Tribunal de Contas alerta para riscos de má utilização de apoios públicos
Covid-19
2 de jun. de 2020, 09:50
— Lusa/AO Online
“A preocupação predominante na reação a
situações de emergência é a rápida resposta à crise e às necessidades
das populações. No entanto, a celeridade dessa resposta implica
frequentemente a debilitação dos mecanismos de controlo e prestação de
contas, implicando riscos acrescidos de desperdício, má gestão,
irregularidades e corrupção, que pressionam os recursos públicos e
prejudicam a eficácia da ação”, avisa o TdC no relatório “Riscos na
utilização de recursos públicos na gestão de emergências – Covid-19”.De
acordo com o tribunal, o necessário “enfraquecimento” dos controlos
habituais na autorização, por exemplo, de despesas “propicia
oportunidades para a ocorrência de irregularidades, fraudes e corrupção,
que a experiência evidencia terem ocorrido no passado e que os sinais
indicam estar a verificar-se em vários países no contexto da corrente
pandemia”.Neste contexto, alerta, “importa
assegurar o equilíbrio entre a necessidade de responder de forma célere
à crise e a salvaguarda dos princípios da transparência, integridade e
responsabilidade inerentes a utilização dos recursos públicos”.Apesar
da “ainda grande incerteza” quanto aos impactos” das ações tomadas para
enfrentar a pandemia”, em especial nos sistemas de saúde, no emprego,
na economia e na proteção social, o Tribunal dá como certo que “terão
consequências significativas no plano das finanças públicas e respetiva
sustentabilidade”.“Nesta data, e
relativamente ao impacto da crise na execução orçamental, foi divulgado
que até final de abril de 2020 e no âmbito da Administração Central e da
Segurança Social, a execução das medidas adotadas para combate e
prevenção da covid-19, bem como daquelas que têm por objetivo repor a
normalidade, terá conduzido a uma redução da receita de 319,9 milhões de
euros e a um aumento da despesa em 360,3 milhões de euros”, avança.Tendo
por base “recomendações e alertas internacionais, resultados de
auditorias e outras ações de controlo já conduzidas”, o relatório
identifica riscos relacionados com a gestão da crise e das medidas de
emergência; ajuda de emergência; concessão de auxílios públicos;
enfraquecimento dos controlos, da integridade e responsabilidade,
abrangendo a contratação pública; sistemas de informação; e
transparência, no que respeita à mensuração dos custos e à prestação de
contas”.“O Tribunal de Contas considera
necessário que todas as entidades que gerem dinheiros públicos estejam
atentas aos riscos identificados e que ponderem a aplicação de medidas
que os previnam e mitiguem, designadamente no que respeita à clareza e
coerência da legislação e regulamentação, à emissão de orientações para a
implementação harmonizada das medidas, ao estabelecimento de mecanismos
de monitorização, à definição e coordenação de responsabilidades e à
prevenção da duplicação de apoios”, sustenta.No
relatório agora divulgado, o TdC salienta também “a importância de
parametrizar adequadamente os sistemas de informação para implementação
dos apoios, de reforçar os sistemas de segurança informática, de
valorizar e salvaguardar a integridade dos agentes que intervêm nas
ações de resposta a emergência e de garantir a transparência e
publicidade dos processos e ações, designadamente quando estejam em
causa apoios e contratos públicos ou doações”.Adicionalmente,
destaca “a necessidade de documentar e fundamentar os processos isentos
de visto, mas com obrigatoriedade da sua remissão ao Tribunal,
substituindo os controlos prévios por verificações posteriores,
acautelando que a seu tempo seja assegurado o escrutínio público e
salvaguardadas responsabilidades”.Segundo
sublinha o TdC, só o registo desagregado das ações de implementação das
medidas covid-19 “possibilita o reporte, a responsabilidade e a
prestação de contas pelos recursos utilizados e a avaliação do seu
impacto em sede de finanças públicas e da respetiva sustentabilidade”.Embora
admitindo que “uma resposta de emergência eficaz implica que os
mecanismos de controlo, responsabilidade e transparência sejam
adaptados”, o TdC avisa que é preciso “acautelar a aplicação de medidas
que, ainda assim e a seu tempo, permitam assegurar o escrutínio público,
salvaguardar responsabilidades e avaliar as políticas adotadas”, lê-se
no relatório.No documento, o Tribunal
esclarece que as “áreas de vulnerabilidade” detetadas não se referem às
medidas atualmente em curso, cuja verificação não foi ainda possível
fazer, mas resultam de “um olhar sobre a forma como foram geridas
emergências passadas” e das conclusões de auditorias passadas.Entre
os exemplos avançados pelo TdC estão os auxílios concedidos através de
linhas de crédito, tendo por base a avaliação feita a 18 destas linhas
promovidas pelo Governo entre 2008 e 2016, e relativamente às quais
foram detetadas “fragilidades ao nível da monitorização”.“Não
têm sido definidos indicadores de resultados nem procedimentos de
recolha e análise de informação que permitam a avaliação da eficiência
na alocação de recursos financeiros públicos e da eficácia das políticas
quanto à abrangência, adicionalidade e sustentabilidade financeira”,
refere.Já da análise efetuada ao crédito
posto à disposição das empresas, em casos em que estas beneficiaram de
garantias e da bonificação da taxa de juro e/ou comissão de garantia, o
TdC diz ter verificado que “a percentagem de pequenas e médias empresas
(PME) abrangidas foi muito pequena (apenas 7%); o crédito foi
maioritariamente utilizado para fundo de maneio (87%), tendo o crédito
disponibilizado para fins específicos tido um nível de execução
residual; e as taxas de incumprimento contratual foram baixas, quando
comparadas com empréstimos “normais” às empresas (apenas foram
executadas 4,6% das contragarantias emitidas)”.“Ainda
no que respeita aos auxílios públicos, importa chamar a atenção para a
necessidade de publicitação da informação relativa aos apoios concedidos
e respetivos beneficiários, matéria em que o Tribunal também tem
assinalado défices”, conclui.