Autor: Ana Carvalho Melo
Susana Goulart Costa, que nasceu em Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, possui raízes familiares que se estendem pelas ilhas do Pico e do Faial. Contudo, com apenas seis meses de idade, mudou-se com a família para Lisboa, onde cresceu e viveu toda a sua infância e juventude. Apesar de o quotidiano lisboeta ter moldado grande parte da sua formação, os verões passados nos Açores, entre a Terceira e o Pico, reforçaram o vínculo afetivo e cultural ao arquipélago. Esta convivência sazonal marcou profundamente a sua perceção das ilhas como um espaço de liberdade e aventura, influenciando o seu olhar sobre a vida.
“Gostei muito de crescer em Lisboa por todas as oportunidades, mas adorávamos vir aos Açores de verão porque era uma liberdade completamente diferente e uma aventura”, recorda.
O interesse de Susana Goulart Costa pela História começou cedo, motivado pela influência de uma professora natural de São Miguel que lhe incutiu o gosto pela pesquisa e pelo questionamento. “A forma como ela lecionou a disciplina de História, quando tinha 11-12 anos, fez-me apaixonar pela disciplina e foi uma escolha claramente afetiva, que fiz relativamente cedo”, conta.
Assim, licenciou-se em História pela Universidade de Lisboa, na Faculdade de Letras, entre 1987 e 1991. Durante esse período, enfrentou desafios pessoais, como a doença e o falecimento precoce do pai, que moldaram a sua resiliência e a decisão de construir uma carreira.
Em outubro de 1991, aos 21 anos, Susana Goulart Costa ingressou como assistente estagiária na Universidade dos Açores, numa transição que não foi apenas profissional, mas também cultural e pessoal. Os primeiros anos foram desafiantes: adaptar-se a um meio insular diferente do de Lisboa, construir um percurso académico num território ainda pouco explorado em termos de história regional e lidar com as incertezas de uma nova etapa da vida. No entanto, o incentivo de figuras como Artur Teodoro de Matos e Avelino de Freitas de Meneses conduziu-a a aprofundar estudos na história açoriana, um campo que inicialmente lhe era desconhecido, mas que se tornou a base da sua carreira.
“Foi um percurso desafiante. A minha primeira tese foi sobre a ilha do Pico e marcou a minha incursão na história da Região. Eu costumo brincar, dizendo que trabalho em Arquipologia, designação que inventei, mas que considero como a ciência dos arquipélagos, sendo o dos Açores o núcleo central do meu estudo”, revela.
Como recorda foi nesta fase que começou a ficar surda: tem otosclerose bilateral diagnosticada desde os 20 anos. Atualmente, as capacidades auditivas são biologicamente nulas e apenas os implantes auditivos lhe permitem viver no mundo dos ouvintes.
Com uma trajetória académica e profissional marcada por uma abordagem abrangente à História dos Açores, desde o povoamento no século XV até aos desafios contemporâneos, Susana Goulart Costa tem-se dedicado a explorar temáticas como a história religiosa e o património cultural. E neste sentido, a sua permanência na Universidade dos Açores, que já ultrapassa três décadas, reflete o seu compromisso com a valorização e divulgação do património histórico-cultural do arquipélago.
Além do trabalho académico, Susana Goulart Costa desempenhou papéis de relevo na sociedade açoriana, incluindo a participação em iniciativas políticas, como diretora regional da Cultura e deputada na Assembleia Legislativa Regional dos Açores, funções que afirma ter desempenhado com espírito de aprendizagem e missão cívica.
“A área da cultura tem um grande impacto, pois é necessário trabalhar com públicos muito diferentes, o que exige a capacidade de perceber o seu posicionamento e o seu contributo para o desenvolvimento da Região Autónoma dos Açores. É algo que tem de ser muito equilibrado, entre uma cultura que exprima a identidade local e que esteja em diálogo com o exterior”, defende.
Atualmente, está envolvida no projeto DIO 500, uma investigação de longo prazo que visa criar uma história religiosa dos Açores, em preparação para o 500.º aniversário da Diocese de Angra, em 2034. Este projeto inclui um inventário exaustivo do património religioso das ilhas, abrangendo igrejas, ermidas, altares e outros bens móveis, ligados às práticas de fé e à identidade cultural açoriana. O projeto é coordenado por uma equipa científica multidisciplinar, com contributos de universidades nacionais e internacionais, e conta com o apoio de especialistas para assegurar a qualidade da investigação.
Paralelamente a esta atividades, Susana Goulart revela que, nos últimos 10 a 15 anos, tomou consciência de que, dentro da academia, há uma responsabilidade para além da investigação: sensibilizar e envolver o público não especializado.
“Adoro história e sinto a obrigação de a divulgar, principalmente história dos Açores. Escrevo artigos de divulgação com o objetivo de partilhar esse conhecimento com audiências diversas, porque acredito que é também uma das missões da Universidade dos Açores: levar o saber ao maior número de pessoas possível”, afirma.
Embora o trabalho académico ocupe grande parte do seu tempo, Susana Goulart Costa conta que procura sempre o equilíbrio entre trabalho, família e lazer. “Sempre gostei de desporto. Fiz dança clássica durante mais de 20 anos e, hoje, tento ir ao ginásio duas a três vezes por semana. Passo muito tempo sentada, e essa atividade faz-me bem”, revela.
Sobre os passatempos que ficaram pelo caminho, fala com saudade do canto coral. “Cantei no coro da Faculdade de Letras de Lisboa e também no coro da Igreja de Santo António de Moscavide. Hoje, sou soprano sem palco”, brinca, realçando que a prioridade é a família: “Os ensaios são à noite, e esse tempo reservo para estar com o meu marido e os meus filhos. A vida académica exige muitas deslocações e conferências, por isso, o tempo em casa é precioso”.
Mesmo sem tempo para o canto, encontra na família e no desporto a sua forma de equilíbrio. “São a minha fuga e a minha maneira de recarregar energias para tudo o que faço”.