Açoriano Oriental
O papel dos imigrantes no desenvolvimento regional
Numa época marcada fortemente pelo processo da globalização, a mobilidade de pessoas, não sendo um fenómeno novo assume novos contornos e valores e, por consequência, novas complexidades.
O papel dos imigrantes no desenvolvimento regional

Autor: Paulo Mendes
No entanto é um fenómeno com um potencial enorme, numa breve viagem sobre a nossa história recente perceberemos que as regiões mais desenvolvidas tiveram sempre um forte impulso da imigração. A realidade nacional não é excepção nesse sentido e creio que para os Açores, não obstante o fenómeno ser recente, poderá ser a médio prazo uma alavanca importante para o desenvolvimento que nós almejamos para a região.
A ideia central é que o desenvolvimento só é concretizável com pessoas. Neste contexto é necessária, por um lado, população activa para os vários sectores de actividade, com especial enfoque para os desvalorizados socialmente e pouco apetecível para os nacionais, por outro é preciso mercado para que as empresas possam ter capacidade de gerar riqueza. Os Açores, face à sua exígua dimensão, têm estes dois problemas. Mas já lá vamos.
Segundo as estatísticas das Nações Unidas, 191 milhões de pessoas eram migrantes em 2005, representando perto de 3% da população de indivíduos que vivem fora do seu país de nascimento. Fazendo a leitura sobre o mesmo número, mas a partir de um outro prisma, isso equivale a afirmar que 7 em cada dez pessoas ainda nascem e morrem no mesmo espaço geográfico. Analisar esses números ao contrário ajuda-nos a relativizar os fluxos migratórios e a desconstruir as percepções das pessoas (sobretudo nos países mais desenvolvidos) da existência de uma pressão migratória bem maior do que a realidade dos números. Por outro lado, não é menos verdade dizer que, não obstante a existência de fluxos migratórios consideráveis entre os países do sul (em vias de desenvolvimento), o pólo central da atracção dos migrantes situa-se nos países mais desenvolvidos.
Em Portugal residem, actualmente, perto de 500 mil estrangeiros, representando perto de 5% da população residente e sensivelmente 10% da população activa, inseridos sobretudo em áreas de pouca atractividade para os nacionais.
Em relação aos Açores é de salientar que a região tem sido palco nos últimos 6 anos de um movimento imigratório mais ou menos regular, obedecendo aos mesmos contornos que o fenómeno assume no continente português, nomeadamente em relação à origem, a inserção sociolaboral, etc. E são três as razões que explicam esta nova realidade açoriana.
Primeiramente, é de realçar o ambiente económico favorável (abaixamento de taxas de juros, transferência de fundos estruturais, etc.) que se traduziu no boom na área de construção civil no arquipélago. Segundo, e ainda dentro da esfera micro,  foi o processo de reconstrução ocorrido nalgumas Ilhas do Grupo Central, sobretudo no Faial, na sequência da actividade sísmica verificada em Junho de 1998. Uma terceira razão, de carácter mais geral, prende-se com o próprio aumento da população migrante em Portugal, facto que proporcionou uma larga descentralização espacial do fenómeno para outras regiões do país. Para além de ter havido situações em que as empresas foram recrutar trabalhadores nos países de origem (por exemplo Cabo Verde), registou-se também a vinda de empresas do continente português, possibilitando a própria mobilidade geográfica dos trabalhadores imigrantes.
Em relação aos números, em 2005 residiam legalmente na Região Autónoma dos Açores
14194 cidadãos estrangeiros. Não obstante o peso diferenciado das diversas comunidades, o facto é que gradualmente a região vai-se tornando num espaço de convergência de pessoas provenientes de várias latitudes, acolhendo estrangeiros de mais 50 países diferentes, tendo maior expressão as comunidades cabo-verdiana, brasileira e ucraniana.
A migração, não sendo um fenómeno exclusivamente económico, tem na sua base a questão material. As pessoas, quando saem dos seus países de origem, fazem-no na maior parte da vezes à procura de melhores condições de vida económica e de realização material, o que faz com que o justo retorno financeiro do capital humano investido constitua um dos aspectos centrais.
Com efeito, é inegável a importância que as imigrações assumem para os países de acolhimento e vale a pena reter alguns números para a realidade portuguesa, sobre a importância que os imigrantes representam para a economia nacional.
Num estudo feito sobre efeitos da Imigração na Economia Portuguesa (Rato, Helena, 2004), concluiu-se que em 2001 os imigrantes contribuíram para o VAB em cerca de 5%, sendo esse valor de 15% na construção civil, 12% na hotelaria e restauração e 10% nos serviços e empresas. Em 2005 apontou-se que os imigrantes contribuíram em cerca de 7% para o PIB nacional.
