Vagas em casa de abrigo para mulheres com deficiência vítimas de violência são insuficientes
25 de mai. de 2023, 18:39
— Lusa
O
projeto-piloto arrancou em 2018, depois de um convite feito pela então
secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Catarina Marcelino,
para que a instituição de Águeda, com décadas de trabalho junto de
milhares de pessoas com deficiência, abraçasse este novo desafio.Em
entrevista à agência Lusa, a diretora técnica da CERCIAG admitiu que,
na altura, o projeto foi um desafio que criou medos, já que, apesar da
experiência junto das pessoas com deficiência, a instituição não tinha
qualquer experiência na área da violência doméstica.“Nós
achámos que seríamos capazes porque [estava sinalizada] alguma
dificuldade em responder às necessidades desta população muito
específica na área da violência”, apontou Luísa Carvalho.A
responsável explicou que o projeto arrancou como piloto para que depois
“se extraíssem conclusões que fossem capazes de servir de base a
resultados e indicadores e que pudesse ser um projeto replicável” a
nível nacional.Segundo Luísa Carvalho, o
projeto-piloto deveria durar cerca de dois anos, mas a pandemia alterou
os prazos e arrastou até 2023 o que deveria ter terminado em 2020.Por
outro lado, salientou, a pandemia teve também como consequência que as
sinalizações por violência doméstica baixassem em comparação com anos
anteriores, uma vez que vítima e agressor passaram a viver juntos 24
horas por dia.“Os casos que foram
reportados são claramente inferiores e, no caso das mulheres com
deficiência, a questão é ainda mais grave [porque] habitualmente a
mulher com deficiência vive com o cuidador, que na maioria das vezes é o
agressor e em muitas situações é também o representante legal”, apontou
a responsável.De acordo com a diretora
técnica, a resposta existente, e que se traduz na única casa de abrigo
deste género em todo o país, é deficitária para a procura que tem
existido, fruto de número de casos sinalizados.“Claramente,
em termos das sinalizações que temos, os sete lugares são
manifestamente insuficientes”, alertou, destacando todo o trabalho de
longo prazo que tem de ser feito com estas pessoas, nomeadamente a
construção de um projeto de vida que passe pelo regresso à localidade de
origem.Luísa Carvalho defendeu que é
preciso capacitar estas mulheres, mas tendo em conta que a informação
tem de ser acessível do ponto de vista cognitivo, já que o acesso à
informação “é também um direito fundamental”, e porque só desta forma
será possível “prevenir atempadamente (…) situações de violência
futura”.A responsável apontou que “grande
parte” destas mulheres são vítimas das pessoas que tinham a obrigação de
as proteger, enunciando que há casos de agressões sexuais, situações de
abuso medicamentoso, dependência financeira ou retirada de próteses
para que as pessoas percam autonomia.Para a
diretora técnica, o trabalho que é feito com estas pessoas serve também
para lhes devolver visibilidade e dignidade, salientando que estes
cinco anos têm sido “uma experiência única”, num caminho “trilhado com
elas”.Admite, no entanto, que a
instituição não estava preparada para que o projeto se arrastasse tanto
no tempo, salientando que, ao problema da falta de vagas se soma a falta
de respostas nas áreas de residência.“Está a ser absolutamente impossível e isso cria-nos imensos problemas”, denunciou.Revelou,
por outro lado, que o financiamento da casa de abrigo tem sido um
problema ao longo dos anos e que a verba que a instituição recebe não
cobre sequer 50% das despesas. Razão pela qual foi pedida ajuda à
autarquia local, que garante mais 30% dos custos.“Conseguimos
80%, mas ainda ficam a faltar 20%”, apontou, alertando que a situação é
“absolutamente insustentável” e que em causa estão pessoas com “graves
dependências”, algumas das quais “nunca vão ser autónomas”.Por
esta razão, Luísa Carvalho admite que toda e qualquer verba angariada
pela iniciativa “Uma Imagem Solidária”, que reúne fotografias de
fotojornalistas profissionais e amadores e que este ano reverte para
esta instituição, “são extraordinariamente bem-vindas”.A
responsável alertou que o financiamento da casa de abrigo termina em
junho e ainda não abriu novo concurso, o que a leva a defender que este
tipo de resposta deixe de estar dependente de fundos comunitários para
passar a estar incluído no Orçamento do Estado.Disse
ainda ter tido uma conversa com a secretária de Estado da Igualdade e
Migrações, Isabel de Almeida Rodrigues, que a tranquilizou, deixando a
garantia de continuidade do projeto.