Açoriano Oriental
Calor de outono fustiga peregrinos que agradecem sacrifício adicional
O calor outonal trouxe este ano aos peregrinos a oportunidade de fazer mais uma prova de fé, somando mais um sacrifício a uma viagem que os próprios desejam dura
Calor de outono fustiga peregrinos que agradecem sacrifício adicional

Autor: Lusa/AO online

"Há dois dias que caminho e não estava à espera deste calor. Mas tudo se suporta: são umas bolhitas e nada mais", disse hoje à Lusa um dos peregrinos, Jorge Dias, de 39 anos, revelando que a viagem, tal como o percurso da vida, ensina-o a necessidade "de passar pelos sacrifícios e ultrapassar obstáculos".

A habitual chuva outonal pode ser uma provação, mas os peregrinos que rumam a Fátima dizem que fariam melhor a viagem fustigados pela água do que pelo calor. Mas o desafio é bem-vindo.

Fátima Fonseca tem 54 anos e é uma peregrina "veterana". Sublinha que já lá vão mais de 20 viagens e que, todos os anos, há um motivo especial que torna a viagem diferente das anteriores.

"Nunca são iguais [as caminhadas] umas às outras. Este ano está muito calor e uma pessoa viu-se um bocado atrapalhada (?), mas venho a pensar no sacrifício para que Nossa Senhora nos ajude, porque sem sacrifício a gente também não tem nada", sentencia.

Na freguesia de Caranguejeira, Leiria, há uma imagem da Virgem Maria que habita um cruzamento povoado por um caixote de lixo, placas de empresas e linhas de Alta Tensão.

Ali, os peregrinos deixam um pouco de tudo que testemunhe a sua viagem, para lá do gradeamento a que está confinada a escultura de Nossa Senhora: velas, flores, meias, anjos, ‘t-shirts' e chapéus assinados.

Vindas de Carriço, Pombal, duas amigas aproximam-se da imagem que lhes é familiar. Ali passaram mais de meia-dúzia de vezes a pé e o local traz-lhes sossego à alma e descanso aos pés.

"Sem sol faz-se melhor a viagem", admite Alice Azevedo, realçando que, apesar de "ser mais cansativo" e multiplicar as bolhas nos pés, "é precisamente o sacrifício que torna as caminhadas especiais".

Pode ler-se no chapéu da amiga, Adelaide Almeida, uma frase muito pouco" católica" para quem se lança à estrada em peregrinação: "quem vê cús não vê corações".

A mensagem é sobre as aparências e é difícil de passar despercebida. Por isso Adelaide faz questão em sublinhar o que lhe vai na cabeça e assume como essencial: "a fé que temos é a fé que nos move".

Há quase uma década, José Costa, de Cale de Cambra, apoiou uma peregrinação, mas no seu íntimo ficou claro que nunca se aventuraria em fazer tal viagem a pé. Puro engano.

"A necessidade entretanto apertou e depois não parei mais", explica, à sombra, fugindo ao sol por instantes. Está calor, sim senhor, destaca, José Costa, mas talvez seja essa luz que torna tudo tão claro para o peregrino: "dizem que é preciso fazer sacrifícios e nós fazemos. Cristo fez tanto por nós que não há caminhadas que paguem".

Aos 75 anos já não se lembra muito bem se saiu de casa há três dias, mas não é essa a contabilidade que importa, reforça entre sorrisos: "faço a viagem para pedir sorte na vida, saúde no físico e na alma? e que nos perdoem um bocadito".

Quarta e quinta-feira, 12 e 13 de outubro, tem lugar em Fátima a peregrinação de Outubro que evoca uma das aparições de Nossa Senhora aos pastorinhos e o chamado "Milagre do Sol", que relatos da época garantem ter sido testemunhado por cerca de 50.000 pessoas.

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