Autor: LUSA/AO Online
“Na prática, poderíamos considerar que a Venezuela, com os sinais que
existem, parece estar a caminhar para uma ditadura”, disse à Lusa o
diretor executivo da organização não-governamental (ONG) de defesa dos
direitos humanos. Segundo Pedro Neto, a Amnistia Internacional não
se pronuncia sobre os regimes políticos, entretanto, sabe que a
democracia “é o único regime que permite que exista direitos humanos em
plenitude”. “Em mais nenhum outro conseguimos ter os direitos humanos assegurados, nomeadamente direitos civis e políticos”, referiu. O
responsável da AI Portugal disse que na Venezuela “há eleições
paralelas, há a proibição de manifestações até ao próximo domingo
(quando ocorre a eleição da Assembleia Nacional Constituinte, rejeitada
pela oposição), há repressão em Caracas e em outras cidades que não
estão a promover sequer protestos, com a repressão ao cidadão comum nas
ruas, ao acaso, e mesmo em casa”. “O que está a acontecer na Venezuela não é próprio de uma democracia”. Na
Venezuela, as manifestações a favor e contra Maduro intensificaram-se
desde 01 de abril passado, depois de o Supremo Tribunal ter divulgado
duas sentenças, que limitam a imunidade parlamentar e em que aquele
organismo assume as funções do parlamento. A 01 de maio, Maduro
anunciou a eleição de uma Assembleia Constituinte para alterar a
Constituição, o que intensificou os protestos que, desde abril,
provocaram pelo menos 107 mortos. “Os direitos civis e políticos
estão a ser violados. Há violência como política de Estado na Venezuela e
uma estratégia para estrangular a dissidência ao Governo. Todos aqueles
que pensam diferente são logo etiquetados como terroristas e são
proibidos de se manifestarem e a violência é usada contra estas
pessoas”, disse Pedro Neto. Tudo isso, segundo o responsável da
AI, “é sinal de que os direitos civis e políticos estão a ser colocados
em causa” na Venezuela. Sobre as eleições para uma Assembleia
Constituinte, que ocorre no domingo, Pedro Neto disse que “são caminhos
alternativos (…) estas eleições estão dentro da lógica de repetir os
processos até que aconteçam de modo que interesse a quem os propõe”. “A
democracia é um exercício de aceitação, de conciliação dos nossos
pontos de vista e dos pontos de vista dos outros. Estas eleições e o
caminho que está a acontecer até elas, mostram sinais muito graves de
que a democracia não está de boa saúde na Venezuela, bem pelo
contrário”, indicou. “No país, neste estado atual, os direitos
económicos e sociais também estão a ser postos em causa. A situação
económica na Venezuela já estava precária há algum tempo, não é recente,
os problemas começaram com a baixa do preço do petróleo e depois
sucederam-se políticas de Estado que prejudicaram muito a economia do
país, onde não havia fome”, acrescentou. O país enfrenta uma grave crise de abastecimento de mantimentos e de medicamentos, entre outros géneros de primeira necessidade. De
acordo com Neto, todas estas situações são de conhecimento da AI,
inclusivamente através portugueses que vivem na Venezuela, referindo
ainda que muitos destes emigrantes estão a voltar para Portugal,
nomeadamente para a Madeira. “Esta também acaba por ser uma
questão para Portugal, que tem o desafio de acolher e integrar estas
pessoas no nosso país, para que possam viver e, inclusivamente,
manterem-se economicamente”, indicou. Na quinta-feira, uma equipa
de jornalistas da estação de televisão portuguesa SIC, composta pelos
jornalistas Luís Garriapa e Odacir Júnior (repórter de imagem), foi
impedida de entrar na Venezuela, onde faria a cobertura das eleições. “Nada
disso é novo, nem é surpreendente, porque são sempre as mesmas
estratégicas. A comunicação social, os advogados, os defensores dos
direitos humanos são profissões típicas dos que sofrem sempre que há
tentativas de reprimir a liberdade de expressão e os direitos humanos”,
disse Pedro Neto. No caso da equipa da SIC, Pedro Neto disse que
foi exigida uma acreditação para estar no país e que, na história
recente da Venezuela, não há notícia de jornalistas portugueses terem
sido impedidos de realizar o seu trabalho. “Parece que as
autoridades venezuelanas querem esconder o que se está a passar no
país”, sublinhou ainda o diretor executivo da Amnistia Internacional
Portugal.