Açoriano Oriental
Açores, que economia de mercado?
O excesso de oferta de habitação e o sobredimensionamento do sector das obras públicas nos Açores (tal como no Continente) vai agravar o desemprego no curto prazo. Por outro lado, não vai ser fácil continuar a absorver um a dois milhares de jovens que anualmente ingressam no mercado
Açores, que economia de mercado?

Autor: Monteiro da Silva
Apesar da gravidade e do carácter sistémico da crise que estamos a viver e ao contrário do coro generalizado prenunciador da morte anunciada do modelo da economia de mercado, podemos, em minha opinião, afirmar com toda a clareza que esta crise, embora muito grave, não põe em causa o modelo conceptual que lhe está subjacente e vai ser ultrapassada.
O percurso dos acontecimentos económicos e sociais verificados nos últimos anos, o crescimento desmesurado do sistema financeiro, sem contrapartida real no sistema económico, a existência de operações financeiras “ tóxicas” desreguladas, a proliferação das zonas off shore, exige uma maior coordenação por parte das autoridades dos diferentes países, mas sobretudo o “renascimento” e a intervenção das autoridades supranacionais de supervisão e de regulação já existentes a nível global.
Hoje como ontem, a economia de mercado, com todos os defeitos sobejamente conhecidos que gera o seu modo de funcionamento, continua no entanto, a revelar-se como a melhor solução para gerir com eficiência o sistema económico. As experiências políticas advenientes do legado marxista, ao longo do século passado, foram de tal maneira devastadoras, quer para o funcionamento da economia quer para o exercício das liberdades fundamentais e para o funcionamento democrático das sociedades, que trariam para a humanidade consequências muito mais penalizadoras, caso voltassem a ser implementadas.
De facto, estamos actualmente na fase de um capitalismo financeiro e especulativo, que tem que ser regulado pelos poderes públicos, uma vez que o seu dinamismo, gera desigualdades sociais, concentração dos rendimentos e exclusão social. É para isso que existem os poderes públicos e que é necessário que sejam estes a controlar o sistema de mercado. Hoje, ao contrário, são muitas vezes alguns agentes económicos que dominam o funcionamento da economia de mercado e que acabam por controlar também o poder político.
 O funcionamento transparente do mercado deve ser, pois, a regra de ouro. No entanto, cabe aos poderes públicos regular esse funcionamento de forma a garantir as liberdades dos cidadãos e a justiça social.
O que tem vindo a faltar nestes últimos anos, são os princípios que norteavam o comportamento dos agentes económicos e sobretudo dos agentes políticos, ou seja, a utilização eficiente dos recursos escassos,  uma justa distribuição dos rendimentos e a procura de um modelo que volte a ser gerido por princípios éticos.
No caso Açoriano, esta crise não terá efeitos imediatos em termos financeiros, dada a não existência de instituições financeiras de relevo com sede na Região, mas vai ter efeitos a nível económico. Se é certo que as medidas tomadas pela generalidade dos países à escala planetária indicia uma resposta minimamente sustentada na área financeira, o impacto a nível económico da mesma ainda não se fez reflectir.
Em minha opinião, vai ser muito difícil escapar aqui nos Açores, às consequências dessa crise. A retracção das economias a nível mundial vai afectar o sector turístico, a acessibilidade ao crédito por parte dos particulares, das empresas e do sector público, bem como as disponibilidades da União Europeia em ajudar as Regiões da Ultra- periferia.
O excesso de oferta de habitação e o sobredimensionamento do sector das obras públicas nos Açores (tal como no Continente) irá agravar o desemprego no curto prazo. Por outro lado, não vai ser fácil no actual estádio da economia açoriana, continuar a absorver um a dois milhares de jovens que anualmente ingressam no mercado de trabalho. Como já chamei a atenção, temos vivido no passado recente em situação de pleno emprego. Nessa altura, devíamos ter aproveitado para proceder à reestruturação da função pública. Existem áreas e sectores onde a redução drástica dos nascimentos nos Açores, para dar apenas um exemplo, onde passámos de uma média de 10000 nascimentos nas décadas de 60 e 70 para uma média de 3000 nos anos mais recentes, vão exigir reestruturações mais ou menos profundas (excesso de professores e de escolas), sobretudo nos primeiros anos de escolaridade. 
Termino, dizendo que continuo a acreditar, hoje como no passado, que o sistema de economia de mercado, típico das sociedades ocidentais do pós guerra, continuará a nortear o nosso sistema económico e social. É natural que nesta pequena sociedade insular, o peso das estruturas do sector público regional sejam mais expressivas, até porque caberá a essas estruturas colmatar falhas de mercado que em sociedades maiores a mais desenvolvidas caberiam ao sector privado. Como tenho repetido ultimamente, temos que nos apoiar sobretudo em nós próprios, sector público e privado, através de parcerias em que os recursos financeiros e humanos regionais estejam na primeira linha. Se assim não for, ficaremos na dependência perigosa de forças estranhas à Região e com os centros de decisão no exterior das nossas ilhas. Ficaremos mais vulneráveis e prosseguirá a hemorragia de recursos humanos que nos são fundamentais, e que já começou.
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