Açoriano Oriental
Terceira Tech Island: um coração tecnológico a bater no meio do Atlântico

Com a retirada de grande parte do contingente norte americano da Base das Lajes, urgia criar uma alternativa de dinamização do concelho da Praia da Vitória. É neste contexto socioeconómico que surge o Terceira Tech Island, corria o ano de 2017.


Terceira Tech Island: um coração tecnológico a bater no meio do Atlântico

Autor: Tatiana Ourique / Açoriano Oriental

O projeto Terceira Tech Island funciona numa dicotomia Governo Regional dos Açores/ Câmara Municipal da Praia da Vitória e surge em resposta às necessidades urgentes de dinamização do concelho. ”Este é um projeto para criar um “hub” Tecnológico focado na criação de condições para a fixação de empresas que se dediquem ao desenvolvimento de software e à criação de emprego qualificado, com o objetivo de atenuar os efeitos sociais e económicos do downsizing da Base das Lajes, em sintonia com o Plano de Revitalização Económica da Ilha Terceira (PREIT)”, referiu Sérgio Ávila, Vice- Presidente do Governo Regional dos Açores em entrevista ao Açoriano Oriental.

O projeto arrancou em outubro de 2017, durante a Web Summit – a conhecida conferência internacional de tecnologias -, com o intuito de colocar os Açores no radar dos investidores do setor. “Na prática, a nossa aposta no Terceira Tech Island foi aliar a natureza à capacidade de produzir software dos Açores para o mundo. A partir da Ilha Terceira trabalha-se para o mundo, tendo-se instalado 22 empresas que produzem e exportam software e gerado, mais de 170 postos de trabalho qualificados e contribuindo para a estabilidade profissional e a empregabilidade de muitos açorianos” adiantou Sérgio Ávila.

A Base das Lajes chegou a ter um contingente de dois mil militares norte-americanos e respetivas famílias e a empregar nas suas instalações dois mil civis, portugueses. O governante afirma que “pelos resultados já obtidos em apenas 2 anos de implementação deste projeto, quer em termos de empresas instaladas, emprego já criado e impacto na economia local, penso que a médio-prazo conseguiremos concretizar este objetivo na totalidade”.

No último trimestre de 2017 chegavam os primeiros formandos à Academia de Código para a formação intensiva em JAVA/JAVA SCRIPT totalmente subsidiada. 3 anos depois, o centro está a atingir a meta de 200 jovens formados. Surgiu, entretanto, uma segunda entidade formadora que se juntou à já instalada Academia de Código: a IT Up, focada exclusivamente na formação em tecnologia OutSystems.

O Terceira Tech Island conta, atualmente, com empresas instaladas nas áreas de tecnologia aplicada aos mercados financeiros, banca e seguros, tecnologia aplicada à área da saúde e digitalização de processos.

Para Sérgio Ávila o fator crucial do projeto é “a capacidade de qualificação de recursos humanos e disponibilização de programadores formados nos Açores, dotando-os de competências específicas em tecnologia, fator decisivo para atrair empresas tecnológicas, tendo em conta que faltam em Portugal mais de 40.000 programadores e na europa mais de 500.000, sendo que as empresas instalam-se onde existem programadores qualificados, é esse o fator essencial para atrair empresas que cada fez mais precisam de programadores face à Digitalização da Economia”.

As estruturas físicas, onde se localizam as empresas, estão sediadas no centro urbano da Praia da Vitória, fator esse que para o vice presidente do GRA proporciona um efeito multiplicador na economia local: “além da criação de emprego, o Terceira Tech Island também tem tido um impacto direto na revitalização do centro urbano da Praia da Vitória, que estava em progressiva desertificação após a redução de atividade na Base das Lajes e constituiu também um forte contributo para a revitalização do centro urbano da Praia da Vitória, através da instalação de empresas e dos seus colaboradores”.

O responsável pelo TTI acredita que a comunidade local também sentiu a importância estrutural do projeto e o seu impacto económico, em plena era digital: “Cada vez mais os açorianos vão tendo essa noção clara que desenvolver software não é ‘brincar aos computadores’, mas sim uma carreira profissional com enorme futuro e possibilidade de crescimento. Desde 2018, o valor das remunerações dos novos empregos gerados pelo TTI deverá atingir 3,5 a 4 milhões de euros, só em vencimentos diretos dos empregos gerados. O TTI já tem um impacto direto significativo no PIB (Produto Interno Bruto) da Região, além da contabilização da faturação das empresas instaladas e do efeito multiplicador da sua atividade”, refere.

Para além de responderem às necessidades das empresas incubadas no TTI, os novos programadores também têm sido recrutados por empresas instaladas no Parque de Ciência e Tecnologia da Ilha Terceira (Terinov) e por diversas empresas tecnológicas da região, em diversas ilhas.

A formação é intensiva e com uma carga horária distribuída de forma menos convencional: “Os formadores são programadores altamente qualificados, alguns deles com carreiras em empresas tecnológicas de referência, e isso é relevante. Não há “disciplinas”, mas sim um programa estruturado em princípios básicos de lógica, hardware e introdução a linguagens de programação universais. O domínio do inglês é fundamental para quem quer fazer a formação. Trata-se de formações intensas, designadas por Bootcamps, e no fundo os formandos aprendem a aprender”, diz Sérgio Ávila que acrescenta que o processo de recrutamento é exigente uma vez que se foca nas pré-competências dos concorrentes para aprenderem a programar. O governante adianta que até hoje, cerca de 1500 pessoas já se inscreveram na formação.

