Açoriano Oriental
Açores com 70% da população vacinada
“A pandemia trouxe-nos uma maior capacidade de resiliência”

Sandra Silva, enfermeira e vogal do conselho de administração da USISM, relata a sua experiência desde do início da pandemia, de como foi reorganizar os cuidados de saúde primários e ter de se ausentar muitas horas da sua família

“A pandemia trouxe-nos uma maior capacidade de resiliência”

Autor: Susete Rodrigues

“O grande desafio, perante uma dificuldade que era desconhecida como foi a pandemia, foi readaptar e reorganizar os cuidados de saúde primários para uma oferta de serviço que não fazia parte do nosso regular funcionamento”.

É desta forma que Sandra Silva, enfermeira e vogal do conselho de administração da Unidade de Saúde de Ilha de São Miguel, se refere aos desafios e dificuldades deste último ano e meio de pandemia.

Os cuidados de saúde primários tiveram que readaptar-se, a diversos níveis, nomeadamente na “avaliação do risco das pessoas que ficavam positivas, os seus contactos de alto risco, o acompanhamento na vigilância ativa de pessoas positivas e dos seus contactos, na criação das equipas de colheitas que conseguissem dar respostas a toda a área geográfica da ilha de São Miguel, na alocação de equipas para o aeroporto de Ponta Delgada”, explica Sandra Silva para acrescentar que atualmente, na fase da vacinação, também houve a necessidade de uma readaptação.

Desta nova realidade, Sandra Silva retira, sobretudo, uma aprendizagem, enfatizando que a pandemia “trouxe-nos uma maior capacidade de resiliência enquanto profissionais de saúde, resiliência nas tomadas de decisões porque houve a necessidade de ficarmos até às três ou quatro horas da manhã a pensar num plano estratégico, um plano que fosse suficientemente coeso e capaz de dar resposta, quer às necessidades dos utentes nas outras situações de saúde, quer às necessidades dos utentes em termos de Covid-19 e quer às necessidades dos nossos profissionais de saúde, porque tivemos que reorganizar as equipas, sobretudo, os horários. Portanto, isso foi uma aprendizagem que vamos levar para o resto das nossas vidas”.

Questionada se alguma pensou que não iriam conseguir dar resposta ao solicitado, Sandra Silva disse que “todos os dias isso vinha-nos à cabeça. Sempre que éramos confrontados com um desafio e, quando digo nós, falo em nome do conselho de administração da USISM”. No entanto, existiu uma capacidade de trabalho em equipa muito grande e “só chegamos onde chegamos porque os nossos profissionais estiveram junto a nós e nós junto a eles”.

A relação com os utentes mudou no início da pandemia, no sentido de que “os cuidados de saúde primários sempre foram uma aberta”, mas que tiveram que fechar “perante o desconhecido, pese embora ter existindo sempre uma resposta, mas foi uma resposta que teve de ser mais faseada, mais controlada”. Sandra Silva explica, ainda, que nos primeiros seis meses de pandemia “notou-se uma fraca adesão dos utentes porque as pessoas tinham medo de sair casa e esta relação de medo fez com que as pessoas, nunca deixando de acreditar nos cuidados de saúde, se reprimissem mais um pouco”. Mas os meios digitais, o telefone, o email, a teleconsulta veio permitir uma nova forma de ligação entre doentes e profissionais. Nesta matéria, a enfermeira destaca que as consultas por telefone foram muito importantes, porque “ainda hoje temos uma linha de vigilância ativa e muitas vezes percebemos que aquele contacto telefónico nem sempre teve/tem muito de físico, mas teve/tem muito da parte psicológica, por isso foi muito importante”. Por outro lado, a USISM fez questão de manter as equipas ao domicílio.

Se em algum momento sentiu medo de ser infetada, Sandra Silva afirma que, no princípio, “tínhamos mais receio do que agora porque era o desconhecido, mas também era um pensamento que surgia apenas nas alturas em que tínhamos capacidade de refletir porque no dia a dia não havia receio”, frisando que “quando fomos para as escolas fazer os rastreios, quando fomos para Rabo de Peixe, não houve receio e foi tão gratificante estar com aquelas pessoas porque recebemos tanto carinho. Aliás em todos os locais onde fomos, recebemos muito carinho por parte das pessoas e acabávamos por esquecer qualquer receio”.

Conciliar a vida profissional com a pessoal não foi tarefa fácil para os profissionais de saúde e, falando da sua experiência pessoal, chama à sua família de lutadores porque “não é fácil ter uma mãe ausente, principalmente nos primeiros seis meses da pandemia e quando digo mãe, faço-me representar por todas as mães e pais dos profissionais da USISM e por todos os que não têm filhos, porque passamos, em muito, o nosso limite de horas normais”. “Não me esqueço que a primeira vez que a equipa de colheitas saiu para ir para o terreno, a sensação que tive foi que eles iam para a guerra... ficámos à espera que eles regressassem à meia-noite ou à uma hora da manhã...”, relata a enfermeira com alguma emoção, reiterando que “houve uma capacidade de adaptação das nossas famílias (…). O que aconteceu comigo e com a minha família é o reflexo do que aconteceu com os profissionais da USISM”.

Houve também muitas situações que a marcaram e de todas destaca o trabalho em equipa: “A USISM reuniu esforços de tal maneira... estou a falar desde o motorista, ao assistente operacional, ao enfermeiro, ao médico, o psicólogo, à senhora da comunicação. O que mais me marcou foi o nosso espírito de equipa e o nosso espírito de missão e é este último que tem feito com que até hoje não tenhamos tido muitas baixas. Sempre que pedimos mais um desafio, olhamos para o lado e já temos ali toda a gente disponível”. Em 24 anos de profissão, “nunca pensei que isso pudesse acontecer, esse espírito de equipa e de missão”. A finalizar o seu relato sobre a sua experiência durante a pandemia de Covid-19, a mensagem que Sandra Silva deixa à população  é que “continuem a acreditar nos serviços de saúde e a acreditar na vacina”.

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