Autor: AO Online/ Lusa
Nos quatro primeiros anos, dois dos quais a funcionar como projeto-piloto, o banco recebeu oito doações, mas, oito anos volvidos, estas mais que duplicaram, triplicaram, quadruplicaram ou quintuplicaram e chegaram às 60, adiantou hoje à Lusa o coordenador-executivo, Ricardo Taipa.
“Passamos de dois a três cérebros por ano para cerca de um por mês. Por exemplo, este mês, que ainda não terminou, já recebemos duas doações”, contou.
O objetivo a médio prazo é “chegar perto” dos 15 cérebros por ano, número adequado aos recursos humanos do banco, onde trabalham dois neuropatologistas, duas técnicas e uma secretária, disse.
Ricardo Taipa salientou que, para serem mais ambiciosos, teriam de ver a equipa e a capacidade logística reforçada.
Na sala de autópsias, local onde se “trabalham” os cérebros, o coordenador-executivo explicou que, quando um dador morre, é-lhe retirado o cérebro que, depois, é cortado ao meio, sendo uma das metades congelada a fresco numa arca a 80 graus negativos, depois de devidamente separada nas diferentes áreas anatómicas, arquivada e numerada, tarefa que demora três a quatro horas.
A outra é colocada em formol e, passadas três semanas, é cortada, para se retirarem fragmentos microscópicos para análises e testes diagnósticos para se saber do que padeceu “exatamente em vida” o dador, realçou.
O tecido cerebral, em parafina ou congelação, dura décadas, podendo daqui a 30 anos estar-se a estudar um doente que morreu recentemente, adiantou Ricardo Taipa.
O neuropatologista garantiu que os familiares do dador, neurologista e médico de família são sempre avisados do “resultado final”, sendo que, em 80% dos casos, os diagnósticos em vida são concordantes com os de pós-morte.
Apesar dessa concordância, o responsável pela Unidade de Neuropatologia e diretor do Banco de Cérebros, Manuel Melo Pires, assumiu que, por vezes, há surpresas.
“Por exemplo, temos doentes que tinham Alzheimer e outra patologia associada, algo que só se descobre pós-morte, e, quando se fazem essas descobertas, toda a gente ganha, desde os clínicos, investigadores e famílias”, ressalvou.
Aberto a qualquer patologia neurológica “bem estudada” do ponto de vista clínico, nomeadamente Alzheimer, Parkinson ou Esclerose Lateral Amiotrófica, o banco recebe cérebros de dadores de Viana do Castelo a Coimbra, comentou.
Adiantando que o objetivo é alargar a área, Melo Pires lembrou que, caso a colheita não seja feita no Santo António, o transporte do cérebro deverá ser “rápido” e chegar ao banco em “duas a três horas no máximo”, um dos problemas em aumentar a abrangência territorial.
Mas, preferencialmente, a colheita deverá ser no banco, não tendo a família qualquer custo com o transporte do cadáver, sendo assegurado na totalidade pelo banco, reforçou.
“Felizmente, há funerárias que nem cobram esse trajeto”, confidenciou.
O neuropatologista entendeu que a decisão de doar o cérebro para investigação pelo doente em vida ou pela família é um “ato altruísta” e essencial para o conhecimento das doenças do sistema nervoso central, para o avanço da ciência e para a descoberta da cura.