Autor: Rui Jorge Cabral
Nesta altura de crise há mais pessoas a bater à porta da Igreja a pedir ajuda?
Temos a Cáritas, as Conferências Vicentinas e a Legião de Maria a dar respostas imediatas às famílias com necessidades. Não temos tido um aumento muito significativo de pedidos, mas tem-me sido transmitido pelos nossos serviços de assistência social que há, de facto, um novo tipo de pessoas que recorrem agora a nós e não era costume fazerem-no, nomeadamente famílias jovens, gente que estava mais ou menos bem e que começa a ter dificuldades. Não posso, no entanto, dizer que este seja um fenómeno muito difundido. Estamos preparados para dar um apoio imediato a essas famílias, mas gostaríamos de não ficar só por esse apoio imediato e isso passa por uma maior militância por parte dos cristãos, como nos tempos áureos da Acção Católica, quando os cristãos tinham uma maior intervenção na acção política e social, trabalhando nas causas da pobreza e criando um novo paradigma de justiça social.
Essa falta de ‘militância’ dos cristãos está relacionada com a ‘crise espiritual’ mais do que económica, de que fala na sua mais recente nota pastoral a propósito da Semana da Diocese?
Vivemos numa sociedade de pendor materialista e consumista, onde se vão perdendo as referências espirituais... Continuamos a ter movimentos eclesiais, mas sem grande intervenção social. O raio de actuação da Acção Católica está muito reduzido, sem que se consiga ‘reeditar’ a militância católica, como ela já se manifestou antes. Mas queremos que os cristãos não fiquem ausentes de dar o seu contributo para melhorar a sociedade, porque vemos que há necessidade de um ressurgimento espiritual e da manutenção de um certo quadro de valores. Não nos podemos deixar ficar só no desenvolvimento económico, por mais necessário que ela seja, porque nem só de Pão vive o Homem...
A Diocese de Angra faz hoje 475 anos. Quais são os seus grandes desafios actualmente?
A prioridade das prioridades é a formação cristã. Vivemos numa Diocese tradicionalmente católica, que tem uma forte religiosidade popular.Temos registado uma diminuição da prática religiosa, mas há sempre uma referência aos valores cristãos nas festas populares, embora notemos uma certa falta de formação. As festas fazem-se, mas a referência religiosa vai-se perdendo, apesar da origem da festa ser religiosa. Temos de encontrar meios para fazer uma catequese de adultos. Isto além da dificuldade que temos também de fazer passar a mensagem para as novas gerações, uma vez que, mesmo após dez anos de catequese, não vemos os jovens empenhados na Igreja. Na sua maioria, crismam-se e vão-se embora... Temos aqui um problema de transmissão da Fé e, por isso, temos de ter consciência das mudanças que há hoje na sociedade e encontrar a linguagem e a actuação pastoral mais adequadas a essa nova realidade. Não podemos mudar o Evangelho, mas temos de mudar a maneira de o transmitir. Não é fácil transmitir o que não muda numa sociedade em mudança... Hoje, não se trata de baptizar convertidos, mas sim de converter baptizados.
Leia a entrevista a D. António Sousa Braga na íntegra na edição impressa do Açoriano Oriental de 3 de Novembro de 2009.