Autor: Célia Machado
Foi a primeira mulher de São Roque do Pico a presidir a uma Assembleia Municipal no pós-25 de Abril. Estávamos em 1976 e o executivo autárquico de São Roque era liderado por António Simas da Costa, então eleito pelo PPD/PSD.
Se hoje o apelido Freitas é conhecido na política regional, é preciso que se diga que foi Maria Pinheiro Ávila Freitas a primeira da família a ocupar um cargo político, embora não tenha sido algo premeditado.
Era professora, estava casada há 12 anos e tinha dois filhos pequenos quando, aos 35 anos, foi empossada presidente da Assembleia Municipal de São Roque do Pico. Pela frente tinha um pesado fardo: tentar impôr a ordem naquele órgão do poder local era bem diferente de fazê-lo numa sala de aula. O maior dos impasses era o facto dos deputados municipais não olharem para uma mulher como uma figura de autoridade. “Não foi fácil”, conta-nos, mas não desistiu. Se a sua voz e a sua presença não eram suficientes, o que decidiu foi uma jogada de mestre: “Pedi ao presidente da autarquia que comprasse um gravador para eu utilizar nas sessões da assembleia”. Perante o equipamento, os deputados mudaram a sua postura já que todas as reuniões passaram a ser gravadas. Ainda assim, havia muitas batalhas para travar. Do marido recebeu apoio; da mãe palavras menos encorajadoras, sobretudo por preocupação. “Ela dizia-me: Paciência, no que te foste meter”, recorda. O mandato foi cumprido.
Algumas memórias já se desvaneceram mas tem bem presente a importância do que fez e não se arrepende da sua participação na vida política do concelho.
Depois foi o marido, Mário Martins de Freitas, quem abraçou a vida política: vereador da Câmara Municipal de São Roque pelo PPD/PSD, de 1979 a 1989; deputado do parlamento regional eleito a 5 de outubro de 1980 e novamente a 14 de outubro de 1984; viria depois a ser também presidente da Assembleia Municipal, de 1993 a 1996, ano em que faleceu.
Algumas semanas antes, o filho mais velho, Duarte Freitas, era eleito pela primeira vez deputado regional do PSD pelo círculo eleitoral do Pico. Conta já com um longo historial: vice-presidente da Câmara Municipal de São Roque do Pico, deputado da Assembleia Regional (1996-2004), deputado ao Parlamento Europeu (2004-2009), regressa ao hemiciclo açoriano (2009), é eleito presidente do PSD/Açores (2012), toma posse como secretário regional da Juventude, Emprego e Qualificação Profissional (2020) e assume a pasta das Finanças, Planeamento e Administração Pública (2022).
Já o filho Mário Freitas foi presidente da Junta de Freguesia de São Roque do Pico durante três mandatos consecutivos e é, desde outubro de 2021, vereador da Câmara Municipal de São Roque. Apenas o filho mais novo, Tiago Freitas, enveredou por outras atividades, embora tenha estado no centro das decisões políticas da UE, enquanto funcionário da Comissão Europeia
Ver o percurso dos filhos na política deixa-a de coração cheio mas há também alguma preocupação e tristeza: “As pessoas pensam que eles podem fazer tudo, resolver todas as situações, pelos cargos que ocupam, mas não é assim”.
Do Pico para a Terceira
Natural de São Roque do Pico, teve de, bastante nova, deixar a casa paterna para prosseguir estudos no Liceu da Horta, no Faial, por não ser possível, na sua ilha, ir mais além do que o primeiro ciclo.
Foi graças a uma sugestão do médico Tibério d’Ávila Brasil, figura proeminente, que Maria foi, pelos 18 anos, frequentar o Magistério, na ilha Terceira, o que lhe permitiu ser professora - algo que não lhe tinha passado pela cabeça. “O doutor Tibério ficou com pena que a filha não tivesse frequentado o Magistério e, então, disse ao meu pai que eu devia ir”, conta-nos.
Foi com a companhia de algumas colegas do Liceu da Horta mas, sempre que era possível, regressava ao Pico para uns dias em família. Eram longas viagens de barco, com este a fazer imensas escalas.
É na ilha Terceira que encontra o amor; uma “voz bonita” que muitos ouviam no “Rádio Clube de Angra”: o reputado locutor Mário Martins de Freitas. Destaque-se, a propósito, que no livro “Rádio Clube de Angra – A Voz da Terceira”, Pedro de Merelim refere-se a Mário Freitas como um dos verdadeiros símbolos da comunicação social do seu tempo.
Casam em 1964 e ficam a viver definitivamente no Pico.
Praticamente durante todo o tempo em que foi docente, Maria Pinheiro deu aulas na ilha do Pico, à exceção do primeiro ano em que exerceu na Serra de Santiago, pertencente à Vila das Lajes, na Terceira, e um mês na cidade da Horta, no Faial.
De salientar que, em São Roque, fez parte do grupo de professores que deu aulas fora do seu horário laboral a jovens que queriam ir mais longe nos estudos, antes de surgir, no concelho, uma escola básica e secundária, sendo este episódio da sua vida mais um motivo de orgulho para a mesma.