Pessoalmente, acho que essa importância está subavaliada, já que para além do relativo desfasamento temporal não levou em consideração alguns milhares de imigrantes que se encontram inseridos de forma irregular no mercado de trabalho, bem como o diferencial salarial que existe entre os imigrantes e os nacionais, no exercício das mesmas funções.
Indo ainda mais longe neste nível de considerações, vale a pena referir que entre os efeitos da imigração no mercado de trabalho assenta o resultado que provoca na criação de postos de trabalho. Por um lado, o imigrante não é exclusivamente um produtor, ele é igualmente um consumidor que, nessa qualidade, vai permitir gerar  postos de trabalho aos que produzem e distribuem bens de consumo, bens duráveis e serviços e, por consequência, contribuem para o aumento do PIB. No entanto, é verdade que nos primeiros momentos da fase migratória os imigrantes tendem a ter um consumo muito inferior aos nacionais, como consequência da propensão à poupança, com reflexos nas  remessas enviadas para o país de origem. Entretanto, à  medida que o imigrante prolonga a sua estadia no espaço de acolhimento e encontrando-se razoavelmente integrado, a sua contribuição económica é muito mais valiosa. Por isso o aproveitamento das potencialidades económicas dos imigrantes tem de estar dependente de todo um processo de integração e as questões laborais devem ser defendidas e fomentadas dentro do quadro nacional e regional.
Um outro dado importante diz respeito à taxa de participação activa dos imigrantes, que se situava em 2001 na ordem dos 77%, muito acima da taxa da população residente em Portugal (nacionais e estrangeiros) que se situava da ordem dos 48,2%. Essa diferença, que é muito significativa, é esclarecedora sobre a vertente eminentemente económica da imigração em Portugal.
Uma outra perspectiva que nos ajuda a perceber esse quadro é que cada cidadão estrangeiro teria sido, em 2001, um contribuinte líquido médio do Estado Português em cerca de 14002 euros. Se o Estado regularizasse, por hipótese, 50 mil imigrantes indocumentados, arrecadava muito perto de 52 milhões de euros (O VAB nacional teria ascendido a cerca de 65), para além de outros benefícios indirectos que uma pessoa imbuída de direitos e deveres poderá imprimir à sociedade onde reside. Para além desses factores, acresce uma forte disponibilidade geográfica e funcional, a par de recursos e competências úteis ao mercado de trabalho nacional e regional.
Em termos gerais podemos afirmar que o aumento recente dos fluxos migratórios vem resolver o problema de decréscimo da oferta de mão-de-obra nacional para os tais segmentos secundários do mercado de trabalho (construção civil, hotelaria e restauração, limpeza,  etc.) e na inexistência de trabalhadores imigrantes certamente que chegaríamos a uma situação de subutilização da capacidade produtiva instalada, como alguns estudos têm referido.
Não obstante a imigração ser recente na Região, estou convencido de que o cenário nacional é perfeitamente aplicável à realidade regional, ou seja, a presença dos imigrantes tem-se traduzido num ganho real para os Açores, em especial para a sua economia.
Atentos unicamente à celebração de contratos de trabalho, em 2006 foram comunicados 994 contratos com os cidadãos estrangeiros, dos quais 25,9% brasileiros, 22,9% cabo-verdianos, 19,8% ucranianos e 5% referentes aos angolanos. A larga maioria, cerca de 78%, foi de contratos celebrados para o sector de construção civil, 5% no sector de alojamento e restauração, 54% para a pesca de aquacultura e 3% para as actividades recreativas, culturais e desportivas.
Apesar da necessidade de conhecermos melhor o real impacto da imigração na vida das empresas regionais, o conhecimento empírico diz-nos que esse ganho é concreto.
Numa altura em que a Região está a passar por uma fase de crescimento económico notável e necessita de potenciar o desejável equilíbrio entre as várias ilhas, estou certo de que a imigração poderá ser alavanca muito importante na prossecução desses objectivos.

Notas

1 Acresce ainda os soldados norte-americanos destacados na Base das Lajes, na Ilha Terceira, que à data eram 3209 indivíduos, perfazendo o total de 7403.  Essa população tem especificidade própria, por isso não faz sentido perspectivá-los como imigrantes
2 Almeida, André Correia, Impacto da Imigração em Portugal nas Contas no Estado, ACIME, Lisboa, 2003
3 Rato, Helena, et al. , Viagens de Ulisses: Efeitos da Imigr
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