Um ano após a reeleição, Obama em risco de perder confiança interna e dos aliados

3 de nov. de 2013, 11:25 — LUSA/AOnline

A 06 de novembro de 2012, o reeleito Obama anunciava aos norte-americanos, no discurso de vitória, que acreditava que para os Estados Unidos (EUA) “o melhor ainda estava para vir”, sublinhando na mesma ocasião que nunca tinha estado “tão esperançoso". Doze meses depois, o governante admite que o ano “foi difícil”, numa referência ao braço de ferro entre republicanos e democratas para alcançar um acordo orçamental no Congresso norte-americano. O confronto entre as duas fações, em muito motivado pela reforma do sistema de saúde patrocinada pelo líder norte-americano (‘Obamacare’), culminou no início de outubro numa paralisação parcial do Estado federal que durou mais de duas semanas e numa séria ameaça de um eventual incumprimento por parte dos EUA. Bernardo Pires de Lima, investigador do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI), afirmou à Lusa que este foi um dos três temas que “atormentaram” a administração Obama em 2013, que revelou “extrema dificuldade em gerir duas maiorias distintas no Congresso, a polarização partidária e o aumento da dívida”. “As semanas de ‘shutdown’ puseram a nu estas condicionantes, alarmaram os mercados, diminuíram a confiança económica e expuseram mais uma vez o exercício frágil da função presidencial”, indicou o especialista. Para António Neto da Silva, presidente da Associação de Amizade Portugal/EUA (AAPEUA), o atual cenário político norte-americano revela “uma luta entre dois conceitos de sociedade”. “Uma sociedade mais livre, em que a iniciativa individual passa também pelas questões de salvaguarda do futuro individual de cada um e dos cuidados de saúde que possa vir a ter. (…) Em confronto com uma abordagem mais europeia, que é esta que o Presidente Obama pretende, na qual o próprio Estado entende que também é da sua responsabilidade garantir cuidados para as pessoas que porventura não se tenham precavido para o futuro”, realçou o antigo secretário de Estado do Comércio Externo. Na opinião de Bernardo Pires de Lima, Obama têm vários desafios internos permanentes. “Conseguir a entrada em vigor do ‘Obamacare’, previsto para 2014, e reformar a lei de imigração, cumprindo dois roteiros legislativos e fechando dois capítulos basilares na doutrina do partido democrata”, mencionou o investigador, que não esquece as questões económicas. “Aumentar o crescimento económico, gerar emprego e encarrilar a estratégia de independência energética em curso, a qual provocará a grande viragem geopolítica das próximas décadas, reduzindo a dependência do Médio Oriente e provavelmente o envolvimento dos EUA, em termos semelhantes, na região”, destacou ainda. Já Neto da Silva identifica o desafio ambiental, acreditando que os Estados Unidos, “líder mundial em praticamente todas as áreas”, devem assumir o comando, criar compromissos internacionais que sejam cumpridos de forma efetiva e "definir como absolutamente prioritários (…) os valores do planeta". A nível internacional, os últimos meses têm sido difíceis para Obama: a eventual intervenção militar na Síria face a utilização de armas químicas e a revelação do escândalo das escutas internas e externas realizadas pela Agência Nacional de Segurança (NSA) norte-americana, envolvendo vários líderes mundiais como a chanceler alemã Angela Merkel. “O impacto que a fuga de informação sobre estas escutas está a ter na relação entre líderes europeus e Obama é incalculável, como é também o efeito provocado no congelamento das negociações do indispensável acordo de comércio livre entre EUA e União Europeia (UE)”, sublinhou Bernardo Pires de Lima. Sobre a Síria, o investigador considerou que Obama assumiu uma “gestão errática”. “Obrigado a responder às ‘linhas vermelhas’ (...), deu dois passos em frente para depois recuar por falta de condições no Congresso, na NATO, no Conselho de Segurança [da ONU] e na região”, concluiu o investigador, numa referência ao acordo para a destruição do arsenal químico sírio. Neto da Silva frisou, por seu lado, que a decisão de Obama demonstrou que os Estados Unidos “procuravam uma alternativa” a uma intervenção militar, evitando as memórias ainda vivas de outros conflitos. A mais recente sondagem NBC News/Wall Street Journal, divulgada na quarta-feira, indicou que apenas 42% dos norte-americanos aprovam o desempenho governativo de Obama, o valor mais baixo de sempre, mesmo durante o auge da crise económica no início do seu primeiro mandato presidencial. O grau de desaprovação ronda os 52%. Obama também não resistiu na liderança da lista dos homens mais poderosos do mundo, elaborada anualmente pela revista Forbes, e foi este ano destronado pelo seu homólogo russo Vladimir Putin.