Açoriano Oriental
Quase um quarto dos trabalhadores portugueses no Luxemburgo enfrentam risco de pobreza
Os trabalhadores portugueses no Luxemburgo são os mais expostos ao risco de cair na miséria, com quase um quarto a ganhar menos que o limiar de pobreza, segundo o último relatório "Coesão Social e Emprego", do Statec.

Autor: Lusa/AO Online

 

De acordo com o instituto de estatísticas do Luxemburgo, no ano passado 22,1% dos trabalhadores portugueses viviam com menos de 1.665 euros por mês, considerado o limiar da pobreza, num país em que as rendas podem ultrapassar os mil euros.

A taxa de risco de pobreza dos portugueses aumentou no último ano (em 2012 era de 20,9%) e é superior ao risco da população em geral (15,9%), representando mais do triplo dos luxemburgueses na mesma situação (6,4%).

"Na maioria dos casos, os portugueses trabalham em sectores em que a mão-de-obra não é qualificada, com salários mais baixos, e por isso estão em maior risco de caírem na pobreza", explicou à Lusa Paul Zahlen, um dos responsáveis do relatório.

Com rendimentos mais baixos, os portugueses têm mais problemas para chegar ao fim do mês: 59% dizem ter dificuldades para fazer face às despesas correntes, contra apenas 19% dos luxemburgueses.

À Caritas chegam cada vez mais casos de portugueses em dificuldades, cerca de 60 por mês, mas há também emigrantes de origem cabo-verdiana, guineense e de São Tomé empurrados pela crise.

"Já vi aqui pessoas a chorar", contou à Lusa Amílcar Monteiro, agente sócio-educativo no Serviço de Solidariedade e Integração da organização católica.

"As pessoas são resistentes e pensam que a vida vai melhorar, mas sofrem muito, e mesmo assim não querem regressar a Portugal, porque dizem que lá não vêem futuro".

Daniela e Rogério Santos aceitaram o convite de um amigo para trabalhar no Luxemburgo, mas um ano depois, a família vive na angústia de ficar sem o salário do marido nas empresas de trabalho temporário, que ronda os 1.400 euros por mês e é a única fonte de rendimentos do casal.

Rogério já veio com contrato no sector da restauração, mas depois das férias de Verão, o contrato não foi renovado, e o emigrante português foi obrigado a ir trabalhar para as obras.

O casal deixou Valadares, em Vila Nova de Gaia, quando a família deixou de conseguir pagar os tratamentos do filho, uma criança com sete anos que sofre de autismo.

"Aos seis anos iam cortar-lhe as ajudas todas. O meu marido estava desempregado, pagávamos 68 euros de terapia da fala e psicóloga por mês, e decidimos emigrar. Se ficássemos, íamos ter de pagar o custo total dos tratamentos, 180 euros por mês, e se já não conseguíamos pagar 68, imagine 180", contou Daniela Santos.

A emigrante portuguesa já teve de pedir ajuda a instituições de solidariedade social no Luxemburgo, incluindo roupas para o menor.

O aumento dos casos de pobreza levou mesmo o arcebispo do Luxemburgo a pedir às organizações católicas que intervenham, entregando cabazes de alimentos.

"Já entreguei alguns a vários portugueses. Não eram pessoas com fome, mas estavam a passar momentos difíceis", contou o técnico social da Caritas, frisando que o risco de pobreza não afecta apenas os recém-chegados.

"Começa a haver problemas também com quem cá está há vários anos, e que até gozavam de uma situação de estabilidade, mas que começam a sofrer com o desemprego ou se vêem em dificuldades porque o marido ficou incapacitado ou porque houve um divórcio", explicou.

Com salários baixos e contratos precários, basta um membro do casal perder o emprego para a família ficar em risco de pobreza.

"O problema é que a renda de casa é muito elevada, cerca de mil a 1.200 euros", e "há muitas pessoas que só conseguem trabalho 20 horas por semana, a trabalhar nas limpezas e a ganhar 700 euros por mês", frisou.

Por essa razão, "as pessoas são obrigadas a viver em quartos por cima dos cafés ou do outro lado da fronteira, onde as rendas são mais baratas, o que depois aumenta os problemas de integração e da educação das crianças", explicou o técnico social.

Daniela e Rogério Santos estão nessa situação. Depois de um ano a tentarem encontrar casa no Luxemburgo, acabaram a viver em França, a três quilómetros da fronteira luxemburguesa, mas agora não conseguem uma escola adaptada para o filho, o que impede a mãe de trabalhar.

"Pedimos para ele frequentar uma escola especial no Luxemburgo, mas até agora não conseguimos autorização, e ele vai duas horas por dia a uma escola normal aqui em França", contou a mãe.

 

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