As inscrições justificam-se, também, pelo apoio fornecido aos formandos deslocados. O GRA assegura a instalação no Centro de Formação do Belo Jardim, que se localiza perto dos locais de formação, aos alunos selecionados das outras ilhas, garantindo todas as condições, sem custos, aos alunos de todas as ilhas para que possam frequentar a formação do Terceira Tech Island.

Sérgio Ávila adianta ainda que os alunos chegam das nove ilhas dos Açores e “muitos jovens açorianos que viviam no continente e, inclusive, do estrangeiro, têm regressado para viver nos Açores, através do Terceira Tech Island. Uns têm já experiência profissional, outros possuem licenciatura ou doutoramento nas mais diversas áreas de formação, o 12.º ano de escolaridade ou formação profissional. Muitos estavam empregados noutras áreas e deixaram o emprego para virem para esta carreira aliciante, outros fizeram-no após a conclusão dos seus estudos e outros estavam desempregados. A principal mensagem é que a carreira de programador está aberta a todos, independentemente do seu nível de formação académica ou da sua área de formação. Estão a trabalhar, lado a lado, programadores que são doutorados em diversas áreas com outros programadores que trabalhavam na construção civil, em bombas de gasolina ou que eram empregados de mesa. O fundamental é ter talento, muita vontade de aprender e uma grande capacidade de trabalho”.

O Governo Regional dos Açores quer atingir, a curto prazo, a criação de 420 postos de trabalho diretos, uma vez que foram estes os que se perderam com o downsizing da Base das Lajes, uma meta que Sérgio Ávila acredita que poderá ser atingida em pouco tempo: “A razão é simples: a maioria das empresas tecnológicas está ligada a áreas de grande desenvolvimento, designadamente da saúde, banca e seguros, mas também há desenvolvimento de projetos específicos para áreas da agricultura, do Mar, machine learning, Big Data, IoT, e Inteligência artificial”, confia.




Da Arménia aos Açores e da gestão empresarial à programação
Meri Hayrapetvan nasceu na Arménia e numa viagem de Erasmus à Roménia conheceu o açoriano que viria a ser seu marido. Meri chega aos Açores em setembro de 2018 e durante 8 meses não conseguiu encontrar trabalho. Em março de 2019 integra a primeira turma de formação da IT Up e na reta final da formação já tinha sido recrutada por uma empresa que aguardava a nova “fornada” de alunos. “O curso terminava no final de junho e na última semana convidaram-me para trabalhar numa empresa que ia abrir sucursal na Praia da Vitória. A 8 de julho comecei a trabalhar”. Como Meri, outros 3 colegas de turma integraram os quadros da empresa OSQuay.

“Foram 3 meses muito intensivos. Ainda para mais não era a minha área. Já tinha trabalhado na Arménia e em Bragança em gestão de empresas”. Quanto à vida nos Açores, a jovem arménia admite que a realidade é bastante diferente da do país de origem. Adora o facto de ver o mar todos os dias e de ter muito tempo para estar com os amigos, mas sente falta das grandes superfícies comerciais dos centros urbanos.

Questionada sobre o regresso à profissão antiga, Meri garante que é na programação que se realiza e sente que, por ser uma área em constante evolução, é uma profissão muito aliciante.
 
Adeus, arquitetura, olá programação.
Luís Mesquita tem 33 anos e a meio do Mestrado em Arquitetura na Universidade do Porto, fez uma pausa e veio viver para os Açores. Foi também o amor que o trouxe a São Miguel e ao “trabalho para pagar contas”, mas que nunca o satisfez. “Trabalhei em restauração, mas não gostava do que fazia e por isso decidi arriscar neste curso na ilha Terceira”. O jovem portuense garante que a oportunidade surgiu “na altura certa por estar numa fase de decisão do que fazer com a minha vida. Já tinha um desejo adormecido de estudar e aprender programação”.

Frequentou a Academia de Código entre janeiro e maio e a arquitetura deixou de imediato de ser uma meta.

Luís enumerou ao Açoriano Oriental os motivos que o levam a fazer um balanço muito positivo da experiência formativa: “É muito bom, não só pela qualidade da formação em si mas também pelas relações – quase familiares – que se fazem entre formadores e formandos, pelo próprio ambiente dentro do curso que é muito bom e, acima de tudo, pelas portas que se abrem”.

Luís Mesquita conta ainda que, durante a formação, as empresas incubadas no Terceira Tech Island começam a acompanhar os jovens com o objetivo de recrutá-los no imediato momento da conclusão. “A própria Academia de Código potencia essa articulação e organiza momentos para que as empresas se apresentem aos candidatos a programadores. “Eu terminei o curso em maio e na semana seguinte comecei a receber contactos para entrevistas. Fiz umas cinco ou seis e tive uma proposta 3 semanas depois de concluir a formação e em menos de um mês estava a trabalhar”. Quanto aos colegas de curso, o programador garante que praticamente todos conseguiram trabalho e os que não estão a programar decidiram voltar aos trabalhos que tinham anteriormente. Mas essa não é uma opção para Luís.
A programação roubou o lugar à arquitetura e os Açores serão agora a casa do portuense nos próximos anos.

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