Autor: Rafael Dutra/Ana carvalho Melo
O tempo escurece e os dias são cada vez mais curtos. Ainda estamos no mês de novembro, mas a época de Natal está cada vez mais próxima. As tradições natalícias continuam bem vincadas nos Açores. Os presépios tradicionais feitos com bonecos são uma tradição que não escapa a muitos lares, e é nesta altura em que há um maior número de encomendas aos bonecreiros da Região, como é o caso de João Arruda.
Natural da Lagoa, João Arruda tem 56 anos e trabalha no Museu Municipal deste concelho, na oficina de bonecreiro. O lagoense desde criança demonstrou “imenso gosto” em fazer presépios e também “muita curiosidade em fazer bonecos”, que preparava sem molde. No entanto, João Arruda, em entrevista ao Açoriano Oriental, explica que só se dedicou totalmente a ser bonecreiro e artesão mais tarde na sua vida, após um problema de saúde “complicado”, que lhe impossibilitou a continuação no antigo trabalho.
Foi uma mudança súbita e um processo de aprendizagem que não foi fácil. O bonecreiro admite que teve de aprender esta arte e, para o conseguir, frequentou várias formações e workshops, e até aprendeu com outros bonecreiros. É uma aprendizagem contínua: “estamos sempre aprendendo”, sustenta o artesão, que tem a sua própria oficina, onde iniciou o seu trajeto na arte bonecreira.
Já quanto à produção de bonecos, diz também que é um processo difícil e que requer “muita paciência”. Primeiro há a questão de fazer o molde, que depois tem de ser retirado e limpo. Os bonecos posteriormente passam por um período em que têm de secar, e depois por um processo de cozedura. Só então é que passa à parte da pintura, e aí tem de pintar umas cores, deixar secar e pintar outras, até chegar ao produto final. “Hoje temos técnicas e tinta com melhor qualidade, mas leva o seu tempo”, refere.
O bonecreiro diz ainda que depois de fazer o molde é que tem a maior parte do trabalho, visto que “cerca de 75%” é feito com as mãos. “Cada um aperfeiçoa à sua maneira e faz os acabamentos que gosta”, podendo aproveitar os moldes ou modificar os bonecos conforme a sua imaginação, conta João Arruda, destacando ainda que é um trabalho minucioso, mas prefere “aperfeiçoar os bonecos o máximo possível”, porque valoriza mais a qualidade do que produz do que a quantidade.
Atualmente trabalha no Museu da Lagoa, onde dá formações, explica a arte bonecreira aos visitantes e faz bonecos para o museu, porque há lá uma pequena loja que os vende, e produz ainda para outras atividades da Câmara, caso seja preciso. No entanto, não abdica do seu atelier, onde também fabrica estes bonecos, nos seus tempos livres.
Felizmente, e apesar de estarmos a chegar à época do Natal, onde há muitas encomendas e os bonecreiros vendem mais, João Arruda afirma que os bonecos tradicionais e os presépios de lapinha estão na “moda”. E, por isso, durante o ano, tem bastantes clientes: colecionadores, emigrantes, e até comerciantes locais, que compram para depois vender aos seus clientes. O artesão também exporta para outros sítios do mundo. “As pessoas têm gosto em ter um presépio com bonecos tradicionais da sua terra”, realça.
Embora considere que não seja possível viver da arte bonecreira, e que a mesma é apenas um suplemento, João Arruda reconhece que para trabalhar nesta área “é preciso ter gosto, dedicação e paciência. Não se consegue viver só com o dinheiro da venda dos bonecos”, salienta.
Não obstante esta
condicionante financeira, é possível verificar um acréscimo no número de
bonecreiros em São Miguel, muito devido ao município da Lagoa, que tem
apostado na formação de artesãos e bonecreiros, inclusive através de
iniciativas como o projeto ‘Novos Bonecreiros’.
Por esta razão, e questionado sobre o futuro da arte bonecreira, João Arruda confessa que já esteve “mais pessimista”, e que agora está “mais satisfeito”, porque a “Câmara da Lagoa conseguiu, e nós conseguimos formar novos bonecreiros”, conclui.