Açoriano Oriental
Cheque-dentista só foi usado por 3,5% dos idosos beneficiários

Apenas 6.081 dos 175.306 idosos que receberam complemento solidário em 2017 utilizaram o cheque-dentista, uma cobertura “muito baixa” que pode dever-se ao facto de desconhecerem que têm direito ao vale, segundo o especialista em saúde pública Jorge Simões.

Cheque-dentista só foi usado por 3,5% dos idosos beneficiários

Autor: Lusa/AO Online

No ano passado, o programa de saúde oral contratou 4.678 dentistas espalhados por 8.641 clínicas do país, uma cobertura elevada, que varia entre 97,7% no Norte e 89,4% no Algarve.

Contudo, a sua abrangência apresenta variações conforme a população-alvo: enquanto nas crianças e nos adolescentes a cobertura se situa nos 95% e nas grávidas em 63%, nos idosos baixa para os 3,5%.

“São um grupo muito vulnerável da população, com alfabetização reduzida e podem não estar plenamente conscientes do seu direito ao uso do cheque-dentista”, afirma Jorge Simões, um dos autores do programa, num artigo publicado no Health Policy Journal, que avalia os dez anos do cheque-dentista.

Em declarações à agência Lusa, o diretor da Unidade de Saúde Pública Internacional e Bioestatística do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, explicou que o acesso ao programa “pressupõe conhecimento”, o que coloca os idosos em desvantagem em relação a outros grupos beneficiários do programa financiado pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Enquanto as crianças e os adolescentes recebem os seus vales automaticamente nas escolas públicas e estão ao alcance dos serviços de saúde, as grávidas, os idosos e os portadores de VIH/Sida têm de revelar a sua condição para receber o cheque-dentista, explicou.

Para inverter esta situação, o especialista defendeu que deve haver uma “maior preocupação” por parte da equipa de saúde que acompanha o idoso em saber a sua condição e informá-lo sobre os seus direitos, tal como os párocos e as outras confissões religiosas podem anunciar nas paróquias que existe o cheque-dentista e a quem se destina.

Fazendo um balanço dos 10 anos da medida, Jorge Simões destacou como “aspetos mais positivos” já ter abrangido 3,3 milhões de portugueses e ter “melhorado drasticamente” os indicadores de saúde oral.

Entre 2006 e 2013, o indicador de dentes cariados, perdidos e obturados diminuíu 20% nas crianças de 12 anos. “Se podemos dizer que há um nexo de causalidade óbvio, absoluto entre cheque-dentista e esta descida, não. O que podemos dizer é que seguramente também se deve ao cheque-dentista esta descida tão significativa”, frisou.

No artigo, Jorge Simões e os outros autores afirmam que, embora o programa tenha uma natureza não universal, que pode pôr em risco “o princípio do acesso universal” a cuidados de saúde pública, a sua cobertura tem sido alargada, tendo em conta os grupos mais vulneráveis e a necessidade de prevenção e de tratamento precoce das doenças orais mais graves.

“Quando o SNS não pode, por razões financeiras, dar uma resposta a todos os cidadãos, então é preferível, sem demagogias, dizer ‘eu vou progressivamente alargando esta resposta, mas vou começando pelos grupos prioritários’ e eu julgo que as escolhas foram bem feitas”, considerou à Lusa.

No entanto, a medida deixa de fora potenciais beneficiários como crianças e adolescentes que frequentam escolas privadas ou idosos que recebem reformas baixas, mas insuficientes para acederem a benefícios sociais.

Mas, adverte, a expansão do cheque-dentista ou de outras formas de prestação de cuidados de saúde oral pode “ser prejudicada pela necessidade de conter custos e alcançar a sustentabilidade financeira no SNS”.


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