Autor: Lusa/AO Online
O STJ diz que foi ilícito a companhia aérea despedir o trabalhador por publicar naquela rede social um comentário a criticar a postura de um administrador da empresa, passageiro num voo de 07 de setembro de 2015, em que Luís Miguel Sancho era o piloto comandante e o avião se atrasou devido a uma avaria.
“Com esta decisão, inédita, o STJ inverteu em absoluto o sentido da jurisprudência até agora seguida pelos tribunais superiores portugueses, no sentido de conferir a justa causa ao despedimento promovido pela entidade empregadora, quando o trabalhador subordinado publicasse na rede social Facebook afirmações críticas para com aquela”, sublinhou o advogado Paulo Campos, em declarações à Lusa.
No acórdão, a que a agência Lusa teve acesso, o STJ declarou a “ilicitude do despedimento, manifestamente abusivo”, e condenou a companhia aérea açoriana a pagar 55.250 euros a Luís Miguel Sancho “a título de indemnização substitutiva da reintegração, bem como ao pagamento das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao transito em julgado” da decisão, agora proferida.
Segundo o Supremo, o piloto foi despedido a 15 de dezembro de 2015, auferindo, à data, um rendimento ilíquido base de 6.500 euros mensais. De acordo com as contas da Lusa, relativamente aos salários destes três anos, o trabalhador irá receber uma indemnização, no mínimo, de 273 mil euros.
O advogado explicou que, até agora, os tribunais portugueses sempre consideraram "lícitos esses despedimentos”.
O STJ salienta que o que se discutiu neste processo em concreto foram os “limites da liberdade de expressão do trabalhador subordinado, mormente quando faz uso de tal liberdade no contexto de redes sociais como o Facebook”.
Para o advogado, este acórdão, proferido pelo STJ a 27 de novembro, “com fixação de jurisprudência, evidencia a proteção e a defesa da liberdade de expressão do trabalhador, através das redes sociais, designadamente, através de comentários no Facebook”.
“Mereceu acolhimento pelo STJ, a tutela pelo Direito do Trabalho, da liberdade de expressão do trabalhador, quando o teor da sua mensagem não é do inteiro agrado do seu destinatário ou da maioria, especificamente, quando o mesmo faz uso de tal liberdade no contexto das redes sociais”, acrescenta Paulo Campos.
O Supremo entendeu que “não se mostram preenchidos os requisitos de justa causa de despedimento, ou seja, não se verificou um comportamento culposo do trabalhador/recorrente, que pela sua gravidade e consequências, tenha tornado de imediato e praticamente impossível a subsistência da relação laboral”, frisando que o autor do 'post' não identificou o seu empregador.
Nesse sentido, a “sanção aplicada” ao piloto comandante “foi manifestamente abusiva e o seu despedimento ilícito, tanto mais que o empregador podia, eventualmente, socorrer-se de uma outra sanção mais leve” das que estão previstas no Código de Trabalho.
Luís Miguel Sancho, que foi comandante na transportadora aérea açoriana desde 2001, foi ouvido a 12 de outubro de 2015 na comissão parlamentar de inquérito ao Grupo SATA, em Ponta Delgada, onde classificou como “completamente obsoletos” os aviões A310 ao nível do conforto no interior da cabine, em comparação com a concorrência.
A 28 de dezembro de 2015, cerca de duas semanas após o despedimento, o presidente da comissão parlamentar de inquérito ao grupo SATA, nos Açores, anunciou nesse dia que iria pedir à administração da companhia aérea açoriana informação oficial sobre os motivos do despedimento do comandante Luís Miguel Sancho.
À data, a companhia aérea garantiu que a decisão de despedir o piloto comandante nada teve a ver com as declarações polémicas do trabalhador na comissão de inquérito à transportadora, mas sim com dois processos disciplinares.
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