Autor: Pedro Lagarto
Contudo, ao olharmos com mais atenção, essencialmente para o seu interior, percebe-se que seis anos após o realojamento das primeiras famílias a máxima "Casa nova, vida nova" não chegou a todos. Com efeito, dezenas de portas, janelas e nichos de água e de luz foram danificados ou destruídos (ver fotografia) e até o piso e a vedação do parque infantil foram arrancados (entretanto foi reposta a malha de metal), e isto apesar de a Câmara de Ponta Delgada ter instalado no bairro um núcleo de apoio, onde vários técnicos transmitem ensinamentos nas áreas da gestão doméstica, manutenção do espaço público e planeamento familiar. O problema é que após o encerramento do núcleo, o bairro ganha outra dinâmica, mas no pior sentido. "Ao fim da tarde começa a sessão de pancadaria e a ressaca, senhor", lamenta uma das moradoras, que pediu para não ser identificada, aliás, pedido extensível a todos os locais com quem falámos ontem. À conversa com três homens, que bebem café junto a uma viatura de venda ambulante, que disponibiliza também bens de primeira necessidade, dada a inexistência naquela zona de um espaço comercial, eles afirmam que "o bairro está cheio de malandros que recebem o Rendimento Mínimo". O problema não se resume, todavia, às pessoas sem ocupação, conforme explicita outra moradora: "Há aqui gente boa, mesmo estando desempregada, mas também muita bebida e droga, daí não admire que briguem e partam tudo. Mas penso que já foi pior". Entretanto, apercebendo-se da presença de jornalistas à conversa com os moradores, uma jovem mulher, mãe de três menores, assegura que nunca deixa as filhas brincarem à porta de casa, que dá para o interior do bairro e, portanto, sem que se coloque o perigo da circulação automóvel. "Nem pensar! De casa para o atelier de tempos livres e do atelier de tempos livres para casa. Isto não é um bom local para deixar as crianças à solta", sublinha. Uma segunda mãe, que veio à janela, foi também interpelada por nós no sentido de sugerir o que poderia ser feito para melhorar o Bairro de Santo António. Em jeito de proposta e de desabafo, respondeu: "um abrigo para a paragem de autocarro que está em frente ao bairro, que se resume a um poste (ver fotografia) , e que as crianças que frequentam o segundo ciclo, em Ponta Delgada, tenham transporte escolar em vez de irem a pé e debaixo de chuva (5 a 10 minutos) apanhar o transporte público na via rápida, onde, por vezes, até são incomodadas por alguns automobilistas provocadores. Não está certo!". Depois da Rosinha, a Câmara Municipal prosseguiu a política de realojamento no concelho, na Canada do Peixe Assado. Ciente de que a herança era pesada ao nível de comportamentos problemáticos, foi instalado um gabinete de apoio social onde técnicos - da edilidade e de diversas outras instituições - têm procurado reabilitar as relações familiares e de vizinhança bem como o respeito e preservação do espaço público, não esquecendo a vertente do lazer. Todavia, muitos comportamentos e maus hábitos se têm revelado difíceis de alterar, sobretudo, porque há uns anos, não houve uma intervenção mais radical junto dos miúdos que na altura tinham 12/13 anos e que hoje, na casa dos 17 a 20 anos, vivem essencialmente de noite, consomem álcool e droga, revelando enorme incapacidade para trabalharem com os técnicos e se integrarem na comunidade.