Açoriano Oriental
Pedro Gomes recebeu prémio nacional entregue pela Ordem dos Advogados

Em causa processo de “habeas corpus” que permitiu a libertação de 300 pessoas que cumpriam uma quarentena obrigatória. É a primeira vez que um advogado dos Açores recebe o prémio Ângelo d’ Almeida Ribeiro da Ordem dos Advogados

Pedro Gomes recebeu prémio nacional entregue pela Ordem dos Advogados

Autor: Luís Pedro Silva

A Ordem dos Advogados (OA) atribuiu o Prémio Ângelo d’ Almeida Ribeiro-2020 ao advogado açoriano Pedro Bettencourt Gomes, que promoveu o primeiro “habeas corpus” relacionado com as medidas impostas pelo Governo Regional dos Açores para travar a pandemia da Covid-19.

O processo em que interveio Pedro Gomes aconteceu em maio de 2020, quando vigorava uma quarentena obrigatória de 14 dias numa unidade hoteleira para qualquer pessoa que chegasse do exterior aos aeroportos de Ponta Delgada e Lajes, tendo permitido a libertação de cerca de 300 pessoas.

Nenhum dos passageiros libertados após o “habeas corpus”, que estavam fechados num quarto de hotel com condições que os tribunais avaliaram ser piores do que num estabelecimento prisional, acusaram positivo nos testes de diagnóstico da Covid-19.

Em comunicado, a Ordem dos Advogados adianta que a decisão de atribuir o prémio àquele advogado foi tomada em reunião do Conselho Geral da OA e decorreu de uma proposta da Comissão dos Direitos Humanos da OA (CDHOA).

“Recorde-se que o advogado, natural de Ponta Delgada, foi o promotor, em maio passado, de um ‘habeas corpus’ de um cliente arbitrariamente detido nos Açores. A ação, que teve o total apoio da OA e que o Tribunal de Ponta Delgada julgou procedente, colocou um ponto final na imposição de quarentena em hotéis por parte do Governo Regional dos Açores, que havia aprovado uma resolução que impunha quarentenas em hotéis a cidadãos que se deslocavam à Região, no quadro das medidas no âmbito da pandemia da Covid-19”, acrescenta a nota informativa.

O prémio Ângelo d’Almeida Ribeiro destina-se a distinguir anualmente as personalidades ou entidades nacionais que mais se tenham destacado na defesa dos direitos dos cidadãos. Esta foi a primeira vez que um advogado dos Açores foi distinguido com este prémio.

“Sinto orgulho, humildade e responsabilidade. Foi um prémio inesperado, mas representa o trabalho efetuado na defesa da liberdade individual e do Estado de Direito”, afirmou Pedro Gomes, em declarações ao Açoriano Oriental.

O advogado reconhece ser importante “proteger a saúde individual e coletiva, mas a defesa da saúde tem de respeitar a Constituição e a legislação em vigor. Este é um princípio do Estado de Direito democrático”.

Com a decisão de um “habeas corpus” de um cidadão, o Governo Regional, no mesmo dia, revogou a resolução do Conselho de Governo, substituindo por outra resolução com testes obrigatórios para todos os passageiros.

A decisão de avançar com um “habeas corpus” motivou uma forte contestação popular contra o advogado, mas Pedro Gomes garante que estava a defender os direitos de um açoriano, que estava preso ilegalmente numa unidade hoteleira.

“Antes de apresentar o ‘habeas corpus’, já tinha solicitado à Provedora de Justiça para se pronunciar sobre a legalidade das quarentenas obrigatórias nos Açores e pudesse solicitar a sua inconstitucionalidade. Compreendo a reação das pessoas, porque existia medo de uma doença desconhecida que fazia milhares de mortos em todo o mundo, mas não poderia deixar de ser advogado e defender o Estado de Direito. Foi isso que fiz, sem receio de uma má interpretação da minha intervenção. Quando um advogado veste a sua toga e sobe as escadas do Tribunal vai pedir Justiça e defender o Estado de Direito contra uma atitude do Estado que colocava em causa um direito individual”, sustentou.

A ação desenvolvida por Pedro Gomes, em maio, motivou comentários ferozes na sua página de Facebook, mas o advogado aceitou o direito de liberdade de expressão de todos os que comentaram o seu trabalho.

“É natural que as pessoas hoje reajam de forma diferente. Observei o que as pessoas escreveram nas redes sociais, mas mantive todos os comentários na minha página do Facebook. Não apaguei nenhum comentário de qualquer natureza. Entendo que a liberdade de expressão das pessoas deve ser respeitada. Não gostei de todos os comentários e não me revejo em muitos deles, mas também recebi na altura e ainda hoje recebo muitas mensagens de apoio e estímulo”, conta.

Pedro Gomes refere ainda que a decisão do “habeas corpus” não contribuiu para agravar o problema da pandemia nos Açores, porque nenhuma das 300 pessoas que estavam em unidades hoteleiras acusou positivo ao novo coronavírus e, após o final das quarentenas obrigatórias, existiu um mês e meio sem nenhum caso detetado nos Açores. A decisão do tribunal não trouxe nenhum agravamento do risco para os Açores”, frisou.

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