos absorvidos por ela. Conceptualmente,
o espetáculo é muito simples, porque parte desta ideia de um uníssono e
de uma composição para cinco bailarinos e é uma peça extremamente
física, porque eles estão a dançar intensivamente durante cerca de uma
hora. Levanta estas questões da própria identidade do coletivo ou do
indivíduo, até que ponto é que nós perdemos a nossa identidade estando
absorvidos no meio de um coletivo. Isto também nos remonta para a
sociedade e para percebermos de que forma nos organizamos e, até que
ponto, as nossas decisões vão tendo significados distintos de acordo com
a forma como nos vamos agrupando em sociedade.
Qual é a mensagem que quer transmitir ao público?
A
mim interessa mais questionar do que transmitir uma mensagem. Acho que é
um momento de reflexão sobre o que somos, quem somos e como nos
relacionamos com os outros. E ainda como é que perdemos ou evidenciamos a
nossa identidade, porque cada vez mais temos a ideia de querer repetir o
outro, de o copiar, e cada vez mais se perde esta ideia de
individualidade. Isso para mim é muito interessante, porque mesmo nos
cânones da dança, as aulas formatam os bailarinos para serem todos
iguais e eu faço uma peça que, à partida, falha porque eu escolho cinco
pessoas completamente distintas umas das outras para tentar pô-las a
fazer exatamente a mesma coisa. Claro que elas nunca vão conseguir, mas
são essas diferenças que me interessam, porque é aí que se encontram as
individualidades.
Em Ponta Delgada, o espetáculo terá a participação de bailarinos açorianos?
O
espetáculo estreou em 2016, é uma coprodução do Teatro Municipal do
Porto com o Teatro São Luíz em Lisboa, já esteve a circular pelo país e
agora será apresentado em Ponta Delgada. Os bailarinos são da
formação inicial, menos o André Cabral que será substituído pelo Dinis
Santos, até porque se trata de uma peça difícil de executar,
tecnicamente é muito exigente e seria quase impensável fazer com outras
pessoas.
O que vai acontecer é que estarei a dar uma ‘masterclass’ a
bailarinos de São Miguel na própria manhã do espetáculo, em que vou
estar a utilizar os pontos de partida usados no processo de composição
da própria peça e aí, se as pessoas quiserem conhecer melhor o meu
processo criativo, poderão ter essa possibilidade na ‘masterclass’.
E a música?
A
música foi composta de propósito para este espetáculo e é do Hélder
Gonçalves, compositor dos Clã. É muito rock, com muita guitarra elétrica
e muito vibrante.
Como surgiu esta colaboração com o Paralelo?
Curiosamente,
soube que quem organiza este festival também faz parte do Núcleo 37.25
com quem já trabalhei, em 2013. Confesso que me senti muito honrado até
porque, junto com a Marta Silva Ferreira, fui o primeiro coreógrafo a
criar para o núcleo. Agora poder voltar e colaborar num festival
organizado por eles, faz-me sentir muito honrado.
Qual é a sua opinião sobre a existência deste festival de dança?
O
Paralelo é mais um passo na afirmação da dança contemporânea nos
Açores. É uma iniciativa extremamente importante para a formação do
público e acho que a dança deveria estar na programação do Teatro
durante o ano inteiro. O festival Paralelo passa a ser um marco da dança
nos Açores, que depois é falado internacionalmente, porque também tem a
ambição de trazer companhias internacionais ao arquipélago. De certa
forma, trata-se de posicionar o festival também num contexto europeu e
mundial.