Tribunal da Relação de Guimarães diz que chamar palhaços a autarcas não é crime

9 de mar. de 2014, 19:49 — LUSA/AOnline

Na primeira instância, o arguido, presidente do Centro Social de Silvares, tinha sido condenado a 90 dias de multa, à razão diária de 6,20 euros. O tribunal deu como provado que, no dia dos factos, houve um conflito entre a Junta e o Centro Social, no decorrer do qual o arguido, dirigindo-se ao presidente da Junta, proferiu a expressão “vocês são uns palhaços, não sei como o povo vos escolheu”. O arguido recorreu e a Relação, por acórdão que a Lusa hoje consultou, absolveu-o, considerando que aquela expressão “não excede a grosseria nem a falta de educação”, tratando-se “de um mero juízo de valor que não tem aptidão para atingir a honra e consideração do visado”. O acórdão refere ainda que palavra “palhaço” é polissémica e, quando isso acontece, o tribunal "não tem de acolher o significado atribuído pelo visado tão-só por se ter considerado ofendido”. Diz ainda que “é próprio da vida em sociedade haver alguma conflitualidade entre as pessoas”, sendo “normal” que a animosidade resultante dessas situações tenha expressão ao nível da linguagem. “Uma pessoa que se sente incomodada por outra pode compreensivelmente manifestar o seu descontentamento através de palavras azedas, acintosas ou agressivas. E o Direito não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere suscetibilidades do visado”, lê-se ainda no acórdão. Sublinha ainda que o Direito só pode intervir “quando é atingido o núcleo essencial de qualidades morais que devem existir para que a pessoa tenha apreço por si própria e não se sinta desprezada pelos outros”. “Se assim não fosse, a vida em sociedade seria impossível. E o Direito seria fonte de conflitos, em vez de garantir a paz social, que é a sua função”, remata. Os factos registaram-se a 21 de novembro de 2011, quando a Junta de Freguesia de Silvares decidiu mudar a fechadura das instalações da autarquia, para impedir que elas continuassem a ser utilizadas pelo Centro Social. A situação motivou a “revolta” de um grupo de populares, obrigando à intervenção da GNR. Na primeira instância, tinham sido condenados mais dois populares, pelos crimes de injúria e de ameaça cometidos sobre o presidente e a secretária da Junta de Freguesia, que também recorreram, mas que viram as penas confirmadas pela Relação. Um "apanhou" 175 dias de multa à razão diária de 6,20 euros e o outro, 140 dias de multa, à razão diária de 6,70 euros.