Um Natal com calor, danças tradicionais e peixe em folha de palmeira na Consoada
Hoje 08:05
— Rui Jorge Cabral
Olancia tem 24 anos e Varelia 23. São primas, ambas nasceram em Timor-Leste - no outro lado do mundo - e estão nos Açores, a mais de 14 mil quilómetros da sua terra natal, desde 2023.Ambas estudam na Escola de Formação Turística e Hoteleira, em Ponta Delgada, onde frequentam o curso de Cozinha e Pastelaria. Nos Açores, afirma Varelia, “gostamos sobretudo da natureza e da tranquilidade da ilha de São Miguel, onde não existem conflitos”.Recorde-se que Timor-Leste tem cerca de um milhão e meio de habitantes e uma história de conflitos pela sua independência, declarada em 1975, aquando da descolonização portuguesa, mas apenas concretizada em 2002, após um longo período de ocupação e conflito com a Indonésia. Olancia, por seu lado, refere que estar em São Miguel é estar num local “mais calmo e onde encontrámos boas pessoas” que as acolheram bem na comunidade. O seu contacto com a Igreja Católica e com as tradições de Natal começa em Timor-Leste, um país onde “95 por cento da população é católica” e onde a cada domingo “as pessoas vão à missa”, numa prática que é mais vincada do que nos Açores. Em São Miguel, estas duas timorenses notam menos prática católica, por comparação com o seu país de origem. E sobretudo, “não vejo aqui tantos jovens a querer ir à missa”, afirma Olancia. No Natal em Timor-Leste e para além das temperaturas mais elevadas, acima dos 20 graus Celsius, explica Olancia, “as pessoas preparam os presépios para o nascimento do Menino Jesus, com cânticos e danças tradicionais”, numa mistura entre a cultura ocidental e a cultura local. Ao nível da gastronomia, a mesa da Consoada em Timor não tem bacalhau nem grão-de-bico, com batatas cozidas, como em Portugal. Conforme explica Varelia ao Açoriano Oriental, come-se por exemplo a Katupa, que é um prato típico de Timor-Leste. A Katupa é feita com arroz, leite de coco e especiarias, sendo preparada sobretudo com peixe grelhado, que é cozido em folhas de palmeira. A noite de Natal tem igualmente uma particularidade em Timor-Leste diferente do que acontece nos Açores, onde normalmente a Consoada é feita em família e as visitas fazem-se no dia seguinte, na chamada ‘oitava’ do Natal. Em Timor-Leste, explica Varelia, “quando as pessoas saem da missa, vão para casa comer em família e depois partilha-se a comida que sobra com os vizinhos”. Ou seja, na noite de Natal, “as pessoas vão a casa dos vizinhos, dar as Boas Festas, levar a Paz e a Alegria e dar um abraço”, afirma por seu lado Olancia. Nos Açores, nos dois Natais que já aqui passaram, Olancia e Varelia puderam perceber como se faz a Consoada graças ao convite de uma das suas professoras, mas notaram logo que nos Açores a tradição é fazer o jantar em família e depois vão todos para as suas casas.Em Timor-Leste não. “Estamos primeiro em família e depois vamos comer também com os nossos vizinhos e em qualquer casa que passemos, é para entrar”, afirma Varelia. Desde que estão nos Açores, Olancia e Varelia nunca mais fizeram as oito horas de viagem de avião de regresso a Timor-Leste. Admitem ter algumas saudades de casa, mas conforme revela Olancia, a vontade agora é a de permanecer nos Açores e tentar iniciar uma vida profissional na hotelaria em São Miguel.