Tribunal da Concorrência volta a apreciar recursos de Ricardo Salgado e Morais Pires
15 de out. de 2019, 13:17
— Lusa/AO Online
O Tribunal da
Relação de Lisboa deu provimento aos recursos apresentados pelo
Ministério Público e pelo Banco de Portugal, tendo revogado a sentença
do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém,
que, em dezembro de 2017, declarou nula a acusação administrativa do
Banco de Portugal (BdP) contra Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires e
ordenou a devolução do processo ao supervisor para, querendo, proferir
nova decisão isenta de vícios.Em acórdão
datado de abril último, o Tribunal da Relação de Lisboa determina que
seja proferida nova sentença que, “julgando inverificadas quaisquer
questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito, determine o
prosseguimento dos autos no TCRS como recurso de impugnação judicial,
aprecie os requerimentos probatórios dos sujeitos processuais e
impulsione os autos para julgamento do mérito dos recursos”.Em
causa estão os pedidos de impugnação apresentados por Ricardo Salgado e
Amílcar Morais Pires às coimas que lhes foram aplicadas pelo BdP por
contraordenações à lei de branqueamento de capitais e financiamento do
terrorismo, enquanto administradores do BES.O
processo que originou a condenação de Ricardo Salgado ao pagamento de
uma coima de 350.000 euros e de Amílcar Morais Pires ao pagamento de
150.000 euros – António Souto, condenado a uma coima de 60.000 euros,
não recorreu, o mesmo acontecendo com o BES (25.000 euros) – alegava
que, devido à omissão dos três responsáveis, o BES não aplicava medidas
de prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo
nas sucursais e filiais do BES de Angola, Cabo Verde, Miami e Macau.Nos
pedidos de impugnação que deram entrada no TCRS a 30 de maio de 2017,
cerca de um mês depois de conhecida a decisão do BdP, os arguidos
alegavam que apenas dispuseram de 30 dias úteis para apresentar defesa
depois de notificados da acusação, quando o processo contava com sete
volumes (com mais de duas mil folhas), 36 anexos (com 11 mil folhas) e
32 pastas em suporte digital.Na sentença
proferida em dezembro de 2017, o juiz Sérgio Martins de Sousa deu razão
aos recursos que invocavam preterição do direito de defesa na fase
administrativa do processo e declarou nula a acusação do BdP e todo o
processo ulterior, "ressalvando dos seus efeitos todas as diligências de
prova já produzidas durante a instrução dos autos", remetendo para o
supervisor, querendo, voltar a lavrar decisão, "proferindo-a isenta dos
vícios que afetam a sua validade".Na
sentença, o juiz afirmava que “apresentar os meios de prova coligidos
como fez o Banco de Portugal ou nada enunciar equivale na prática ao
mesmo”.“Com vista ao cumprimento efetivo
do direito de defesa, o BdP haveria de apresentar a prova de forma
sistemática, coerente e organizada, tudo de molde a que a consulta dos
autos pelos arguidos se processasse com suficiente e cabal compreensão
dos elementos probatórios existentes”, acrescentava.Para
a Relação de Lisboa, o juiz do TCRS fez uma “incorreta interpretação e
aplicação” do artigo 50.º do Regime Geral das Contraordenações, o qual
“apenas exige que sejam comunicados aos arguidos os factos que lhe são
imputados, a respetiva qualificação jurídica e sanções em que incorrem”,
salientando que os arguidos tiveram acesso ao processo e exerceram “o
seu direito a serem ouvidos e a defenderem-se”, pelo que conclui que foi
respeitado o seu direito de defesa.O juiz
Sérgio Sousa já mostrou discordar do entendimento da Relação na
sentença proferida no passado dia 09 de setembro, no âmbito do recurso
apresentado pelo Montepio e oito antigos administradores ao pagamento de
coimas no valor total de 4,9 milhões de euros, cuja decisão foi
igualmente a de declaração da nulidade da acusação e das notificações
emitidas e a devolução do processo ao BdP, para que este profira “nova
decisão isenta dos vícios que decretaram a nulidade”.Na
sentença de 09 de setembro, o TCRS reafirmou o entendimento de que deve
ser garantido um “cabal e efetivo direito à defesa”, pois “só pode ser
contrariado o que razoavelmente puder ser conhecido e os meios de prova a
apresentar só o podem ser com completude quando se conheça de forma
plena o objeto dos autos”.